O povo é quem mais ordena. E, mais uma vez, falou. Nas urnas.
Foram mais de cinco milhões os portugueses adultos que saíram de casa e, nas assembleias de voto, disseram de sua justiça.
Ganhou as eleições a Coligação PSD/CDS. A coligação sofreu, contudo, uma penalização: perdeu mais de meio milhão de votos, um fortíssimo cartão amarelo. Mas, tendo o maior número de votos e de deputados, deve agora tentar formar governo. Um governo dependente de equilíbrios parlamentares. Ainda bem, por uma vez, será cumprido o preceito constitucional que estabelece que é o Parlamento a controlar o governo e não o contrário, como sempre tem acontecido. Nos sistemas de maioria (de Cavaco Silva a Sócrates e Passos Coelho), a Assembleia tem sido abúlica, com os grupos parlamentares da maioria a apoiar de forma acrítica todas as medidas dos governos, e com os grupos parlamentares dos partidos de oposição enquanto fiéis correias de transmissão das direcções dos seus partidos.
Neste processo eleitoral, há ainda muitos excluídos. Há cerca de quarenta por cento de portugueses a quem as eleições nada dizem. Sofrem as consequências das más governações, mas já perderam a esperança, acham que o seu voto de nada vale, em nada condiciona o seu futuro, em nada altera o seu triste destino.
Há ainda aqueles que votam, mas cujo voto vai directamente para o lixo. São os votos restantes, os que votam, por exemplo, CDU ou Bloco de Esquerda em Bragança. Representam cerca de 10% da expressão eleitoral, cerca de meio milhão de cidadãos que sai de casa para depositar o seu voto numa urna, a qual, neste caso, serve apenas para enterrar o acto de participação cívica.
Por último, estão excluídos os emigrantes que, apesar de serem vários milhões, terão a representá-los na Assembleia da República apenas quatro deputados (menos de 2% da representatividade total).
Mas, com ou sem limitações, e sempre com a sua razão, o povo decidiu.
Independentemente das preferências da comunicação social e da manipulação informativa; indiferente aos resultados das sondagens.
Há 230 cidadãos, agora eleitos deputados, em quem o povo depositou o poder próprio duma democracia representativa.
Esperemos que o novo Parlamento, agora escolhido, não continue a envergonhar-nos, como o da anterior legislatura. Há que garantir que a nova Assembleia da República não se mantém como central de negócios e favores. Os deputados de negócios, que acumulam a função parlamentar com a de administrador, director ou consultor de empresas que negoceiam com o Estado, que vivem da manjedoura do orçamento de Estado – estes deputados devem ser despedidos por triste e má figura. Têm de optar, de uma vez por todas, se são deputados e defendem o interesse público; ou se são negociantes com acesso aos bens públicos, a informação privilegiada, ao habitual tráfico de influências.
Os portugueses exigem agora que os deputados façam o que lhes compete: política. Que, num Parlamento que não envergonhe o País, legislem em função do interesse nacional e fiscalizem o poder executivo.
Quem garante que o sistema funciona? Aquele que, quando instituído nas suas funções, jura “defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa”: o Presidente da República.