Talvez existisse a resposta de suas perguntas em um lugar, além das estrelas?
1. Ser ou não crer
(continuação)
“Que nojento” – Cismou.
“O que será que estão a fazer?” – Perguntara a si mesmo, pairando na imaginação de seus audaciosos pensamentos, as imagens descontroladamente fluíam, e quanto mais tempo passasse navegando no desconhecido novo mundo, mais elas se tornavam lúcidas, sem percebe-las, as criaturas em suas imagens, comunicavam-se em um idioma não identificado, suas técnicas de comunicação e interacção parentavam primitivas e limitadoras, pensara Dinares, e suas acções contraditórias, tornavam claro a inexistência de enótita entre elas, carregavam consigo a ambição e o amor egoísta que os auto destruía, a inveja e cobiça que os dividia, o ódio e orgulho que os terrorizava e possuía, a sede de guissán e a ganância na busca de bens enganadores que no final jamais os satisfaria, a infelicidade infinita que com eles morria, sem na realidade ter vivido a experiência divina, a pequena criatura tinha dificuldades de perceber, a luz seria o motivo para elas compreenderem que, o escuro é eterno, porém a luz, ansiada por Dinares, era a magia que tanto ignoravam e de algum modo, a pequena criatura sabia, que havia algo especial nelas, então passou a estudá-las, a chama que acendeu em si, passou a ilumina-lo, na escuridão dominante, sua imaginação traiçoeira passou a guia-lo, tentando captar toda imagem possível que surgisse durante suas visões, criando vida no seu interior, mudando assim radicalmente o seu modo de pensar e ver a Deorum, e no entanto, a criatura passou a viver uma segunda vida secreta no escuro, com paixão da luz, admirando a dimensão do conhecimento de Khaukuh e seu conselho de criaturas com pensamentos ultrapassados, cansados e sem vida, porém, questionando tudo, é claro que sabia das consequências, do perigo que correria em desobedecer à lex magna[9], a punição o levaria há um final infeliz, um sofrimento aterrorizante que duraria noites de escuridão encarcerada, isolada, atormentada até que se rendesse ao arrependimento da jus[10] divina.
Os velhos patriarcas jamais o poupariam, pensara Dinares, suas atitudes e convicções eram notórias, passava o tempo fora de sua domu[11], vagando o espaço vazio, em lugares proibidos, bloqueava o portal dos seus pensamentos, limitando o acesso directo de outras criaturas saberem o que sabia, porém, de algum, mais tarde ou mais cedo, todos haveriam de saber, a jovem criatura consciente que não poderia manter o segredo por muitas noites, ou ao menos 100% do segredo por muito tempo, o fluido de pensamentos em criaturas celestiais era conectado uns ao outros, fazendo com que, as reuniões em enótita, transmitissem uma fracção de até 5% dos pensamentos de cada criatura há todos, em uma fonte energética aberta, revelando todos os pensamentos à superfície, e no entanto, nas reuniões, os segredos eram revelados, alguns questionados, outros selecionados e jogados ao esquecimento, e outros, eram simplesmente arquivados para análises futuras.
Os pensamentos proibidos pela lex[12] eram entregues aos conselheiros, levados ao grande maestre Khaukuh e depois julgados, não obstante, a criatura Dinares, jamais se fazia presente de tais obrigações, acreditara que, tal como os patriarcas, também possuíra o direito de privacidade e liberdade comportamental, é claro que não se achara superior, muito pelo contrário, somente queria perceber, tinha dificuldades em aceitar sem questionar, o que o tornara diferente das demais criaturas da Deorum, talvez dogmatizadas, pensara a jovem criatura, simplesmente algo acima dos seus instintos celestiais, o faziam pensar e agir de tal maneira, talvez o comportamento estivesse em sua linhagem? Pouco sabia dela, sua descendência, ou talvez as imagens nas visões o quisessem revelar algo? Um passado longínquo ainda por ser desvendado? Uma verdade conhecida e protegida pelos patriarcas, porém escondida para nunca ser revelado? Talvez as mais altas criaturas da Deorum não fossem tão celestiais assim como aparentavam ser? Ou talvez o orbe escuro não fosse o único no grande espaço cósmico? Como alegadamente era sabido.
Talvez existisse a resposta de suas perguntas em um lugar, além das estrelas? Incansavelmente Dinares questionara, sem repostas para suas perguntas inquietantes, irritantes e intolerantes, perguntas estas que se as tornasse publico, o trariam severas consequências, então decidiu às guardar para si, embora que o seu comportamento fosse o suficiente para as demais criaturas suspeitarem do que se passara, Dinares desviara toda tentativa de invasão comunicativa, distanciando-se das convivências em enótita, pairando no isolamento de suas visões e se perdia, era muito mais divertido para a jovem criatura se perder na luz de suas visões, do que encarar a tristeza da escuridão, sem esperanças de um futuro condenavelmente morto, para Dinares, o novo mundo que vivenciara, era muito mais curioso e impressivo, do que aquela que conhecera, porém, a sua imprevidência de conter suas emoções, seria fundamental para que acordasse do sono profundo que muito em breve o condenaria.
[9] Lex Magna – Lei sagrada
[10] Jus – Justiça
[11] Domu (s) – Residência (s) / Casa (s)
[12] Lex – Lei (s)
Como aperitivo à prosa de Sérgio de Jesus Miranda, apresentamos novo capítulo do livro Deorum, um lugar além estrelas
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