O “Acordo Ortográfico” de 1990 (AO90) não é, em rigor, um “Acordo”, uma vez que, internamente, não tem consistência ao nível da “unificação” da ortografia, e, externamente, Angola e Moçambique não o ratificaram; não é “novo” (antes remonta aos Projectos do AO86, que, por seu turno, remonta ao Projecto de AO75, começado a ser preparado em 1971); e controversamente é “ortográfico”, devido às facultatividades que consagra e aos pressupostos metodológicos desactualizados em que assenta (por exemplo, no que diz respeito à alegada aproximação da escrita à fala, a pretensa primazia da oralidade, quando, ao invés, a ortografia não é um conjunto de representações de sons; as “pronúncias” contingentes (nem sequer, em rigor, correspondentes à “fonética”); as discriminatórias “pronúncias cultas da língua”).
O “Acordo Ortográfico” de 1990 é, de todas, a pior Reforma em termos técnicos, feita praticamente sem estudos, cheia de falácias, ou seja, de muitos argumentos não científicos e não provados; não só é extremamente imperfeita, mas também nefasta.
O argumento da aproximação da escrita à fala é um argumento ignorante. Várias consoantes “mudas”, como o “h” inicial, não foram eliminadas, em virtude do uso.
A ortografia não representa, nem pode representar, o nível da prolação dos enunciados.
1. As facultatividades, oriundas do “Formulário Ortográfico” da Academia Brasileira de Letras de 1943 (repristinado em 1955), com o qual a alfabetização do Brasil foi feita, são o aspecto mais grave do AO90.
A introdução das facultatividades gráficas generalizadas e irrestritas tem efeitos muito perniciosos, v.g., pulverizar a ortografia em multigrafias entre os vários países lusógrafos e restantes comunidades; em multigrafias regionais; e em multigrafias particulares.
As facultatividades instituídas pelo “Acordo Ortográfico” de 1990 devem ser consideradas irrestritas geograficamente, segundo a letra e o espírito do AO90.
As facultatividades implicam a destruição do conceito normativo de ortografia (cfr. Base I da Convenção Ortográfica de 1945).
2. Os lemas (isto é, entradas de Dicionário) inventados, inexistentes em ambas as variantes, como “conceção” e “receção”, figuram no Tratado do AO90[1] (!). Ora, isso desfigura o núcleo identitário da Língua Portuguesa (no seu todo).
O AO90 é uma tentativa falhada de importação de culturas, senão mesmo “um monumento de incompetência e ignorância”[2], como refere ANTÓNIO EMILIANO.
Ora, para piorar a pretensa “aplicação” do AO90, o ILTEC tem uma interpretação autêntica do AO90 que, para além de inconstitucional (art. 112.º, n.º 5, 2.º parte, da CRP), é calamitosa:
i) Contam-se em centenas os lemas inventados[3] (ao que acresce, nos verbos, 68 formas flexionadas; e, nas restantes palavras, as formas, amiúde, no género feminino e no plural; o que envolve um impacto extremamente amplo da “aplicação” do AO90);
ii) O conversor Lince e o “Vocabulário Ortográfico do Português” não deixam, amiúde, escolher entre as facultatividades permitidas pelo AO90.
3. Em relação a estas normas mais aberrantes, em nosso entender, existe um dever de não atentar contra o património cultural imaterial constituído pela Língua Portuguesa, e, por conseguinte, de desobediência. Para o efeito, há que ter em conta o dever fundamental de preservar, defender e valorizar o património cultural (artigo 78.º, n.º 1, 2.ª parte, da Constituição), de que a língua portuguesa faz parte[4].
Em suma, existe um dever de todos os particulares desobedecerem às normas mais aberrantes do AO90, desfiguradoras do núcleo identitário das normas ortográficas costumeiras de Língua Portuguesa.
