A repetição de dados econômicos decadentes mostram uma economia mundial abraçada a um sistema político que tentam manter-se em pé.
Assim o economista Joseph Stiglitz, vencedor do Nobel da Economia em 2001, analise a crise mundial. Ele argumenta há anos que isso resulta de uma diferença crescente entre quem cria riqueza e quem beneficia dela.
Em entrevista à Euronews em Amsterdã, Holanda, onde está lançando o seu mais recente livro, Stiglitz afirma que o chile é um dos países com maior desigualdade. “E a parte surpreendente é que eles pareciam aceitar isso. Até que deixaram de aceitar.”
Euronews: O título do seu novo livro é “Um pouco de tudo”. Poder, pessoas, lucros e capitalismo progressivo para uma era de descontentamento. E vemos esse descontentamente em todo o mundo. Vemos na França, com os coletes amarelos, vemos em Hong Kong, no Líbano, no Chile e em todos os lugares. Mas todo este descontentamento não significa que o capitalismo atingiu o limite?
Joseph Stiglitz: Sim. O Chile é um dos países que, embora o desempenho macro tenha sido muito bom, se virmos os números da desigualdade, vemos que foi um dos países com maior desigualdade. E a parte surpreendente é que eles pareciam aceitar isso. Até que deixaram de aceitar. O que estou a dizer aqui é: Precisamos de um novo contrato social entre o mercado, o estado e a sociedade civil.
O capitalismo fará parte da história, mas não pode ser o tipo de capitalismo que tivemos nos últimos 40 anos. Não podemos ter o tipo de capitalismo egoísta, restrito, onde as empresas apenas maximizam o valor para os acionistas, independentemente das consequências sociais. Quando se faz isso, acaba por ver acontecer o que acontece nos EUA, não apenas com a desigualdade, mas com a crise dos opióides.
A esperança média de vida está em declínio, há crises alimentares, diabetes infantil… As empresas de alimentos estão a explorar os nossos jovens; há empresas como a Exxon que negam a mudança climática, há empresas de cigarros a negar a existência de evidências convincentes de que os cigarros são prejudiciais à saúde. Sabe…há exemplo atrás de exemplo daquilo que só pode ser chamado de “comportamento repreensível e imoral”.
Está na mesma página do presidente francês Emmanuel Macron? Ele também é a favor de novas regras para a União Europeia e para a zona euro…
Joseph Stiglitz: Muito, mesmo. O problema na Europa é o emprego. A promessa era que, se a inflação fosse inferior a 2%, o défice fosse inferior a 3%, a dívida chegaria a 60% do PIB e haveria crescimento económico. Tivemos décadas com essa política. E o que temos é estagnação na Europa. Portanto, que fique claro que essa estrutura de políticas não funciona.
Vê uma recessão próxima? Uma nova crise próxima?
Não vejo uma crise, pode acontecer, mas não vejo. O que vejo é uma desaceleração significativa. E vemos isso em todo lado do mundo, vemos uma desaceleração na China, que tem sido o motor do crescimento económico desde 2008, vemos uma desaceleração nos EUA de 1,9% – muito melhor do que negativa mas muito longe do que Trump prometeu de 3,4% ou mais – E vemos uma recessão na Alemanha. Para mim, a lista de problemas é a guerra comercial de Trump, o protecionismo, o qual está verdadeiramente a perturbar a economia global.
Quem está a ganhar com estas guerras comerciais? Se Trump não está a ganhar, os EUA não ganham, a China também não, a Europa aparentemente também não. Então, quem está a ganhar com isto?
Toda a gente é perdedor. Foi uma péssima ideia. Trump começou por dizer que as guerras comerciais são fáceis de vencer. Não são. Ainda não temos nenhum acordo depois de mais de três anos de negociações. A única coisa que eles têm é o chamado “acordo de Fase 1”. Um “acordo da Fase 1” é o que um governo “normal” teria negociado com a China há muitos anos. O mundo perdeu imenso por causa desta incerteza, e a realidade é que, mesmo que exista um acordo que os mercados celebrem, se pensarem por um minuto, todos sabem que, quando for conveniente para Trump, ele rasgará o acordo.
Vamos para o clima. Já se vêem as consequências da mudança climática. É bem visível. Toda a gente fala sobre um “acordo verde”, mas quem é que vai pagar por essa transição, a transição económica para uma economia mais verde? Especialmente agora que a economia em todo o lado está a desacelerar?
Quando entramos na Segunda Guerra Mundial, alguém disse: Podemos pagar? Não me lembro de alguém dizer: Oh, vamo-nos render aos alemães porque nos vai custar muito dinheiro… Estamos a travar uma guerra que está no coração da nossa existência, do nosso padrão de vida. Nos EUA perdemos quase 2% do PIB todos os anos: Os incêndios, as inundações, os furacões, os episódios de frio extremo… É, verdadeiramente, um ataque ao nosso mundo tal como o conhecemos.
O que é que sugere?
Duas coisas. Liderei a comissão internacional com a lei severa e analisamos o que seria necessário para alcançar as metas de Paris e de Copenhaga, garantindo que o aumento da temperatura não fosse superior a 1,5 a 2 graus centígrados, e estávamos convencidos de que o nosso relatório – de uma comissão inteira – poderia alcançar isso com custos modestos. E que, de facto, seria bom para nossa economia, o que a estimularia – falávamos de uma desaceleração – Os investimentos de que precisaríamos forneceriam o estímulo à economia. Portanto, a ideia de que teríamos de sacrificar algo estava absolutamente errada.
Há eleições nos EUA no próximo ano. Quem acha que poderia ganhar a Donald Trump?
Acho que qualquer um dos principais candidatos democratas. As sondagens mostram que todos eles derrotam Donald Trump.
Voltaria à política se lhe pedissem?
Sim, provavelmente voltaria. Penso que este é um momento de crise para os EUA e para o mundo, e acho claro de que precisamos de reformar a maneira como a nossa sociedade e a nossa economia funcionam.
Texto original em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV (Euronews) / Tornado