O teatro sucumbe na floresta de moçâmedes onde escorpiões se escondem debaixo das pedras arrefecidas pelo esquecimento na picada involuntária de sonos distantes e a gente no norte avista o congo
XL
À cabeceira umas transas perdidas olham-me como azeitonas de um olival espantado, o riso ecoado dos sonhos na lapela escura de um soldado sem nome ou sono sei lá, sinto serem sonhos desvaídos e sem letras como chapas que abanam aos primeiros ventos de cada casa isolada nos recônditos do meu destino. Levantei-me num gesto apenas como se nunca me tivesse deitado sobre estas pedras onde Alzira descansava as tardes, ninguém se imagina pedal de triciclo enquanto tudo mexe nas fontes desaparecidas de que olimpo esmerado nas falésias distribuídas nas areias da cidade, uma bata diferente mais parecia uma tela colorida à janela descobrindo o silêncio que caminha sem rumo e limpando devagar os vidros da tarde, escuta-se sem pensar ser impossível viajar sem rodas nestas pontes de pau seco na barriga dos adormecidos enquanto o pensamento relaxa nas cabeças vazias como trepadoras verdes flutuando metais à cabeceira do que se imagina.
O teatro sucumbe na floresta de moçâmedes onde escorpiões se escondem debaixo das pedras arrefecidas pelo esquecimento na picada involuntária de sonos distantes e a gente no norte avista o congo, a fronteira marcada pela indiferença numa linha invisível a separar-nos do marasmo sobre o rio zaire que espreita gotas para mergulhos no espelho das torrentes que caminham sozinhas para junto do oceano espreitando cabinda aos quadrados e sem recurso segue mesmo que o salgado se entranhe devagar como lesmas na superfície das paredes mal pintadas, como se repetem papagaios soltos na floresta da aziaga enquanto caminhamos solidários levantando os braços como que de um apelo vingado, o rádio vibra comunicações codificadas e nem nós, era apenas o risco de pararmos frente a um turra disfarçado de muçulmano sem tarjas de universitários num campus de coimbra, mas a minha é ainda em benfica nos uivos raivosos de lobos deitados na lama seca dos paióis.
Do brasil manifestantes apelam ao fim desta guerra e há quanto tempo não leio jornais, descortino metais zunindo no mar para que viagem um dia, para que sinta o regresso apenas num levantar de dedos de uma mão engessada pendurada ao peito e um cordel cintilante a carregar-me os ombros uma dor de lutos sem cor e apenas outros na sala esperam novidades de qualquer general sitiado em sofás de cânfora como numa fábrica de hortas descascados para colocar sobre a sopa do jantar para poucos.
Estilhaço os vidros nestes dentes de esmalte cor de perola numa carcaça serena de fantasias e sementes castanhas para degolar a ânsia, vomito o sangue derramado na cama desta insónia vagabunda onde partilhei contigo noites de desespero, sabes, uma recordação de espectáculos no vilaré espantar o auditório num mar longo de risos amarelos enquanto o quarto cheira o fumo abandonado nos quintais antigos onde tantas vezes a minha mãe preparava galinhas para o almoço aos fins-de-semana, eramos vários irmãos à volta dela e corríamos a inocência pelas árvores na altura da flor, comia a fruta que caía sem a lavar, pena das penas que sobravam, do metálico silêncio nas gargantas abandonadas ainda antes do amanhecer ou após a alvorada, ainda aqui, mais do mesmo, ritmo trivial onde sargentos velhos e embirrentos a incomodarem com aquelas barrigas de inverno. Ainda assim o teatro cansava-me a cabeça e no meio dos sorrisos a infância desfrutada como cabritos nos campos de capim verde desta mata sobre as chuvas do cacimbo de ninda ou negage ou songo ou carmona, junto à piscina onde parti a perna um dia num salto de mergulhador à pressa.
Como aperitivo à deliciosa prosa de Vítor Burity da Silva, apresentamos novo capítulo do livro Sobre As Águas Da Vida O Silêncio Dói
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