4. Antes de tudo, segundo o Embaixador CARLOS FERNANDES, o AO90 não está em vigor “de iure”; ii) a nosso ver, o AO90 é inconstitucional a vários títulos[5]; iii) já de si, o AO90 é um documento de péssima qualidade linguística[6].
Mas há pior: o Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), através do conversor Lince e “Vocabulário Ortográfico do Português”, e outros Linguistas em várias entidades públicas (por exemplo, na Imprensa Nacional – Casa da Moeda, editora do “Diário da República”) têm “executado” o AO90, com ampla redução das facultatividades permitidas.
Ora, esta é uma violação ostensiva quer da letra das inúmeras Bases do Anexo I, quer do espírito do Tratado do AO90, que prevêem facultatividades irrestritas. Os instrumentos oficiais e privados têm suprimido, “a torto e a direito”, as consoantes “c” e “p”; o que, ironia das ironias, faz com que os laços com os Países de Língua Oficial Portuguesa, incluindo o Brasil, sejam deslaçados, ficando Portugal com ortografia diferente da ortografia do Brasil!
Por outras palavras, a (alegada) “implementação” do AO90 desunifica a grafia “acordizada” de Portugal relativamente à maioritariamente grafada no Brasil (v. g., “perspetiva”, por “perspectiva”; “respetivo” por “respectivo”, “aspeto” por “aspecto”).
5. As “aplicações” do AO90, com as entorses aludidas, afastam o Português europeu das principais línguas românicas — como o Francês, em que a escrita está muito dissociada da via oral; o Castelhano, o Italiano, o Romeno, o Catalão — e germânicas, designadamente o Inglês, a língua de comunicação global por excelência actualmente, o que se estende ao domínio científico – e o Alemão[7]–[8]).
Não nos parece haver qualquer sentido lógico em visionar um filme estrangeiro, em que a tradução não contenha essas consoantes (alegadamente “mudas”).
6. Para quem pense, em erro, que o AO90 ajudaria à difusão e à projecção da língua portuguesa, o AO90 não só não se afigura necessário, mas por certo não é o caminho, devido ao facto de regular apenas uma parte da escrituralidade.
Por outro lado, AO90 tem a enorme desvantagem de impedir a correcta apreensão de outras línguas estrangeiras (competência cada vez mais valorizada nos dias de hoje, num mundo globalizado).
7. Após a ratificação do 2.º Protocolo Modificativo ao AO90, o XVIII Governo decidiu acelerar a implementação do AO90 em Portugal. Para esse efeito, o Governo-administrador emitiu a Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, de 25 de Janeiro de 2011 (= RCM).
Esta RCM antecipou o final do “prazo de transição” em 5 anos para o sistema de ensino (público, particular e cooperativo) (n.º 3); e em 4 anos, 9 meses e 22 dias para a Administração Pública (directa, indirecta e autónoma) (n.º 1), bem como para as publicações no “Diário da República” (n.º 2).
A “aplicação” do regulamento administrativo da RCM, por parte do XIX Governo Constitucional, veio a produzir o efeito de gerar o caos gráfico em Portugal e uma alteração significativa da estabilidade ortográfica, que a Ortografia costumeira assegurava.
Porém, o certo é que, em termos jurídicos, essa RCM padece de inconstitucionalidades grosseiras, detectáveis por qualquer aluno de Direito Administrativo, de Direito Constitucional ou de Direitos Fundamentais[9].
Para o efeito, a RCM foi objecto de impugnação, através de uma acção judicial popular junto do Supremo Tribunal Administrativo, em 15-7-2014.
Infelizmente, a Justiça Administrativa tem tardado…[10].
8. Em nossa opinião, o AO90 não irá vingar, pois encontra-se mal feito na sua génese, gerando inúmeros erros de “aplicação” (por se basear em pressupostos desactualizados na Linguística e, por conseguinte, estarem errados, à luz da Ciência, pelo menos desde os anos setenta; v. g., a alegada primazia da oralidade sobre a escrituralidade), equívocos, “erros de acordês”. A única solução digna de um Estado de Direito é que seja ordenado o retrocesso na “aplicação” do AO90, fazendo Portugal sair deste parêntesis mal-afamado, para bem dos Portugueses e das gerações vindouras. Mais cedo ou mais tarde, é isso que terá de suceder.
Explicação sobre o título do presente artigo:
Segundo o Professor, Linguista e Filólogo ANTÓNIO EMILIANO[11], “O Acordo Ortográfico é um monumento de incompetência e ignorância”[12], “um desastre”[13], produto de “indigência intelectual”[14] de “inépcia científica”[15], e de “completa insensatez”[16] e sandice:
i) Incompetência: as lacunas das pessoas que labutaram no “Acordo Ortográfico” de 1990 (Anexo I), em matéria de domínio técnico da literacia, são evidentes[17].
Quem fixou as Bases do Anexo I AO90, pegando nos Projectos de Acordo Ortográfico de 1975 e de 1986, e aceitou essas anteriores soluções, pouco mais acrescentando, “demonstrou não dominar adequadamente conceitos como ortografia, grafema, língua escrita, língua portuguesa, norma linguística, entre outros, etc.”[18].
“A reforma ortográfica que se pretende impor” aos Portugueses “está cheia de erros técnicos (e disparates)”[19].
A base teórica do AO90 “configura um desastre”[20];
ii) Ignorância, pois “os autores do Acordo” de 1990 – ou, talvez melhor, os plagiadores de várias das Bases do Projecto de AO75 e do AO86 – “não tinham qualificações mínimas em matérias como Literacia, Grafética, Grafemática [[21]], Psicolinguística, Psicologia, Psicologia, Didáctica, etc.”[22]–[23].
Notas
– Adira aos Grupos anti-AO90 no Facebook, designadamente ao Grupo “Cidadãos contra o “Acordo Ortográfico” de 1990” (https://www.facebook.com/groups/acordoortograficocidadaoscontraao90/), onde quotidianamente a liberdade de expressão (art. 37.º, n. 1, da CRP) e o direito de resistência contra normas inconstitucionais (art. 21.º) são exercidos; e coloque “Gosto” na Página “Tradutores contra o Acordo Ortográfico”.
Aquele Grupo do Facebook tem um Plano concreto de acções para o ano de 2016, designadamente:
1) Vias políticas: Iniciativa de Referendo ao AO90 em curso.
2) VIAS JURÍDICAS:
i) Acção judicial popular, intentada em 15-7-2014, que tarda em ser apreciada;
ii) Difundir o escrito do Embaixador CARLOS FERNANDES, sustentando que o AO90 não vigora “de iure“, publicando um livro sobre o assunto. Sairá no “Público” um artigo com a argumentação resumida. Depois, será publicado um livro.
iii) Exercer o direito de resistência face a normas inconstitucionais (artigo 21.º da Constituição).
– ASSINE e dê a assinar a Iniciativa de Referendo ao AO90, fazendo a impressão do documento em formato PDF, a partir de https://referendoao90.wordpress.com/documentos-para-recolha-de-assinaturas/.
Não guarde as assinaturas que tem. Digitalize-as e envie-as celeremente para [email protected]; ou, por carta, para o endereço do Centro de Estudos Clássicos ou para o Centro de Estudos Comparatistas.
[1] Base IV, n.º 1, al. c), do Anexo I do AO90; Anexo II, “Nota Explicativa”, 4.1.1.
[2] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do desacordo ortográfico. Textos de Intervenção em Defesa da Língua Portuguesa contra o Acordo Ortográfico de 1990, Verbo/Babel, Lisboa, 2010, pgs. 81, 172, 34, cfr. IDEM, O fim da ortografia. Comentário razoado dos fundamentos técnicos do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), Guimarães Editores, Lisboa, 2008, pg. 102.
[3] “Contraceção”, por “contracepção”; “anticoncetivo”, por “anticonceptivo”; “receção”, por “recepção”; “perceção”, por “percepção”; “confeção”, por “confecção”.
[4] Existe um dever fundamental com uma dupla vertente: i) em sentido negativo, um dever de abstenção da prática de actos lesivos do núcleo identitário da língua portuguesa; ii) um dever positivo de impedir a destruição da mesma.
[5] Para a enunciação das inconstitucionalidades totais e parciais do AO90, v. o resumo em IVO MIGUEL BARROSO / FRANCISCO RODRIGUES ROCHA, Guia jurídico contra o “Acordo Ortográfico” de 1990. Fundamentação jurídica relativa às inconstitucionalidades do “Acordo Ortográfico” de 1990; da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, de 25 de Janeiro; do conversor “Lince” e do “Vocabulário Ortográfico do Português”; e diplomas neles baseados, 19 de Novembro de 2014, disponível para descarga a partir de http://www.publico.pt/ficheiros/detalhe/requerimento-ao-ministerio-publico-contra-o-acordo-ortografico-20141120-233159, pgs. 99-106.
[6] V. IVO MIGUEL BARROSO, Acordo Ortográfico: nunca é tarde para corrigir um erro, in Público, 26 de Fevereiro de 2014, http://www.publico.pt/n1626119.
[7] V., por todos, o estudo exaustivo de Filologia Comparada, da autoria de FERNANDO PAULO BAPTISTA, Por amor à Língua Portuguesa, Piaget, Lisboa, 2014.
[8] Muito mais do que a Reforma de 1911 já havia afastado, ao suprimir as consoantes “c” e “p” depois das vogais “i” e “u” (ex., “vi(c)tória”; “produ(c)to”), uma vez que não tinham valor diacrítico; consoantes essas que eram não só grafadas nessas línguas estrangeiras, mas também, amiúde até, são pronunciadas (ex., “aCt” em Inglês; “AKt” em Alemão).
Certas “consoantes nulas” eram, assim, suprimidas.
Porém, a Reforma de 1911, embora procurasse seguir o Castelhano (em detrimento do Francês e do Inglês), preservou um núcleo comum às restantes eurolínguas.
Com efeito, as consoantes “c” e “p” – quer quando a vogal ‘a’, ‘e’ ou ‘o’ precedente é átona, quer em vocábulos aparentados, quando é tónica” -, quando ou fossem facultativamente pronunciadas, ou tivessem valor diacrítico (abertura da vogal precedente) ou fossem relevantes para a manutenção da família de palavras, foram expressamente preservadas na Reforma de 1911, em termos relativamente próximos dos propostos por GONÇALVES VIANA:
“I. Escrever-se hão sempre as letras que facultativamente se proferem, como, por exemplo, nas palavras (…) facto (…)
“II. Quando uma consoante muda influi na vogal precedente, vestíjio que perdurou de quando ela ainda se proferia, deve escrever-se também; exemplos: director = ‘dirètor’, não ‘diretor’; acção = àção, e não ‘ação’; preceptor = ‘precètor’ (ou ‘precèp-tor’), e não ‘precetor’.” (A. R. GONÇÁLVEZ VIANA, Ortografia Nacional. Simplificação e unificação sistemática das Ortografias Portuguesas, Lisboa, Livraria Editora Viuva Tavares Cardoso, 1904, pg. 73.).
“‘Acção’ pronuncia-se à-ção, mas escreve-se com dois ‘cc’, mesmo em ortografia simplificada, porque, com um só poderíamos lêr ‘â-ção’, como lemos â-câ-so’, etc.
Da mesma forma, em ‘redactor’, não se pronuncia-se o ‘c’, mas escreve-se, porque é êle que dá valor aberto á vogal anterior. Sem êle, poderíamos ler ‘re-dâ-tor’, como lemos (…) ‘co-men-dâ-dôr’, etc.
