Afinal, quem é grande demais para falir e para ser salvo? Os bancos ou o próprio capitalismo?
Se faltavam sinais para demonstrar que o capitalismo está perto de uma nova crise global, este mês de março tratou de entregar dois de uma vez só. Primeiro, a falência do Silicon Valley Bank (SVB), que já foi o suficiente para levar órgãos reguladores dos Estados Unidos a alertar para a possibilidade de um “risco sistêmico”. Agora, as turbulências do Credit Suisse Group AG, que já provocaram uma montanha-russa nas bolsas de valores mundo afora.
O SVB foi vítima da alta da taxa de juros nos EUA, que derrubou o preço da maioria de seus ativos. Ao elevar os juros, o Fed (Federal Reserve, o banco central norte-americano) tentava controlar a inflação, mas indiretamente deixou sequelas por toda a economia do país.
Desta vez, porém, a debacle não teve um efeito tão devastador quanto a quebra do Lehman Brothers, um dos estopins da última grande crise capitalista, iniciada em 2007/2009. Quarto maior banco de investimento do mundo, com 159 anos de história, o Lehman Brothers tinha um prejuízo de nada menos US$ 3,9 bilhões quando pediu concordata, em setembro de 2008. O sistema financeiro veio abaixo.
Paul Krugman foi um dos primeiros economistas de prestígio internacional a dissociar os dois momentos. “Naquela época (2008), estávamos lidando com bancos em colapso e demanda em queda”, escreveu ele em sua coluna no New York Times. “Hoje, o setor bancário tem sido uma questão secundária e o grande problema parece ser a inflação, impulsionada por uma demanda excessiva em relação à oferta disponível.”
Embora a Casa Branca tenha acelerado o aporte de recursos para evitar desdobramentos catastróficos, Krugman concluía seu texto com otimismo: “Provavelmente não estamos diante de uma crise financeira sistêmica”.
Mas sobreveio, inesperadamente, o caso do Credit Suisse, um dos maiores bancos internacionais da Suíça. Nesta quarta-feira (15), logo após o Saudi National Bank, seu maior acionista, declarar que não lhe garantiria mais liquidez, as ações do Credit Suisse despencaram 24,24%. Houve uma recuperação parcial nesta quinta (16) com o anúncio de que a instituição poderia ser socorrida pelo Banco Central Suíço com um empréstimo de 50 bilhões de francos suíços (US$ 53,7 bilhões).
A credibilidade do Credit Suisse já estava manchada por inúmeros escândalos que já lhe custaram bilhões. Denúncias de lavagem de dinheiro, fraude fiscal e outros crimes financeiros obrigaram o banco a fechar acordos milionários nos Estados Unidos e na Europa. Prejuízos operacionais também puseram em xeque a imagem do Credit Suisse, que perdeu um terço de seu valor desde outubro.
“O problema é que o Credit Suisse, por alguns padrões, pode ser grande demais para falir, mas também grande demais para ser salvo. Não está claro se os reguladores têm recursos para engendrar um resgate”, resumiu o economista Nouriel Roubini, o “Doutor Catástrofe”, que previu a crise de 2007/2008.
O fato é que os casos do Silicon Valley Bank e do Credit Suisse testam a saúde do capitalismo em geral – e, claro, do sistema bancário internacional em particular. Ao que tudo indica, os bancos europeus podem desencadear os próximos capítulos da crise. Não à toa, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, convocou uma coletiva para reafirmar que não há problemas de liquidez nos mercados da zona do euro.
Até aqui, evitou-se o que Roubini chamou de um possível “momento Lehman Brothers”. Mas a onda de desconfiança não para de crescer e afasta investimentos. A crise não tem tamanho e duração estimáveis, porque não se limita a uma outra instituição. Afinal, quem é grande demais para falir e para ser salvo? Os bancos ou o próprio capitalismo?
por André Cintra, Jornalista | Texto em português do Brasil
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