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Terça-feira, Julho 16, 2024

Homenagem: Como a música popular brasileira tenta definir o que é ser mãe

Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Jornalista, assessor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo

Para celebrar o Dia das Mães, foram selecionadas músicas sobre a importância das mães na vida de todo mundo. Pode parecer piegas, mas não deixa de ser verdade. E mesmo que o Dia das Mães seja uma data comercial, não dá par deixar de falar dela, mesmo que já não tenha a sua presença no convívio.

Antes das canções, a que se destacar a poesia de Mário Quintana (1906-1994) Mãe:

Mãe… São três letras apenas
As desse nome bendito;
Também o céu tem três letras
E nelas cabe o infinito.

Para louvar nossa mãe,
Todo o bem que se disser
Nunca há de ser tão grande
Como o bem que ela nos quer.

Palavra tão pequenina,
Bem sabem os lábios meus
Que és do tamanho do céu
E apenas menor que Deus!

 

Tom Zé e Elton Medeiros

A primeira canção selecionada é uma parceria de Elton Medeiros (1930-2019) e Tom Zé e leva o nome de Mãe (Mãe Solteira), de 1975. Muito importante destacar as mães solteiras, que são muitas no Brasil, onde de acordo com informações oficiais, cerca de 6 milhões de pessoas não têm o nome do pai no registro de nascimento.

Este samba mostra a dificuldade que todas as mães solos enfrentam para ser mãe e pai ao mesmo tempo e ainda o preconceito que a sociedade lhes impõe, ainda hoje. Se ser mãe já temos seus percalços, dá para imaginar assumir o papel que deveria ser do pai também.

Mãe (Mãe Solteira), de Elton Medeiros e Tom Zé

Cada passo, cada mágoa
Cada lágrima somada
Cada ponto do tricô
Seu silêncio de aranha
Vomitando paciência
Prá tecer o seu destino

Cada beijo irresponsável
Cada marca do ciúme
Cada noite de perdão
O futuro na esquina
E a clareza repentina
De estar na solidão

Os vizinhos e parentes
A sociedade atenta
A moral com suas lentes
Com desesperada calma
Sua dor calada e muda
Cada ânsia foi juntando

Preparando a armadilha
Teias, linhas e agulhas
Tudo contra a solidão
Prá poder trazer um filho
Cuja mãe são seus pavores
E o pai sua coragem

Dorme
Meu pecado
Minha culpa
Minha salvação

 

 

John Lennon

O ex-Beatle, John Lennon (1940-1980) foi criado pela irmã de sua mãe biológica porque o seu pai biológico abandonou a ambos e ela não se sentiu em condições de cuidar do filho. A rigorosa tia exigiu muito de Lennon, mas talvez isso tenha contribuído para a formação desse gênio da música, embora em constante atrito com a tia-mãe. Mother (Mãe), de 1970, trata do sentimento de abandono de um filho.

Mãe, de John Lennon (tradução)

Mãe, você me teve
Mas eu nunca a tive
Eu te quis
Você não me quis

Então eu
Eu só tenho que te dizer
Adeus
Adeus

Pai, você me deixou
Mas eu nunca o deixei
Eu precisei de você
Você não precisou de mim

Então eu
Eu só tenho que te dizer
Adeus
Adeus

Crianças, não façam
O que eu fiz
Eu não pude caminhar
E tentei correr

Então eu
Eu só tenho que lhes dizer
Adeus
Adeus

Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa
Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa

Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa
Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa

Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa
Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa

Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa
Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa

Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa
Mamãe, não se vá
Papai, volte pra casa

 

 

Gonzaguinha

O cantor e compositor carioca Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior, o Gonzaguinha (1945-1991), retrata em Com a Perna no Mundo, de 1979, o amor por Dina, a mulher que o criou no morro de São Carlos, no Rio de Janeiro. A cantora Odaléia Guedes dos Santos largou Luiz Gonzaga (1912-1989) com o filho por causa das constantes brigas provocadas pelo ciúme do marido.

Dois anos depois de nascimento de Gonzaguinha, Léia, como era chamada, morreu de tuberculose. Luiz Gonzaga deixou o menino com os padrinhos de batismo da criança, Leopoldina, a Dina e Henrique Xavier Pinheiro. A canção do genial Gonzaguinha comprova que mãe é quem cria, mais um clichê, que não deixa de ser verdade.

Com a Perna no Mundo, de Gonzaguinha

Acreditava na vida
Na alegria de ser
Nas coisas do coração
Nas mãos um muito fazer

Sentava bem lá no alto
Pivete olhando a cidade
Sentindo o cheiro do asfalto
Desceu por necessidade

O Dina
Teu menino desceu o São Carlos
Pegou um sonho e partiu
Pensava que era um guerreiro
Com terras e gente a conquistar
Havia um fogo em seus olhos
Um fogo de não se apagar

Diz lá pra Dina que eu volto
Que seu guri não fugiu
Só quis saber como é
Qual é
Perna no mundo sumiu

E hoje
Depois de tantas batalhas
A lama dos sapatos
É a medalha
Que ele tem pra mostrar

Passado
É um pé no chão e um sabiá
Presente
É a porta aberta
E futuro é o que virá, mas, e daí?