Ao caso de ‘recepção’ e redactor’ podem adicionar-se muitos outros, similares: ‘inspecção’, ‘redacção, ‘distracção’, estupefacção’, ‘facção’, etc. Suprimir nêstes casos a consoante ‘aparentemente’ inútil, não é desacatar a etimologia, – o que sería o menos: – é desacatar a fonética – o que é o mais ou quase tudo.” (CANDIDO DE FIGUEIREDO, A ortografia no Brasil (A propósito da Reforma ortográfica votada pela Academia Brasileira), História e crítica, Livraria Clássica Editora, Lisbôa, 1908, pg. 171).
“‘predilecção’, ‘exceptuar’, e não (…) predileção’, ‘excetuar’” (A. R. GONÇÁLVEZ VIANA, Ortografia Nacional, 1904, pg. 289).
“III. Algumas palavras de derivação ou afinidade evidente devem conservar também as letras mudas; exemplos: adoptar, adopção; a par de ‘optar’, ‘opção’, com o ‘p’ pronunciado; Ejipto, a par de ejípcio, em que se ouve o ‘p’ (…)” (A. R. GONÇÁLVEZ VIANA, Ortografia Nacional, pg. 73 (negritos originais)). Assim também “‘gimnásio’, e não, ginásio; ‘acto’, e não, ato; ‘excepto, e não ‘exceto’; em razão de ‘acção’, excepção’ (…)” (A. R. GONÇÁLVEZ VIANA, Ortografia Nacional, pg. 289).
“Outro exemplo é espectaculo, no qual ninguém profere o ‘c’, que muitos, porém, em ‘espectador’ deixam ouvir, como em ‘expectativa’, ‘expectante’, etc.; isto com o fundamento de que todos devem reconhecer na escrita a pronunciação que dão a cada vocábulo, logo que não seja viciosa. Quando a mesma vogal de um primitivo seja tónica, conservar-se há nele a consoante nula: acto, em razão de activo, acção = ‘àtivo’, ‘àção’.” (A. R. GONÇÁLVEZ VIANA, Ortografia Nacional, pg. 73, negritos originais).
Seguindo de perto este lastro doutrinário, a Reforma de 1911 consignou uma limitação muito lata à supressão de tais consoantes “mudas” “c” e “p”:
“Casos, porêm, há, e muitíssimos, em que tais consoantes ou são ainda facultativamente proferidas ou a sua influência subsiste no valor das vogais ‘a’, ‘e’, ‘o’, que as precedem, as quais, em vez de se obscurecerem, como é de regra, nas sílabas antetónicas, conservam os seus valores, relativamente ‘à’, ‘è’, ‘ò’, que tinham quando essas consoantes, hoje mudas, se proferiam. Dêste modo, a Comissão entendeu ser de necessidade a conservação delas, quer quando a vogal ‘a’, ‘e’ ou ‘o’ precedente é átona, quer em vocábulos aparentados, quando é tónica; por exemplo: ‘direcção’, ‘directo’, ‘acção’, ‘activo’, ‘acto’, ‘tracção’, ‘tracto’, ‘excepção’, ‘exceptuar’, ‘excepto’, ‘adopção’, ‘adoptar’, ‘adopto’, comparados estes últimos vocábulos com ‘opção’, ‘optar’, ‘opto’, em que o ‘p’ se profere. Com esta excepção aos princípios simplificadores que a Comissão observou no sistema ortográfico que propõe, conseguiu não demudar o aspecto de centenas de palavras relativamente modernas, mas de uso constante; e com tanto maior razão o fêz, quando é certo que em muitas destas palavras as letras ‘c’ e ‘p’ por muitas pessoas ainda são proferidas, tais como ‘facção’, ‘recepção’, ‘espectador’, a par de ‘espe(c)táculo’, etc.” [Relatório da Comissão nomeada, por portaria de 15 de Fevereiro de 1911, para fixar as bases da ortografia que deve ser adoptada nas escolas e nos documentos oficiais e outras publicações feitas pelo Estado., (publicada no Diário do Govêrno, n.º 213, 12 de Setembro), in Collecção Official de Legislação Portuguesa, Anno de 1911, Primeiro semestre, Imprensa Nacional, Lisboa, 1915, pgs. 1916-1921 (um excerto do Relatório encontra-se publicado in A demanda da ortografia portuguesa. Comentário do Acordo Ortográfico de 1986 para a compreensão da Questão que se lhe seguiu, Volume organizado por IVO CASTRO / INÊS DUARTE / ISABEL LEIRIA, 2.ª ed., Edições João Sá da Costa, Lisboa, 1987, pgs. 153-154)].
