Situação de estiagem extrema afeta agricultura, indústria e comércio de importantes economias globais como EUA, Europa, China e Índia.
China, Estados Unidos, Europa e Índia estão registrando secas históricas. O recorde de altas temperaturas no Hemisfério Norte tem causado mortes, perda da produção agrícola, desabastecimento de energia, desertificação de áreas, rios secos, favorecimento de incêndios florestais e prejuízo econômico: tudo ao mesmo tempo.
“O sistema energético global está quebrado” e, com isso, estamos “cada vez mais próximos de uma catástrofe climática”, afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, após a divulgação do relatório Estado do Clima, da Organização Meteorológica Mundial (OMM). O documento mostra a “triste repetição do fracasso humano em combater os problemas climáticos”.
Especialistas ouvidos pelo Portal G1, disseram que embora fenômenos climáticos extremos também possam surgir de ciclos naturais no planeta, não é uma surpresa que esses eventos estejam acontecendo com uma maior intensidade, como resultado das mudanças climáticas induzidas pelo homem.
Europa
A Europa tem sua pior seca em 500 anos. O relatório de agosto do Observatório Europeu da Seca (EDO) indica que 47% da Europa está em condições de alerta, com claro déficit de umidade do solo, e 17% em estado de alerta, em que a vegetação é afetada. Nos últimos dois meses, as excepcionais ondas de calor causaram queimadas em 660 mil hectares — um recorde para o período desde que os dados de satélite começaram a ser registrados, em 2006.
A seca reduz ainda o nível de alguns dos rios mais importantes do continente, como o rio Danúbio, prejudicando a logística de produtos por via fluvial, que torna o transporte mais caro e aumenta os preços em geral, principalmente das commodities.
Além disso, este é o segundo maior rio da Europa e a seca prolongada já provocou o mais baixo nível de água registado nos últimos 100 anos. A Comissão Europeia já alertou que o calor e a falta de chuva vão manter-se no Mediterrâneo durante pelo menos mais três meses.
Já a água do rio Reno, na Alemanha, caiu para níveis “excepcionalmente baixos” em algumas áreas, interrompendo o transporte na hidrovia interior mais importante do país. Segundo economistas, a interrupção pode reduzir em até 0,5 ponto percentual o PIB da Alemanha no ano.
O rio Pó, um dos maiores de Itália e um símbolo da seca que partes do país atravessam, regista o nível mais baixo em mais de 70 anos e partes do seu leito estão completamente expostas. Por causa do baixo nível do rio, a água do salgada do Mar Adriático está adentrando até 30 km antes da foz, salgando seu leito e suas margens.
América do Norte
O oeste dos EUA e o norte do México estão passando pelo período mais seco em 1.200 anos. Um estudo publicado na revista Nature Climate Change mostra que o aquecimento do clima na Terra tornou a seca na região oeste dos EUA cerca de 40% mais severa, fazendo deste o período mais seco na região desde 800 d.C.
A estiagem local deve afetar a agricultura principalmente no estado da Califórnia, elevando ainda mais o preço dos alimentos e causando bilhões em perdas no campo. Isso se contar que o ano passado, segundo estudo da Universidade da Califórnia-Merced, a seca custou à indústria agrícola californiana mais de US$ 1,1 bilhão (cerca de R$ 5 bilhões) e 14 mil empregos.
O lago Mead, maior reservatório de água dos EUA após a construção da barragem de Hoover no rio Colorado, registra apenas um quarto de sua capacidade, o que põe em risco o abastecimento de água para 25 milhões de pessoas.
O Lago Powell, segundo maior reservatório dos EUA, formado após a construção da barragem de Glen Canyon, também está com o nível da água baixo, prejudicando o abastecimento de milhões de pessoas.
Ásia
A China vive a onda de calor mais intensa de sua história recente, segundo o monitoramento do Centro Climático de Pequim. O calorão é inédito não só pela temperatura, mas também pela duração: já são mais de 70 dias de temperaturas altas, o mais longo desde 1961, superando o recorde de 61 dias em 2013.
A incomum onda de calor tem provocado impactos generalizados em grande parte do país com efeitos para a população e a economia. Comércio, agricultura e indústria sofrem com as consequências de um verão extremo no clima chinês. Os baixos níveis de rios e reservatórios forçaram o racionamento de energia para residências, escritórios, shopping centers e o fechamento de fábricas em várias cidades. A Volkswagen interrompeu sua produção, assim como a Foxconn.
Com o peso da China na economia global e a sua superpopulação, as repercussões do calor extremo e da seca severa devem afetar todo o mundo com mais interrupções nas cadeias de suprimentos e piora da crise alimentar global.
Na Índia, a produção de grãos despencou por conta de uma forte onda de calor, que prejudicou a safra de trigo e arroz – encarecendo alimentos básicos da alimentação local. O país responde por 40% do comércio global de arroz, que alimenta metade da humanidade e é vital para a estabilidade política e econômica em toda a Ásia. Interrupções no fornecimento devido a possíveis restrições comerciais da Índia podem criar escassez e aumento de preços em outros lugares.
África
Do sul da Etiópia até o norte do Quênia, passando pela Somália, a região conhecida como Chifre da África sofre com uma enorme seca, algo que não se via há 40 anos, que preocupa as organizações humanitárias e ameaça quase 20 milhões de pessoas.
Um relatório da ONU, entre outubro de 2010 e abril de 2012, cerca de 258 mil pessoas morreram de fome na Somália, metade delas crianças com menos de 5 anos. Agora, uma seca arrasadora atinge o país e deixa, desde o ano passado, 1 milhão de pessoas como deslocadas internas. Só em 2022, mais de 755 mil pessoas foram forçadas a abandonar suas terras e vilas no país em busca das condições mínimas para a sobrevivência.
Mudanças nos padrões climáticos, ligadas diretamente ao aquecimento global, são apontadas como uma das principais responsáveis pela redução dos volumes de chuvas no Leste e no Sul da África. Além de castigar a região do Chifre da África, a seca também está afetando países como Angola, Lesoto, Madagascar, Malauí, Namíbia, Moçambique, Zâmbia, Zimbábue e África do Sul.
Segundo a ONU, desde 2000 o número e a duração das secas aumentaram 29%. Até 2050, as secas podem afetar mais de 75% da população mundial. Um número cada vez maior de pessoas viverá em áreas com escassez extrema de água, incluindo uma em cada quatro crianças até 2040. Entre 1900 e 2019, as secas impactaram 2,7 bilhões de pessoas no mundo e causaram 11,7 milhões de mortes.
por Bárbara Luz | Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado