Angolanos acusam líderes brasileiros de racismo e privilégios, além de evasão de divisas, expatriação ilícita de capital e abuso de autoridade. IURD sofre golpes seguidos em vários países africanos, devido a privilegiar o controle financeiro das igrejas por brasileiros.
Um dos países mais estratégicos para a Igreja Universal fora do Brasil, Angola tem templos sob nova direção. Ou pelo menos 40% da operação da entidade no país. Dentro na Universal, Macedo usa o termo “golpe” para se referir à ação ocorrida na segunda, 22, com envolvimento de polícia, tumultos em portas de igreja e cobertura da imprensa angolana.
O medo da Universal é que pastores de outros países também se rebelem. A situação na Costa do Marfim e de São Tomé e Príncipe, onde ocorreu depredação e até morte, é considerada preocupante. Neste último caso, ocorrido em novembro passado, foi preciso mobilizar a bancada evangélica no Congresso e o Itamaraty para socorrer bispos brasileiros.
Em 2013, o governo angolano suspendeu as atividades da Universal por 60 dias após 16 pessoas morrerem pisoteadas em um culto da igreja, em Luanda. Segundo investigadores, 152 mil pessoas se dirigiram para o estádio, que tinha capacidade para 30 mil. Uma comissão de inquérito concluiu que a superlotação foi causada por “publicidade enganosa”. Na época, vários pastores da Iurd foram detidos pela polícia.
Um evangelho para o Brasil, outro para a África
Bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola anunciaram ruptura com a gestão brasileira, controlada pelo bispo Edir Macedo. Eles acusam a igreja de racismo contra religiosos angolanos para privilegiar lideranças brasileiras. As divergências com a cúpula da igreja começaram em novembro de 2019, quando 320 bispos e pastores pediam a saída dos brasileiros, reivindicação não atendida.
O domínio brasileiro, segundo nota dos rebeldes, “é visível em todos os quadrantes da igreja, desde os púlpitos à área administrativa, que tem se traduzido em atos discriminatórios, onde na maior parte das vezes o principal critério para se atribuir certas responsabilidades eclesiásticas e/ou administrativas é a nacionalidade brasileira”. Falam em venda do patrimônio da igreja, como prédios, residências e terrenos, adquiridos com dízimos angolanos, sem consulta aos bispos locais, para cobrir dificuldades no Brasil.
Segundo reportagem da BBC Brasil, publicada nesta terça-feira (23), os dissidentes angolanos afirmam ter o controle de 42% dos templos – 35 na capital, Luanda, e outros 50 em cidades do interior. Para marcar a ruptura, o grupo passou a adotar a denominação Igreja Universal de Angola.
Os desgarrados acusam a direção brasileira de evasão de divisas, expatriação ilícita de capital e abuso de autoridade. Segundo eles, brasileiros acusados de delitos no Brasil são enviados para Angola para tomar o controle dos bispos angolanos, o que fariam com práticas violentas e abusivas.
Eles também reclamam da imposição da prática de vasectomia e aborto às famílias de pastores angolanos e intromissão na vida conjugal, acusação repetida em várias partes do continente, embora a IURD negue em nota oficial. No Brasil, a prática foi motivo de processo judicial vencido pelo pastor esterilizado. A recusa em realizar o procedimento pode reduzir a possibilidade de promoção ou acarretaria a transferência para um local indesejado, segundo testemunha afirmou em tribunal.
Segundo Dinis Bundo, porta-voz do grupo rebelado, as “melhores” igrejas sempre foram designadas aos pastores brasileiros. Ademais, eles também são beneficiados com melhores salários e carros modernos.
Em nota, a Igreja Universal nega as acusações afirmando que os “invasores” espalharam “mentiras absurdas, como essa acusação de racismo”, para confundir a sociedade angolana. “Basta frequentar qualquer culto da Universal, em qualquer país do mundo, para comprovar que bispos, pastores e fiéis são de todas as origens e tons de pele, de todas as classes sociais”, afirma a instituição, acrescentando que dos 512 pastores, apenas 65 são brasileiros.
A suposta obrigatoriedade de pastores serem submetidos a cirurgia de vasectomia, segundo a Universal, é um exemplo de fake news “facilmente desmentida pelo fato de que muitos bispos e pastores da Universal, em todos os níveis de hierarquia da Igreja, têm filhos”.
A Igreja Universal do Reino de Deus tem hoje 10 mil templos espalhados em mais de 100 países, sendo 500 mil fiéis só em Angola.
Apoio a Bolsonaro
Em outra reportagem, a Agência Pública mostra que, no Brasil, a secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) já gastou mais de R$ 300 milhões em campanhas veiculadas em rádios e TVs de propriedade ou ligadas a líderes religiosos evangélicos que o apoiam. O valor equivale a quase 10% de tudo o que foi gasto pelo órgão desde o início do governo Bolsonaro.
Pelo menos R$ 28 milhões foram destinados ao grupo Record, controlado por Edir Macedo. A Secom passou a fazer parte do ministério das Comunicações, ressuscitado, que ficou sob comando do deputado Fábio Faria (PSD-RN). O novo ministro é casado com uma das filhas do apresentador Silvio Santos, dono do SBT.
Segundo Pública apurou, a maioria da verba gasta na Record foi para promover a reforma da Previdência. O governo contratou cerca de R$ 11 milhões em ações apenas na emissora de Edir Macedo, cerca de 15% de tudo que a Secom gastou para promover a reforma. A campanha é a mais cara já realizada desde a posse de Bolsonaro, com mais de R$ 70 milhões contratados ao todo. A Secom ainda usou verba pública na Record para veicular campanhas de prestação de contas do governo, sobre segurança pública, no combate à violência contra a mulher e ações para divulgar uma imagem favorável do governo federal, como a “Agenda Positiva”.
A Pública também destaca manobras entre Bolsonaro e Edir Macedo para tentar emplacar o também bispo evangélico e deputado federal Marcos Pereira como substituto de Rodrigo Maia na presidência da Câmara. Pereira preside o Republicanos (ex-PRB), braço político da Igreja Universal.
A informação foi divulgada por ex-membros da igreja em vídeos nas redes sociais, e os rumores de que o bispo é um forte candidato foi confirmada por parlamentares entrevistados pela reportagem.
As eleições para o comando da Casa ocorrerão em fevereiro do ano que vem. O presidente da Câmara dos Deputados é quem controla a pauta de votação da Casa. Além disso, por exemplo, é dele a decisão sobre a abertura ou não de processos de impeachment contra o Presidente da República.
Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado