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Sexta-feira, Dezembro 20, 2024

Carnaval e trabalho dá samba?

Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Jornalista, assessor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo

Com a proximidade do Carnaval, a seleção de canções desta semana respondem à questão se carnaval e trabalho dão samba. Grandes autores da música popular brasileira qualquer tema dá samba e o carnaval é entendido com a festa popular por excelência e a antítese do trabalho alienado, longe da vontade do trabalhador.

As canções vão desde a negação do trabalho como na marchinha de Carnaval “Trabalhar, Eu Não” (1946), de Almeidinha (Aníbal Alves de Almeida) até a suavidade de “Noite dos Mascarados” (1966), de Chico Buarque, onde o trabalho perpassa a festa popular e é ignorado pelos foliões.

Tem ainda: “Daqui Não Saio” (1949), de Paquito (Francisco da Silva Fárrea Júnior; 1915-1975), e Romeu Gentil (1911-1983), sobre a questão da moradia, “Chuva, Suor e Cerveja” (1975), de Caetano Veloso, onde o trabalho fica longe da folia e “Yes, Nós temos Bananas” (1938), de Braguinha ou João de Barro (Carlos Alberto Ferreira Braga; 1907-2006).

Entre os anos 1930 e 1970, as marchinhas feitas especificamente o Carnaval faziam muito sucesso durante a animação dos bailes duranta a folia. Muitas delas de tão grande qualidade que se imortalizaram.

 

Trabalhar, Eu Não (1946), de Almeidinha (Aníbal Alves de Almeida)

A marchinha que abre esta seleção carnavalesca, é de autoria de Aníbal Alves de Almeida, conhecido como Almeidinha. Já no título comprova que Carnaval e trabalho dá samba sim, até porque a realização da festa mais popular do Brasil exige muito trabalho e dá muitos empregos durante o ano todo nos monumentais desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro e São Paulo, nos trios elétricos em Salvador e no frevo nas ruas de Olinda e Recife, com os grandes blocos como o Galo da Madrugada, considerado o maior bloco carnavalesco do mundo.

Milhões vão às ruas festejar com irreverência, mas de acordo com Almeidinha: “Trabalhar, eu não” porque:

“Eu trabalhei como um louco,
Até fiz calo na mão,
O meu patrão ficou rico,
E eu, pobre sem tostão”.

Trabalhar, Eu Não (1946)

Interpretação: Onésimo Gomes (1914-1999)

Quem quiser suba o morro,
Venha apreciar a nossa união.
Trabalho, não tenho nada,
De fome não morro não,
Trabalhar, eu não, eu não!

Eu trabalhei como um louco,
Até fiz calo na mão,
O meu patrão ficou rico,
E eu, pobre sem tostão,
Foi por isso que agora,
Eu mudei de opinião.

Trabalhar, eu não, eu não!
Trabalhar, eu não, eu não!

 

 

Daqui Não Saio (1949), de Paquito e Romeu Gentil

Outra marchinha que ainda encanta carnavais é “Daqui Não Saio”, de Paquito e Romeu Gentil. A questão da moradia quando não existia nem o Minha Casa, Minha Vida, que está sendo extinto pelo atual governo.

Então diga:

“Onde é que eu vou morar?
O senhor tem paciência de esperar
Ainda mais com quatro
filhos
Onde é que vou morar?”

Questionam os autores. E todas as trabalhadoras e todos os trabalhadores ressoam essa pergunta em pleno século 21, sem nenhum programa de habitação: “Onde é que eu vou morar?”.

Daqui Não Saio (1949)

Interpretação: Vocalistas Tropicais

Daqui não saio
Daqui ninguém me tira

Onde é que eu vou morar
O senhor tem paciência de esperar
Ainda mais com quatro filhos
Onde é que vou morar

Daqui ninguém me tira

Onde é que eu vou morar
O senhor tem paciência de esperar
Ainda mais com quatro filhos
Onde é que vou morar

Sei que o Senhor tem razão pra querer
A casa pra morar, mas onde eu vou ficar
No mundo ninguém perde por esperar
Ainda dizem por aí que a vida vai melhorar

 

 

Yes, Nós temos Bananas (1938), de Braguinha e Alberto Ribeiro (1902-1971)

O compositor Carlos Alberto Ferreira Braga, conhecido como João de Barro ou Braguinha, entre os mais frequentes no Carnaval, emplacou inúmeros sucessos para a folia. Quem nunca cantou “As Pastorinhas” (com Noel Rosa), “Tourada em Madri” (com Alberto Ribeiro), “A Saudade Mata a Gente” (com Antônio Almeida) e “Chiquita Bacana (com Alberto Ribeiro).

