O Ministério das Finanças está a bloquear a gestão da ADSE, prejudicando os beneficiários para acumular elevados excedentes e assim reduzir o défice à custa dos descontos dos trabalhadores e dos aposentados da função pública
ESCLARECIMENTO: Poucas horas após ter divulgado esta informação aos beneficiários da ADSE na INTERNET, portanto no próprio domingo, dia 23/5/2021, a Sra. Secretária de Estado do Orçamento despachou todos os processos de aquisições da ADSE que constam do quadro 2 deste estudo e que há vários meses estavam “congelados” pelo Ministério das Finanças. Em 10/5/2021 eu tinha enviado uma mensagem à Sra. Secretária de Estado, chamando a atenção para os prejuízos que esse congelamento estava a causar a ADSE e aos beneficiários, e que constam deste estudo. E na mesma mensagem alertava para o facto de que a situação se não fosse resolvida rapidamente eu teria de informar os beneficiários.
A resposta foi o silencio e a manutenção de uma situação que era ao mesmo tempo inaceitável e insustentável. Fica assim claro que não existiu qualquer deslealdade minha face à tutela. Mas que fique claro que a minha primeira lealdade e compromisso é com os beneficiários cujos representantes me elegeram. Mesmo assim quero agradecer à Sra. Secretário de Estado do Orçamento a sua decisão, e faço votos, como representante dos beneficiários no Conselho Diretivo, que a relação entre o Ministério das Finanças e os representantes dos beneficiários na ADSE melhore, pois, penso que esse deve ser o objetivo e interesse de todas as partes para bem dos beneficiários e da ADSE.
Estudo
O Ministério das Finanças está a bloquear a gestão da ADSE, prejudicando os beneficiários para acumular elevados excedentes e assim reduzir o défice à custa dos descontos dos trabalhadores e dos aposentados da função pública
A ADSE tem duas tutelas: a do Ministério das Finanças e a do Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública (MMEAP). Em abono da verdade é preciso esclarecer o seguinte. Enquanto a ministra Alexandra Leitão do MMEAP reúne-se periodicamente com o Conselho Diretivo da ADSE, analisando problemas que enfrenta a ADSE, e dando o seu apoio à ADSE, nomeadamente tomando decisões rápidas sobre as matérias do seu âmbito, em relação ao Ministério das Finanças o que tem acontecido é precisamente o contrário. Nunca o Ministério das Finanças teve reuniões com o atual Conselho Diretivo da ADSE, e o que tem feito é criar obstáculos e dificuldades à sua gestão e funcionamento levando meses e meses para despachar aquisições mesmo por menor que seja o seu valor, dificultando assim ao extremo a gestão da ADSE. Esta atuação do Ministério das Finanças é, a meu ver, incompreensível e inaceitável porque está a prejudicar os beneficiários e a ADSE. Os valores destas aquisições estão considerados no orçamento da ADSE aprovado pelo governo. O Orçamento do Estado não financia a ADSE. A ADSE é financiada com os descontos dos trabalhadores e aposentados da Função Pública.
A dimensão do financiamento da ADSE pelos trabalhadores e aposentados da Função Pública
Os trabalhadores e aposentados da Função Pública descontam todos os meses (14 meses) 3,5% dos seus salários e pensões. A receita desses descontos, que financia a ADSE, tem sido a seguinte
Quadro 1 – Descontos anuais dos trabalhadores e aposentados da Função Pública para a ADSE
No período 2012/2020, os trabalhadores e os aposentados da Função Pública descontaram das suas remunerações e pensões 4.542 milhões € para a ADSE. Só em 2020, os descontos atingiram 624 milhões €. Fica assim claro que quem financia fundamentalmente a ADSE são os trabalhadores e os aposentados da Administração Pública e não o O.E. É legitimo que os beneficiários esperem, como contrapartida, que as suas necessidades em cuidados de saúde sejam satisfeitas atempadamente. Mas para que isso aconteça é indispensável que a ADSE funcione bem. O que tem acontecido é que o Ministério das Finanças está a criar sistematicamente obstáculos à gestão e funcionamento da ADSE. Tal só pode ser entendido como tendo por objetivo acumular elevados excedentes na ADSE para reduzir o défice orçamental.