[9] Para desenvolvimentos sucintos, v. Súmula sobre as inconstitucionalidades orgânicas, materiais e formais da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, que mandou aplicar o “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” à Administração Pública e a todas as publicações no “Diário da República”, a partir de 1 de Janeiro de 2012, bem como ao sistema educativo (público, particular e cooperativo), a partir de Setembro de 2011. Inconstitucionalidades e ilegalidades “sui generis” do conversor “Lince” e do “Vocabulário Ortográfico do Português”, Janeiro de 2014, versão “on line”, in Portal Verbo Jurídico.
Para desenvolvimentos mais amplos, v. IVO MIGUEL BARROSO, Inconstitucionalidades orgânica e formal da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, que mandou aplicar o ‘Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa’ à Administração Pública e a todas as publicações no “Diário da República”, a partir de 1 de Janeiro de 2012, bem como ao sistema educativo (público, particular e cooperativo), a partir de Setembro de 2011. Inconstitucionalidades e ilegalidades ‘sui generis’ do conversor ‘Lince’ e do ‘Vocabulário Ortográfico do Português’, in O Direito, 2013, I / II, pgs. 93-179; a segunda parte tem o mesmo título, com a menção final “”, in O Direito, 2013, III, pgs. 439-522.
Para intentar uma acção judicial popular ou ao abrigo do artigo 73.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, podem ser aproveitados os articulados de Peça processual, devidamente adaptados, e colocando duas questões prévias (a primeira é a de que o AO90 não está em vigor, “de iure”; a segunda é a de que o AO90 padece de inconstitucionalidades várias, pelo que a RCM n.º 8/2011 é inconstitucional a título consequente), a partir de IVO MIGUEL BARROSO / FRANCISCO RODRIGUES ROCHA, Guia jurídico contra o “Acordo Ortográfico” de 1990 (…), in “Público” “on line”, pgs. 20-99.
[10] Antes disso, em 20 de Dezembro de 2011, fizemos uma queixa ao Provedor de Justiça.
Passados 4 anos e um mês, não recebemos qualquer resposta.
Caso o Provedor de Justiça tivesse actuado a tempo, teria porventura impedido o facto consumado inconstitucional da “aplicação” da RCM 8/2011.
[11] ANTÓNIO EMILIANO é Professor de Linguística, Associado com Agregação, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
É licenciado e Mestre pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Tem três obras publicadas sobre o AO90.
[12] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 81, 172, 34.
No mesmo sentido, FERNANDO PAULO BAPTISTA, considerando o AO90 um “monumento” à incongruência epistemológica e à incompetência linguística, filológica e pedagógico-didáctica” (Essa sinistra guilhotina, http://ilcao.cedilha.net/?p=5334). Aludindo a “um “normativo ortográfico” epistemológica e filologicamente tão aberrante como é o actual AO /1990”, FERNANDO PAULO BAPTISTA, «Por amor à Língua Portuguesa». Ensaio genealógico-filológico, científico-linguístico e pedagógico-didáctico, visando a superação crítica do actual ‘Acordo Ortográfico / 1990’, Edições Piaget, Lisboa, 2014, pg. 64.
