Bacurau tem muitas cenas que mereceriam ser destacadas pela ironia ou por lembrarem cenas de outros filmes de forma até divertida.
Vi Bacurau, o filme de Kleber Mendonça Filho, na “live” acontecida no YouTube e promovida pelo Telecine. Realmente, fiquei com a impressão de que não temos aí uma obra política – mas um filme feito para o mercado e utilizando a ironia como elemento principal de contextualização. Tudo isso com muita inteligência. O filme ganhou essa dimensão política por causa da atual situação brasileira de estarmos sujeitos a um governo inominavelmente burro.
Na verdade, Bacurau tem uma estrutura inteligente, mas não tem profundidade. Começa com um ritmo e termina com o mesmo ritmo. Mas todo o trecho entre essas duas pontas cai de ritmo – o ritmo é solto e os atores se perdem enquanto movimentação de representação. O que tem expressão correta nesse trecho é somente o trabalho do ator Udo Kier, enquanto os demais parecem mal dirigidos. Dá vontade de parar de ver. A própria estória perde significado – e isso porque os personagens são colocados como meros “bandidos”, que parecem estar se divertindo.
Se olharmos esse filme como mero produto de “mercado”, poderemos, inclusive, nos divertir. Mas dizer que é um filme político é bobagem. Na sessão promovida pelo Telecine, no final teve uma sequência hilária: a última cena acontece e a tela fica totalmente no escuro, mas com diálogos ainda sendo pronunciados e termina com a música. Enquanto isso, o Telecine vendeu o escuro para que a Samsung colocasse o nome durante os cinco minutos do final. É realmente uma maldade para quem pensava estar assistindo a um filme de dimensão política.
Bacurau tem muitas cenas que mereceriam ser destacadas pela ironia ou por lembrarem cenas de outros filmes de forma até divertida. Destaco apenas a cena final em que os habitantes de Bacurau saem de um esconderijo e isso lembra o que acontecia no Vietnã, durante a guerra, quando os vietnamitas faziam isso: eles se escondiam em um buraco e saiam lançando bombas e destruindo os americanos.
por Celso Marconi, Crítico de cinema mais longevo em atividade no Brasil. Referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8 | Texto em português do Brasil
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