Não estou a acusar o Ministério das Finanças de se estar a apropriar desses excedentes o que seria ilegal (e isso não acontece), o que estou a afirmar é que a acumulação de elevados excedentes na ADSE, que serão conhecidos quando a Conta de Gerência da ADSE de 2020 for entregue ao CGS para obtenção de parecer, contribui para reduzir o défice porque este, para a Comissão Europeia, resulta da consolidação de todos os saldos de todas as Administrações Públicas. E a ADSE faz parte da Administração Pública.
Como o Ministério das Finanças está a dificultar e a criar obstáculos à gestão e ao funcionamento da ADSE, prejudicando a ADSE e os beneficiários que a financiam
A ADSE tem atualmente 1,2 milhões de beneficiários, sendo 880.000 beneficiários titulares – trabalhadores e aposentados da Função Pública – e são só estes que descontam para a ADSE. E além destes, tem 348 mil beneficiários que são familiares e mais de 60.000 isentos que têm os mesmos direitos, mas que não descontam nada para a ADSE. Para garantir o funcionamento da ADSE, assegurando o acesso a cuidados de saúde a 1,2 milhões beneficiário e combater a fraude, a ADSE, tem apenas 179 trabalhadores, em atividade somente 176, embora o seu quadro de pessoal aprovado por lei seja de 265 trabalhadores.
Desde 2019 (e a situação já se agravou porque a ADSE já perdeu 10 trabalhadores desde 2019), o Conselho Diretivo da ADSE tem informado as tutelas que necessita, pelo menos, de mais 10 técnicos superiores e de mais 23 trabalhadores de outras carreiras profissionais (20 assistentes técnicos, 2 assistentes operacionais e um informático) sendo para isso necessário abrir rapidamente concursos para recrutar estes trabalhadores que somados aos existentes – 179 – dão 212 trabalhadores, um numero muito inferior aos que constam do quadro de pessoal da ADSE que são 265 trabalhadores.
E o que aconteceu com o recrutamento dos técnicos superiores? Em 2019, o Ministério das Finanças decidiu concentrar em si a contratação de todos os técnicos superiores para a Administração Pública, impedindo assim que os serviços públicos de o fazerem diretamente. Em 9 de Julho de 2019, numa nota à comunicação social o Ministério das Finanças informou a abertura de um “concurso para recrutamento de 1.000 técnicos superiores”. Num prazo de 15 dias úteis, que foi o dado, inscreveram-se mais de 20.000 candidatos. Apesar desse concurso ter sido lançado em 2019, só em maio de 2021 é que a ADSE foi informada, pela tutela, que lhe tinham sido atribuídos 2 técnicos superiores dos 10 pedidos. E desde 2019 já saíram da ADSE, por aposentação e mobilidade, 3 técnicos superiores. Mesmo com a entrada destes 2 técnicos superiores a ADSE ficará em pior situação, em pessoal mais qualificado, do que aquela que tinha em 2019. A ADSE está a fazer um grande investimento no sistema de informação para combater a fraude e o consumo desnecessário, mas não tem técnicos suficientes com as competências necessárias para tirar partido desse investimento. Desta forma o Ministério das Finanças não ajuda a ADSE mas ajuda aqueles que estão a causar prejuízos à ADSE.
