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Sábado, Novembro 2, 2024

A parelha populista de putativos presidenciáveis

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

Não conheço o jovem André Ventura, nem sigo comentários desportivos. No caso de Ana Gomes, não posso infelizmente dizer que a não conheço.

Não conheço o jovem André Ventura, nem sigo comentários desportivos, mas como pessoa razoavelmente interessada na política não deixei de quando em vez de consultar as suas declarações, entrevistas e um pouco do que dele se diz.

De tudo o que vi, fiquei vivamente impressionado pelos extractos da sua tese glosados na imprensa, que condena a estigmatização das minorias pelo populismo, em frontal oposição à sua prática política, e mais ainda fiquei estarrecido com a justificação que dá para a contradição: ‘Sempre distingui muito bem a parte científica da parte opinativa’.

Stevenson, na sua famosa novela ‘The Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde’ não diria melhor! É esta a essência da psicopatia política! É assim que se fizeram os monstros como Hitler capazes tanto de proibir maus tratos a cães como de exterminar milhões de seres humanos por serem judeus, apenas para citar o mais famoso de uma lista que é infelizmente longa.

Contrariamente à inflamada opinião pública que sugere a ostracização do partido de André Ventura, que julga boa ideia proibir o debate parlamentar das suas iniciativas ou que facciosamente cai em cima de tudo o que ele diz, acho que ele entendeu a existência de um mercado (o populismo justicialista) e que o explora com razoável capacidade de comunicação (maior que a dos partidos políticos institucionais).

Negar-lhe as qualidades e os talentos que tem, apenas serve para desqualificar as críticas e consolidar a impressão de que existe um complot contra ele. Pior do que isso, trata-se de não entender que ele é perigoso na proporção das suas qualidades. Se ele fosse um idiota xenófobo, ninguém teria de se preocupar com ele.

No caso de Ana Gomes, não posso infelizmente dizer que a não conheço, e por isso tenho opiniões mais consolidadas sobre ela do que sobre o seu par. Creio que se trata de um André Ventura mais maduro, mais cultivado, com uma penetração maior nos mecanismos fáticos do poder, uma agenda mais clara e por tudo isso politicamente mais perigosa.

Fui testemunha pessoal da sua rejeição da ‘moral católica’ a propósito de um texto moralmente abjecto que publicou e que me serviu para finalmente entender que por trás da pretensa espontaneidade e da reclamação postiça de valores existe uma amoralidade de quem está disposto a fazer tudo o que for necessário para chegar onde pretende. Mais do que com Ventura, é contraproducente negar-lhe as qualidades que tem.

A putativa presidenciável Ana Gomes anuncia que é preciso correr com António Costa por este não permitir a ‘Geringonça-2’, esquecendo-se de explicar porque razão em 2014 fez campanha pelo Bloco Central; questionada sobre o Benfica e Porto acusa apenas os primeiros de ser corruptos e faz silêncio sobre os segundos, cobrindo assim a estratégia do outro lado da parelha confessadamente benfiquista; tenta manipular o entusiasmo clubista socialista traçando por objectivo impedir Marcelo de atingir os 70%, não se coibindo de ameaçar quem quer que se candidate no PS contra ela.

Para quem tinha dúvidas, a entrevista de Ana Gomes é clara: trata-se de tomar conta do PS como instrumento para tomar conta do país. Num país profundamente corroído pelo conflito de interesses e corrupção, uma carteira bem provida de informações é o instrumento ideal para controlar e manipular o poder.

Temos, perante isto, um sistema político de enorme fragilidade; um Presidente da República mais preocupado com o seu umbigo do que com o país; um governo de António Costa feito de personagens que não estão à altura das responsabilidades e de um Ministro das Finanças que parece ter deixado de existir, depois de aparecer publicamente em ruptura com o Primeiro-Ministro e fazer constar que quer sair do governo.

Ao vírus de Wuhan e ao cataclismo económico, arriscamo-nos assim a um não menos grave cataclismo político.


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