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João de Sousa

Sábado, Julho 27, 2024

CETA – Dados pessoais desprotegidos

Entidades como a Comissão Nacional de Protecção de Dados e inúmeras outras associações que zelam pela protecção da privacidade dos cidadãos europeus vêem com enorme preocupação a implementação do CETA (Comprehensive Economic and Trade Agreement), o acordo comercial entre a União Europeia e o Canadá.

O CETA surge num contexto em que o Canadá (juntamente com os EUA o Reino Unido, a Austrália a e Nova Zelândia) faz parte da «Aliança Cinco Olhos», caracterizada pela vigilância intrusiva e massiva dos cidadãos, sem ser necessário fundamentar qualquer tipo de suspeita, e pela partilha de dados entre os países por forma a contornar todas as proteções constitucionais – os serviços de informação do Canadá podem obter informações sobre cidadãos australianos sem estarem sujeitos às leis australianas e os serviços de informação australianos podem obter informações sobre cidadãos canadianos sem estarem sujeitos às leis do Canadá. Depois, ambos os serviços podem trocar informações, evitando que cada uma das agências de informação seja limitada pelas leis do seu próprio país para vigiar seus cidadãos.

Acontece que o CETA inclui uma série de compromissos associados à partilha de dados entre o Canadá e a União Europeia. Sendo as excepções a esta partilha de dados tão restritas, o CETA vem efectivamente entregar os dados europeus à NSA e outras agências de informação norte-americanas, subvertendo todo o sistema de protecção de dados pessoais que existe na UE.

Se dúvidas existissem quanto à debilidade da protecção oferecida pela legislação canadiana, valeria a pena lembrar que o Canadá não é – e não pretende tornar-se – parte da Convenção do Conselho da Europa para a protecção de dados pessoais, apesar da Convenção estar aberta a países não europeus (e efectivamente o Uruguai, o Senegal e a Mauritânia fazem parte).

Acrescente-se ainda que o CETA cria um Fórum de Cooperação Regulamentar (FCR) através do qual as grandes multinacionais serão capazes de pressionar os legisladores através de grupos de pressão (lobbies) durante o processo de criação legislativa. Em termos práticos trata-se de um «alçapão legislativo» para fragilizar a protecção dos direitos fundamentais dos cidadãos à sua privacidade.

Particularmente preocupante é o artigo 28.3 c), onde se afirma que a legislação comunitária que fundamentaria qualquer medida para proteger dados pessoais e a privacidade dos cidadãos não pode ser inconsistente com as restantes provisões previstas no tratado. Isto representa portanto uma menorização da «Carta dos Direitos Fundamentais» que fica assim relegada abaixo de um tratado comercial.

Aliás, é precisamente esta mesma situação que leva várias entidades dedicadas à protecção dos dados pessoais e da privacidade dos cidadãos a considerar que o CETA não é compatível com a «Carta dos Direitos Fundamentais».
Em jeito de conclusão, para os leitores menos preocupados com o acesso facilitado dos serviços de informação norte-americanos aos nossos dados pessoais, não posso deixar de alertar para a instabilidade emocional e os valores de índole autoritária de quem hoje ocupa a Casa Branca.

João Vasco Gama, Membro da Plataforma Não ao Tratado Transatlântico

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