E o que aconteceu com recrutamento dos 23 trabalhadores de outras carreiras que a ADSE já precisava em 2019? No início de janeiro de 2020, a ADSE publicou no Diário da República um Aviso anunciando a abertura de concursos para o recrutamento daqueles trabalhadores. Inscreveram-se mais de 2000 candidatos. Mas para fazer a seleção de 23 trabalhadores num conjunto de mais de 2000 candidatos a ADSE não tem recursos humanos para o fazer. Necessitava de contratar uma empresa privada. Mas para o poder fazer precisa de autorização previa – despacho – do Ministério das Finanças – o que é sempre difícil de obter, apesar do dinheiro ser dos descontos dos beneficiários. Para ultrapassar os obstáculos criados, a ADSE decidiu acordar com o INA, que é um Instituto Público, a realização da seleção dos 23 candidatos. Mas o INA tem despesas e quer ser ressarcido delas. Mas para que a ADSE possa pagar essa despesa, mesmo ao INA, necessita de autorização do Ministério das Finanças. E essa autorização está congelada no Ministério das Finanças desde dez.2020 (quadro 2). Ao fim de 2 anos a ADSE continua a não ter nenhum dos 23 trabalhadores que necessita desde 2019. Estes obstáculos criados pelo Ministério das Finanças, tem consequências graves quer para os beneficiários – atrasos nos reembolsos – quer no combate à fraude por falta de recursos com as competências necessárias.
Para minorar os prejuízos para os beneficiários (atrasos nos reembolsos) desta atuação do Ministério das Finanças, a ADSE é obrigada a comprar “pacotes” de dezenas de milhares de horas a empresas de trabalho temporário a quem paga menos 7€/hora devido a uma imposição do Ministério Finanças (os trabalhadores recebem depois apenas 4,5€/hora). Mas este ano o Ministério das Finanças até nisto criou obstáculos, o que atrasou tudo.
No início de 2020, a ADSE chegou a ter 650.000 documentos em atraso para reembolsar aos beneficiários do Regime Livre, o que causava a indignação e protestos destes, que tinham de adiantar o pagamento ao prestador sendo depois reembolsados, de apenas uma parcela da despesa, 3 ou mais meses depois. Com os 22 trabalhadores que a ADSE tem nesta área e com o apoio de 12 trabalhadores precários do pacote de 20000 horas que a ADSE adquiriu em 2020 conseguiu-se que, no início de 2021, o número de documentos por codificar tivesse sido reduzido para menos de 100.000 e o prazo de reembolso aos beneficiários para cerca 30 dias. Mas para manter este prazo de reembolso era necessário adquirir novamente um pacote de 20.000 horas de trabalho precário em 2021 pois, pela via de concursos externos, a ADSE não tinha conseguido nem um trabalhador. Mas o Ministério das Finanças só deu autorização em abril de 2021, e os trabalhadores precários só estarão na ADSE em julho. Perdeu-se assim 6 meses, e o número de documentos em atraso no Regime Livre já duplicou e os atrasos nos reembolsos podem de novo acontecer. É importante que os beneficiários da ADSE conheçam isto para que saibam de quem é a responsabilidade. Não é do Conselho Diretivo.
Aquisições necessárias ao funcionamento da ADES que aguardam “despacho” do Ministério das Finanças há vários meses
Para além dos casos anteriormente referidos, há outras aquisições necessárias ao funcionamento normal da ADSE que estão bloqueadas no Ministério das Finanças à espera de autorização (despacho) há meses, apesar das verbas destas aquisições constarem do Orçamento da ADSE de 2021 que foi aprovado pelo governo e pela Assembleia da República, aquando da aprovação do O.E. Para que os beneficiários, que financiam a ADSE, e também os portugueses, possam ficar com uma ideia clara da natureza deste controlo e da política sistemática de atrasar aquisições durante meses do Ministério das Finanças, que certamente aplica a toda a Administração Pública, reunimos num quadro os processos que o Ministério das Finanças tem em seu poder bloqueados há já vários meses.