“Yes, Nós Temos Bananas”, ironiza o complexo de vira-lata da elite brasileira, numa época em que o Brasil era majoritariamente agrícola. Além de rir disso, a marchinha mostra que o país pode muito mais.

Yes, Nós temos Bananas (1938)

Interpretação: Ney Matogrosso

Yes, nós temos bananas
Bananas pra dar e vender
Banana menina tem vitamina
Banana engorda e faz crescer

Vai para a França o café, pois é
Para o Japão o algodão, pois não
Pro mundo inteiro, homem ou mulher
Bananas para quem quiser

Mate para o Paraguai, não vai
Ouro do bolso da gente não sai
Somos da crise, se ela vier
Bananas para quem quiser

 

 

Chuva, Suor e Cerveja (1975), de Caetano Veloso

Caetano Veloso também não ficou de fora das marchinhas. Em “Chuva, Suor e Cerveja”, o artista baiano canta a alegria da festa de Momo, dias em que ninguém trabalha para cair na folia, sem se desfazer de ninguém e com respeito a todo mundo.

Chuva, Suor e Cerveja (1975)

Interpretação: Caetano Veloso

Não se perca de mim
Não se esqueça de mim
Não desapareça
A chuva tá caindo
E quando a chuva começa
Eu acabo de perder a cabeça
Não saia do meu lado
Segure o meu pierrô molhado
E vamos embolar
Ladeira abaixo
Acho que a chuva
Ajuda a gente a se ver
Venha, veja, deixa
Beija, seja
O que Deus quiser…

A gente se embala
Se embora se embola
Só pára na porta da igreja
A gente se olha
Se beija se molha
De chuva, suor e cerveja…

Não se perca de mim
Não se esqueça de mim
Não desapareça
A chuva tá caindo
E quando a chuva começa
Eu acabo de perder a cabeça
Não saia do meu lado
Segure o meu pierrô molhado
E vamos embolar
Ladeira abaixo
Acho que a chuva
Ajuda a gente a se ver
Venha, veja, deixa
Beija, seja
O que Deus quiser…

A gente se embala
Se embora, se embola
Só pára na porta da igreja
A gente se olha
Se beija se molha
De chuva, suor e cerveja…

 

 

Noite dos Mascarados (1966), de Chico Buarque

Entra praticamente como brinde a canção “Noite dos Mascarados” (1966), pela magia com que Chico Buarque ilustra o tema com a relação de dois foliões e a busca da felicidade num mundo onde o normal é ser infeliz no trabalho por causa da alienação. Mas no Carnaval brincam juntos o que “nada em dinheiro” e a que “não tem um tostão”.

Outro destaque é que essa canção é das poucas que juntou as vozes de Chico Buarque e da cantora Elis Regina (1945-1982).

Noite dos Mascarados (1966), de Chico Buarque

Intérpretes: Chico Buarque e Elis Regina

Ele: Quem é você?
Ela: Adivinhe, se gosta de mim

Os dois: Hoje os dois mascarados
Procuram os seus namorados
Perguntando assim:

Ele: Quem é você, diga logo
Ela: Que eu quero saber o seu jogo
Ele: Que eu quero morrer no seu bloco
Ela: Que eu quero me arder no seu fogo
Ele: Eu sou seresteiro

Poeta e cantor
Ela: O meu tempo inteiro
Só zombo do amor

Ele: Eu tenho um pandeiro
Ela: Só quero um violão
Ele: Eu nado em dinheiro
Ela: Não tenho um tostão

Fui porta-estandarte
Não sei mais dançar

Ele: Eu, modéstia à parte
Nasci pra sambar

Ela: Eu sou tão menina
Ele: Meu tempo passou
Ela: Eu sou Colombina
Ele: Eu sou Pierrô

Os dois: Mas é carnaval
Não me diga mais quem é você
Amanhã, tudo volta ao normal
Deixe a festa acabar
Deixe o barco correr
Deixe o dia raiar
Que hoje eu sou
Da maneira que você me quer
O que você pedir
Eu lhe dou
Seja você quem for
Seja o que Deus quiser
Seja você quem for
Seja o que Deus quiser


Texto em português do Brasil


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