Um Ministro da Saúde palavroso que ilude os problemas, mas que não resolve nada, um Diretor Executivo do SNS que foi nomeado, mas que não aparece, um orçamento do SNS para 2023 que é enganador e insuficiente, e o SNS continua a degradar-se e os portugueses a sofrerem devido à passividade e incapacidade do Governo para tomar medidas adequadas
Neste estudo analiso o orçamento do SNS para 2023 mostrando que, contrariamente ao propagandeado pelo governo e pela generalidade da comunicação social, o que enganou a opinião pública, não teve um aumento importante, pois a subida verificada no orçamento aprovado pelo governo para 2023, em relação ao efetivamente gasto em 2022 em Despesas correntes, as que garantem o funcionamento normal do SNS, é apenas de 3,8% muito inferior à inflação prevista para 2023 em Portugal pela OCDE (6,6%). E o aumento na Despesa com pessoal em 2023 é ainda menor, pois é somente de 2,9%. O governo empolou o orçamento de 2023 com despesa de investimento (941,1 milhões €) que, depois, a maior parte não é realizada, como tem acontecido todos os anos anteriores.
Estudo
Um Ministro da Saúde palavroso que ilude os problemas, mas que não resolve nada, um Diretor Executivo do SNS que foi nomeado, mas que não aparece, um orçamento do SNS para 2023 que é enganador e insuficiente, e o SNS continua a degradar-se e os portugueses a sofrerem devido à passividade e incapacidade do Governo para tomar medidas adequadas
No momento da nomeação de Manuel Pizarro como ministro da saúde, António Costa caraterizou o novo ministro como um “politico”. Esqueceu-se de dizer que o novo ministro era palavroso, e que iria “resolver” os graves problemas que enfrenta o SNS com palavras e não com medidas adequadas, adiando as soluções, uma caraterística do atual governo (na ADSE está-se à espera há quase 4 meses de um despacho da SEAP/Ministério da Presidência para contratar um médico para a chefia do Departamento Consultoria Médica, cuja falta está a criar graves problemas pois muitas cirurgias que os beneficiários têm de fazer precisam de obter a aprovação deste Departamento), e até era capaz de usar as palavras para iludir a verdade.
UM ORÇAMENTO DO SNS PARA 2023 QUE PRETENDE ILUDIR OS PORTUGUESES E QUE É CLARAMENTE INSUFICIENTE
O governo apresentou na Assembleia da República um orçamento do SNS para 2023 com uma desagregação diferente da utilizada em anos anteriores e com falta de dados essenciais com claro propósito de dificultar e ocultar a verdade para assim poder dizer que o orçamento do SNS para 2023 tinha um enorme reforço . Na pág. 314 do Relatório do OE-2023 refere mesmo um aumento de 1177 milhões € (+10,5%) que depois a maioria dos órgãos de comunicação social propagandearam sem fazerem qualquer trabalho de investigação para saber se era verdade e sem contraditório colaborando, assim, na campanha de engano e manipulação da opinião pública. Por isso com dados dispersos em vários documentos do governo procuramos tornar inteligível o orçamento do SNS para 2023 construindo o quadro 1.
Quadro 1 – Valores do Orçamento do SNS de 2022, estimativa do governo da receita e despesa real do SNS em 2022 (próxima da real), e Orçamento da SNS para 2023
O quadro 1, permite tirar conclusões importantes que têm sido escamoteadas à opinião publica. É preciso esclarecer que os valores do Orçamento do SNS de 2023 não devem ser comparados, como muito vezes faz o governo para enganar, com os valores do orçamento inicial de 2022 (coluna 1), pois este era um orçamento que não tinha qualquer aderência à realidade. A prová-lo está o facto de ele próprio prever um Saldo global negativo de -1121 milhões €.