Alguns Autores “acordistas” reconheceram isso mesmo. Por exemplo, EVANILDO BECHARA, não obstante ser um destacado “defensor” do AO90 no Brasil, admitiu, porém, o seguinte:
“O Acordo Ortográfico não tem condições para servir de base a uma proposta normativa, contendo imprecisões, erros e ambiguidades” (EVANILDO BECHARA, 3.º Encontro Açoriano da Lusofonia, realizado entre 8 e 11 de Maio de 2008, apud ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 42, 133).
a) Ainda assim, BECHARA afirmou que, mesmo com “falhas”, todas as propostas de reforma têm sido “aceitas e adotadas mesmo assim, com promessas de melhorias no futuro”… (EVANILDO BECHARA, a propósito do Manifesto a favor da aplicação rápida do Acordo Ortográfico, subscrito em 11 de Maio de 2008, apud ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pg. 43).
Ora, com o devido respeito, tais “melhorias” teriam de ser aceites através de uma revisão do AO90.
Quem conhece o Direito dos Tratados sabe perfeitamente que, se o AO90 é para ser revisto, é necessário que haja uma alteração do teor do Anexo I e II (Bases e Nota Explicativa). Ou seja, tal implicaria um novo Tratado entre todos os Estados da CPLP, no sentido de alterar o Anexo I do AO90.
Ora, para que isso suceda, é necessário que todos os Governos dos Estados assinem; e que, depois, ratifiquem.
Por outro lado, tal propósito de revisão significaria que pelo menos parte das normas do AO90 não seriam para cumprir.
Porém, os “revisionistas”, enquanto tal objectivo quimérico não é alcançado, lá vão continuando a “aplicar” o AO90… Por conseguinte, objectivamente, as posições revisionistas são frustres, à espera, messianicamente, de uma revisão do AO90. Dizer-se revisionista ou pretendendo uma “avaliação” do AO90 equivale, na prática – na ausência de uma possibilidade real de alteração do Tratado do AO90 por unanimidade, a ser-se a favor do AO90.
b) À luz da Constituição democrática de 1976, é inconstitucional empreender uma Reforma ortográfica de Direito positivo.
Por outro lado, sociologicamente, em Portugal pelo menos, as posições estão muito extremadas, e não há lugar a meios-termos. Uma “revisão” do AO90 revela-se inaceitável em termos da maioria das pessoas que contesta o AO90.
c) Mas, em termos técnicos – abstraindo das considerações políticas anteriores -, não nos parece que o AO90 seja reformável.
No fundo, o que é que, do AO90, se poderia manter? Apenas parte da Base I, sobre o alfabeto (e, mesmo assim, contém erros, como “dáblio”, quando poderia ser traduzido por “duplo v”), e pouco mais.
Fazer propostas de “melhoria” do que não pode ser melhorado revela-se contraproducente. Um “Acordo Ortográfico” (em termos ideais) e o AO90 em particular são projectos falhados.
O destino adequado para o AO90 é o caixote do lixo.
Desta forma, em nossa opinião, as posições “revisionistas” do AO90 são de rejeitar.
[13] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 75, 153.
[14] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 75, 153.
[15] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 68, 153.
[16] Cfr. ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pgs. 192, 57.
[17] ANTÓNIO EMILIANO, O fim da ortografia. Comentário razoado dos fundamentos técnicos do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), pg. 71.
[18] Cfr. ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pg. 173.
[19] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pg. 28.
[20] FRANCISCO MIGUEL VALADA, Demanda, deriva, desastre: os três dês do Acordo Ortográfico, pg. 17.
[21] Nenhum dos arquitectos do AO era especialistas de Grafemática, nem consta que tivessem especial preparação nessa área (ANTÓNIO EMILIANO, Foi você que pediu um Acordo Ortográfico?, pg. 10).
O filósofo JOSÉ GIL classificou o AO como “néscio e grosseiro”.
[22] ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pg. 173.
[23] Considerando que “a mentalidade acordista” é “retrógrada, irrealista, insensível, impatriótica, irresponsável, incompetente e ignorante. Representa o triunfo (…) da ignorância arrogante”, ANTÓNIO EMILIANO, Apologia do Desacordo Ortográfico, pg. 49.