Verdadeira experiência cinematográfica que nenhum cinéfilo deve perder, filme de Sam Mendes tem preciosismo técnico que já vale o ingresso.
Em 1917, novo filme de Sam Mendes (Beleza Americana), dois soldados, Schofield (George MacKay) e Blake (Dean-Charles Chapman), recebem a missão quase suicida de entregar uma mensagem nas mãos do Coronel MacKenzie, ordenando a ele que retroceda de um ataque aos alemães em um dos fronts de batalha da 1ª Guerra Mundial. Para que a mensagem chegue a tempo, a operação tem de ser realizada atrás das linhas inimigas.
Essa premissa simples deu origem a um roteiro que tem poucos diálogos e explora clichês clássicos de guerra – como a já batida jornada do herói. Ainda assim, 1917 foi indicado, de forma surpreendente e imerecida, ao Oscar de Melhor Roteiro Original. E é com essa premissa que o diretor Sam Mendes desenvolve uma obra-prima – um filme belíssimo em estética, edição, fotografia e efeitos.
Tudo funciona como um relógio suíço, uma montanha-russa de emoções, neste que, sem dúvida, é o melhor trabalho de direção de 2019 – um vencedor certo nessa categoria no Oscar do próximo domingo (9). Ainda mais porque Sam Mendes recorreuaum audacioso plano-sequência, como se rodasse inteiramente o filme num único plano, sem cortes de edição.
A fotografia é, seguramente, o elemento central de 1917. O diretor de fotografia Roger Deakin, já indicado 14 vezes ao Oscar, venceu a estatueta em 2018 com Blade Runner 2049. Pois 1917 é um dos seus melhores trabalhos, principalmente pelo desafio do conceito de plano-sequência que intercala, em planos abertos, lentes em 35 mm e 50 mm com grandes angulares, trazendo uma estética de games como Call e Duty e Battlefield. O requinte na fotografia traz uma estética charmosa às guerras, o que não deveria sobressair – afinal, a 1ª Grande Guerra deixou quase 20 milhões de mortos.
Apesar de não ser o melhor trabalho de fotografia de 2019 – posto pertencente ao assombroso O Farol de Robert Eggers –, certamente 1917 levará o careca pelado, digo, dourado. O desafio de fotografar em plano-sequência, mantendo a qualidade estética, foi, com certeza, um exercício homérico. A produção é quase toda rodada em tons frios, o que deixa tudo ainda mais mórbido.
A edição é um capítulo à parte. Com pouquíssimos cortes, quase imperceptíveis, o filme é construído de forma sequencial, com a câmera acompanhando os personagens. Coube ao montador um trabalho extremamente complexo, que usa truques na edição tal qual Hitchcock fez com primazia em Festim Diabólico.
Também a edição e a mixagem de som são pontos altos do filme. Os passos dos soldados quando tocam o chão molhado das trincheiras ecoam em toda a sala de cinema, assim como o bater das assas dos pombos causa arrepios. Tudo é muito meticuloso e feito para impressionar, a exemplo da trilha sonora de Thomas Newman, que dá cadência e ritmo ao espetáculo visual.
Enfim, 1917 é uma verdadeira experiência cinematográfica que nenhum cinéfilo deve perder. A despeito do roteiro raso e dos personagens unidimensionais, o preciosismo técnico já vale o ingresso e ajudará o longa de Sam Mendes a levar, no Oscar 2020, as estatuetas de Filme, Direção, Fotografia e Mixagem de Som.
por Edy César, Advogado, fotógrafo e amante do cinema | Texto original em português do Brasil
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