A comparação que se deve fazer é com a ESTIMATIVA para 2022 (coluna 3) feita pelo governo em outubro de 2022 (coluna 3) que está muito mais próxima da realidade. Fazendo tal comparação conclui-se que, a nível de RECEITA o valor do orçamento do SNS de 2023 é apenas superior ao valor do de 2022 em 573 milhões € (mais 4% e não os 10,5% divulgados pelos media), portanto muito longe dos 1.177 milhões € do Relatório do OE-2023 (pág. 314) propagandeados pela generalidade da comunicação social sem se dar ao trabalho de investigar para confirmar se era verdadeiro e sem contraditório. Desta forma colaborou, objetivamente, com o governo no engano e manipulação da opinião pública. Se retirarmos os “fundos comunitários” (751,8 milhões € em 2023), o aumento de receita disponibilizado pelo governo ao SNS até diminui, entre 2022 e 2023, em -178,8 milhões €.
A nível de DESPESA, interessa separar a DESPESA CORRENTE (aquela que é necessária para garantir o funcionamento do SNS) da DESPESA DE CAPITAL (investimento). E isto porque o governo empola o orçamento do SNS todos os anos com despesa com investimento que depois a maioria não é realizada. Como consta do quadro 1 (colunas 1, 2 e 3), no orçamento inicial do SNS de 2022, estavam previstos investimentos no montante de 589,3 milhões €, mas até outubro só tinham disso realizados 140,4 milhões € (23,8% do previsto), embora o governo estime que até ao fim de 2022 realizará 382 milhões €, o que é duvidoso que o consiga pois é mais do dobro do que conseguiu realizar nos primeiros 10 meses de 2022. Se se comparar a DESPESA CORRENTE estimada pelo governo para 2022 (13322,8 milhões €) com a prevista no orçamento para 2023 (13822,7 milhões €) o aumento é apenas 3,8% (+499,9 milhões €), ou seja, pouco mais de metade da inflação prevista pela OCDE para Portugal em 2023 (6,6%). E o aumento da DESPESA COM PESSOAL é ainda inferior: apenas +2,9%. A pergunta que se coloca é esta: Como é possível com um aumento de 2,9% na Despesa com Pessoal proceder a uma justa valorização das remunerações dos profissionais de saúde que continuam a perder poder de compra como prova o quadro 2 que está a seguir, e assegurar carreiras dignas, fundamental para impedir a continuação da degradação grave do SNS que está a causar enormes prejuízos em termos de saúde à população e a agravar ainda mais as desigualdades? O investimento de 941,1 milhões € previsto no orçamento do SNS para 2023, grande parte é para “inglês ver”, pois não se realizará como aconteceu em anos anteriores.
Quadro 2 – A PERDA DE PODER DE COMPRA DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM 2021/2022 – A variação da remuneração base média mensal dos profissionais de saúde e do seu poder de compra de jul.2021 a jul.2022
O DISPARAR DA DIVIDA DO SNS A FORNECEDORES PRIVADOS MUITO ACIMA DA QUE CONSTA DO RELATÓRIO DO OE-2023 E A TENTATIVA DO GOVERNO DE OCULTAR MESMO À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Como revela o gráfico 1 (dados do próprio SNS), a divida total a fornecedores disparou entre dez.2021 a out.2022.
Entre dez.2021 e out. 2022, a divida total do SNS a fornecedores aumentou de 1548 milhões € para 2350 milhões €, ou seja, em 800,7 milhões € (+51,7%) : Para ocultar este enorme aumento da divida total do SNS nos primeiros 10 meses de 2022, o governo, no documento que distribuiu aos deputados no debate do OE-2023, só referiu uma parte desta divida – a divida vencida – que era 1292 milhões € em agosto de 2022 ( a total era 2194 milhões €), ocultando 45% da divida total à própria Assembleia da República. Este enorme aumento da divida deve-se ao subfinanciamento cronico do SNS, que tem de se endividar para poder funcionar. E o orçamento do SNS para 2023 não contém verbas para resolver este enorme endividamento. Os problemas que enfrenta o SNS não se reduzem nem se resolvem apenas com dinheiro. As enormes deficiências a nível de organização, de gestão, de responsabilização, de falta meios humanos e materiais, causados por uma tutela incapaz e por um diretor executivo que, apesar de nomeado, está ausente, e por leis anacrónicas, asfixiantes, burocráticas (a ADSE enfrenta as mesmas dificuldades de que tenho experiência vivida) também determinam a grave situação do SNS. Mas a falta de financiamento adequado é também um problema grave que o orçamento de 2023 não resolve; pelo contrário, vai agravar ainda mais como provamos.