Quadro 2 – Aquisições da ADSE que se encontram bloqueadas há meses no Ministério das Finanças
O bloqueamento de aquisições de serviços pelo Ministério das Finanças durante meses a fio, alguns deles de poucos milhares de euros, a uma entidade que tem a responsabilidade de gerir centenas de milhões € por ano, quando essas aquisições visam aumentar a formação dos seus trabalhadores, contratar trabalhadores que são indispensáveis ao controlo da despesa e ao combate à fraude, ao reembolso atempado de despesas aos beneficiários, ao melhoramento da informação e da resposta a questões dos beneficiários, é ao mesmo tempo incompreensível e inaceitável, e não tem qualquer racional, e tem custos elevados para a ADSE (sem meios adequados a ADSE não consegue combater eficazmente a fraude e o consumo desnecessário o que pode por em causa a sustentabilidade da ADSE ) e para os beneficiários (ex.: atrasos no pagamento dos reembolsos e redução das comparticipações no Regime Livre).
Uma gestão eficiente e eficaz é impossível com este bloqueio permanente e autocrático do Ministério das Finanças. É preciso estar atento à revisão da tabela do Regime Livre
Os dados apresentados e a informação dada parece-nos suficiente para mostrar as dificuldades enormes que enfrenta atualmente não só a ADSE mas toda a Administração Publica, pois a ADSE é certamente apenas um exemplo, e revelam também, a meu ver, que esta Administração Pública a continuar a funcionar desta forma, em que o poder autocrático do Ministério das Finanças se sobrepõe a tudo, fazendo o que quer, e não tendo de dar explicações a ninguém mesmo em relação a uma entidade que está a cumprir o Orçamento aprovado pelo governo e pela Assembleia da República e que não é financiada com dinheiros do Orçamento do Estado, mas sim com os descontos dos trabalhadores e aposentados da Função Pública (nas entidades publicas financiadas pelo Orçamento do Estado previsivelmente a situação será ainda pior); repetindo, uma Administração Pública a funcionar assim será certamente ineficiente e incapaz de responder aos graves problemas e grandes desafios que o país enfrenta e às necessidades dos portugueses.
E não será capaz de assegurar a boa e atempada execução simultânea dos 3 programas comunitários (Portugal 2020, PRR e QFP 2021-2027 com 58 mil milhões € de fundos comunitários) que o país necessita que o seja para sair da crise profunda em que está e para se desenvolver. É urgente reduzir o poder autocrático do Ministério das Finanças que congela o tempo que quer aquisições e contratações de trabalhadores essenciais aos serviços públicos mesmo aquelas que constam dos orçamentos aprovados, desorganizando tudo, e responsabilizar os dirigentes destes pelo cumprimento dos objetivos fixados e dos orçamentos aprovados.
Aos beneficiários da ADSE prometo que, enquanto estiver no Conselho Diretivo da ADSE, para além de defender os seus direitos, os informarei de tudo que é importante que conheçam.
E a primeira informação que é importante que os beneficiários saibam é que se vai iniciar a revisão da Tabela do Regime Livre e devem estar atentos pois aqui o objetivo desta revisão é diferente da do Regime Convencionado e poderá ter impacto grande para eles. Vou defender que as comparticipações aos beneficiários não diminuam pois, em muitas regiões do país, este regime é o único meio de acesso a cuidados de saúde através da ADSE porque não existem prestadores convencionados. E, para além disso, há muitos beneficiários que valorizam a liberdade de escolha, nomeadamente os contribuintes líquidos atuais, que na sua maioria são os com remunerações e descontos mais elevados e que devido à idade que têm pagam mais do que recebem nesta fase da sua vida. E é importante mantê-los na ADSE.
Em 2019, os beneficiários pagaram no Regime Livre 323 milhões € e receberam da ADSE 150 milhões € (de reembolsos). E suportaram a diferença (173 milhões €). Aumentar ainda mais a parcela suportada pelos beneficiários não deve ser, a meu ver, o objetivo da revisão da Tabela do Regime Livre. Combater a fraude e o consumo desnecessário devem ser os grandes objetivos da revisão da Tabela do Regime Livre. Para isto contem comigo. Para uma redução geral dos reembolsos aos beneficiários e aumentar os encargos que têm já de suportar (173 milhões € em 2019) não contem comigo.