ô ô ô e á
O moleque acabou de chegar
ô ô ô e á
Nessa cama é que eu quero sonhar
ô ô ô e á
Amanhã bato a perna no mundo
ô ô ô e á
É que o mundo é que é meu lugar

 

 

Emicida

Emicida perdeu no pai ainda criança e a sua mãe criou a ele e os irmãos sozinha. Nesta canção de 2015, o rapper paulistano homenageia sua mãe pela força que teve para sustentar os filhos e segurar todas as barras surgidas pelo caminho.

“A sós nesse mundo incerto
Peço um anjo que me acompanhe
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis”

Mãe, de Emicida

Um sorriso no rosto, um aperto no peito
Imposto, imperfeito, tipo encosto, estreito
Banzo, vi tanto por aí
Pranto, de canto chorando, fazendo os outro rir
Não esqueci da senhora limpando o chão desses boy cuzão
Tanta humilhação não é vingança, hoje é redenção
Uma vida de mal me quer, não vi fé
Profundo ver o peso do mundo nas costa de uma mulher
Alexandre no presídio, eu pensando em suicídio
Aos oito anos, moça
De onde cê tirava força?
Orgulhosão de andar com os ladrão, trouxa!
Recitando Malcolm X sem coragem de lavar uma louça
Papo de quadrada, 12, madrugada e pose
As ligação que não fiz, tão chamando até hoje
Dos rec no Djose ao hemisfério norte
O sonho é um tempo onde as mina não tenha que ser tão forte

Nossas mãos ainda encaixam certo
Peço um anjo que me acompanhe
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis
A sós nesse mundo incerto
Peço um anjo que me acompanhe
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis

Outra festa, meu bem, tipo Orkut
Mais de mil amigo e não lembro de ninguém
Grunge, Alice in Chains
Onde ou você vive Lady Gaga ou morre Pepê e Neném
Luta diária, fio da navalha. Marcas? Várias
Senzalas, cesáreas, cicatrizes
Estrias, varizes, crises
Tipo Lulu, nem sempre é so easy
Pra nós punk é quem amamenta, enquanto enfrenta a guerra
Os tanque, as roupas suja, a vida sem amaciante
Bomba a todo instante, num quadro ao léu
Que é só enquadro e banco dos réu, sem flagrante
Até meu jeito é o dela
Amor cego, escutando com o coração a luz do peito dela
Descreve o efeito dela: breve, intenso, imenso
Ao ponto de agradecer até os defeito dela
Esses dias achei na minha caligrafia tua letra
E as lágrima molha a caneta
Desafia, vai dar mó treta
Quando disser que vi Deus
Ele era uma mulher preta

Nossas mãos ainda encaixam certo
Peço um anjo que me acompanhe
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis
A sós nesse mundo incerto
Peço um anjo que me acompanhe
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis

Nossas mãos ainda encaixam certo (certo)
Peço um anjo que me acompanhe (onde for)
Em tudo eu via a voz de minha mãe (tudo!)
Em tudo eu via nóis (em tudo eu via nóis)
A sós nesse mundo incerto (incerto)
Peço um anjo que me acompanhe (onde for)
Em tudo eu via a voz de minha mãe
Em tudo eu via nóis

O terceiro filho nasceu: é homem
Não, ainda é menino
Miguel bebeu por três dias de alegria
Eu disse que ele viria, nasceu!
E eu nem sabia como seria
Alguém prevenia: filho é pro mundo
Não, o meu é meu
Sentia a necessidade de ter algo na vida
Buscava o amor das coisas desejadas
Então pensei que amaria muito mais
Alguém que saiu de dentro de mim e mais nada
Me sentia como a terra: sagrada
E que barulho, que lambança
Saltou do meu ventre, contente, e parecia dizer: É sábado, gente!
A freira que o amparou tentava reter
Seus dois pezinhos sem conseguir
E ela dizia: Mas que menino danado!
Como vai chamar ele, mãe?
Leandro

 

 

Vicente Celestino

O cantor e compositor Vicente Celestino (1894-1968) é um dos tenores à moda antiga. Do tempo no qual os cantores precisavam ter uma voz potente, antes da bossa nova mostrar que todo mundo pode cantar. Coração Materno chegou a ser gravada inclusive por Caetano Veloso.

Coração Materno, de Vicente Celestino

Disse um campônio à sua amada:
“Minha idolatrada, diga o que quer
Por ti vou matar, vou roubar
Embora tristezas me causes mulher
Prova que eu te quero
Venero teus olhos, teu porte, teu ser
Mas diga, tua ordem espero
Por ti não importa matar ou morrer”
E ela disse ao campônio, a brincar
“Se é verdade tua louca paixão
Parte já e pra mim vá buscar
De tua mãe, inteiro o coração”
E a correr o campônio partiu
Como um raio na estrada sumiu
E sua amada qual louca ficou
A chorar na estrada tombou

Chega à choupana o campônio
Encontra a mãezinha ajoelhada a rezar
Rasga-lhe o peito o demônio
Tombando a velhinha aos pés do altar
Tira do peito sangrando
Da velha mãezinha o pobre coração
E volta a correr proclamando
“Vitória, vitória, tem minha paixão”
Mas em meio da estrada caiu
E na queda uma perna partiu
E à distância saltou-lhe da mão
Sobre a terra o pobre coração
Nesse instante uma voz ecoou:
“Magoou-se, pobre filho meu?
Vem buscar-me filho, aqui estou,
Vem buscar-me que ainda sou teu!”

 


Texto em português do Brasil


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