Poema inédito de Beatriz Aquino
Vivo como quem espera.
Vivo como quem espera.
Como quem sonha.
Observo as ruas acidentadas. Suas árvores se tornando castanhas.
O verde se despedindo.
É preciso de uma fé robusta para atravessar invernos.
Os de fora.
E os de dentro.
Hoje fui à um miradouro.
E a paisagem não me disse nada. Parecia adormecer sobre os braços do silêncio.
É verdade que as coisas hibernam esperando que a paz floresça no coração dos homens?
Não sei.
O que sei é que dias assim cansam.
Exigem de nós um fôlego extra.
Um passo a mais.
E na aridez da paisagem, o peito inteiro vira um altar de lembranças.
De esperanças, de buscas.
O alpinismo da vida nos cega,
o ar rarefeito da subida nos confunde a razão.
E ao chegarmos no tão sonhado topo,
nos damos conta que parte de nós ficou pelo caminho.
E o que sobra são alguns membros atrofiados. E outros amputados para o avançar na caminhada.
Quantos rostos, quantos beijos, quantos nomes deixamos na estrada.
A trilha que desenhamos atrás de nós é deveras confusa. Ninguém fará justiça à nossa arqueologia.
Volto pra casa.
Não encontro solução para esse poema. Esse é um dia sem encanto. Sem nenhuma dádiva a agradecer além daquela de estar vivo.
E sei que deveria ser o bastante. Mas em dias assim permito que o cansaço cubra de cinza o meu verbo.
Amanhã estarei de pé novamente. Para observar a mesma paisagem.
E garimpar nela, quem sabe,
um pouco de luz e melodia.