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Quinta-feira, Julho 18, 2024

O desemprego é a principal causa de pobreza em Portugal

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Apenas 42 em cada 100 desempregados recebem subsidio de desemprego (se excluir os com subsídio social ficam apenas 33 em cada 100), o subsidio médio de desemprego varia entre 428€ (o social) e 649€ (o inicial), o desemprego é a principal causa de pobreza em Portugal (46,7% dos desempregados estão abaixo do limiar da pobreza – INE) e o Governo, cedendo aos patrões, tenciona restringir ainda mais

Neste estudo analisa-se a evolução do desemprego real (total) em Portugal de 2011 a 2024, assim como também o numero desempregados a receber o subsidio de desemprego concluindo que, em maio de 2024, apenas 42 em cada 100 desempregados recebiam subsidio de desemprego. E se retiramos os que recebem subsidio social de desemprego, apenas 33 em cada 100 é que ficam com o direito a receber subsidio. E a ministra do Trabalho e Montenegro já anunciaram que tencionam “mexer no subsidio de desemprego” para reduzir mais, quando já 46,7% dos desempregados estão abaixo do limiar da pobreza. O necessário era alargar para reduzir a pobreza no país.

Estudo

Apenas 42 em cada 100 desempregados recebem subsidio de desemprego (se excluir os com subsídio social ficam apenas 33 em cada 100), o subsidio médio de desemprego varia entre 428€ (o social) e 649€ (o inicial), o desemprego é a principal causa de pobreza em Portugal (46,7% dos desempregados estão abaixo do limiar da pobreza – INE) e o Governo, cedendo aos patrões, tenciona restringir ainda mais

Com a justificação habitual dos patrões de que os desempregados que recebem subsídio de desemprego não querem trabalhar, porque para quem quer trabalhar há emprego, a ministra do Trabalho anunciou mexidas no subsídio de desemprego. O objetivo, segundo declarações da ministra, ”é tentar evitar que seja mais atrativo para pessoas que beneficiam de prestações sociais, nomeadamente do regime não contributivo, ficar em casa em vez de trabalhar” (SIC Noticias, 10 de julho de 2024), ou seja, a justificações dos patrões. Analisemos então, utilizando a linguagem fria, mas objetiva dos próprios dados oficiais, a situação dos desempregados no nosso país.

 

APENAS 42 EM CADA 100 DESEMPREGADOS ESTÃO A RECEBER SUBSÍDIO DE DESEMPREGO

O quadro 1 (dados oficiais do INE e da Segurança Social, entidade que paga o subsídio de desemprego), mostra a variação do desemprego real e do número de desempregados que receberam subsídio de desemprego de 2011/2024

Quadro 1 – O desemprego real em Portugal e o nº de desempregados que receberam subsídio de desemprego 2011/24

Para se se poder ter uma informação correta da dimensão do desemprego no nosso país, é necessário somar ao desemprego oficial, que é divulgado mensalmente pelos media e utilizados por comentadores pouco atentos e informados, “os inativos disponíveis que não procuraram emprego”. E isto porque estes últimos, segundo o próprio INE, são desempregados excluídos do número oficial de desempregados apenas pelo facto de não terem procurado emprego no período em que foi feito o inquérito pelo INE. Mas não é pelo facto de um desempregado não ter procurado emprego que deixa de ser desempregado. A razão de não procurar pode ser por se sentir desencorajado por ter procurado durante muito tempo e não ter conseguido encontrar emprego, ou de se ter inscrito no Centro de Emprego e este não tenha conseguido arranjar trabalho. Em maio de 2024, o desemprego real total era, segundo o INE, 432500 e não apenas 338000, como o INE divulgou e também órgãos de informação e comentadores pouco atentos também o fizeram, enganando a opinião publica. Destes 432500 desempregados apenas 183500 recebiam subsídio de desemprego, ou seja 42 em cada 100 desempregados. 248563, 57,5% não tinham direito a qualquer subsídio de desemprego. Para além disso, ainda existiam, segundo o INE, 33700 que procuravam emprego, mas que na altura não estavam disponíveis, e 125200 trabalhadores na situação de subemprego a tempo parcial, e, portanto, com salário parcial, por não conseguirem encontrar emprego a tempo completo. O quadro real e verdadeiro é este.

 

DESEMPREGADOS POR SUBSÍDIOS, VALOR MÉDIO, E A REDUÇÃO PARA 33 POR CADA 100 DESEMPREGADOS

Observem-se os dados do quadro 2, já que a ministra do Trabalho anunciou que ia “mexer no subsídio desemprego”.

Quadro 2 – Variação do número de desempregados e subsídio médio pago – dez.2015 a maio de2024


Analisemos o caso do subsídio social de emprego pois Montenegro afirmou na Assembleia da República que podia ser objeto de alterações por parte do governo (jornal Negócios, 26/6/2024). Como mostra o quadro 2, se se acabasse com o subsídio social de desemprego, ficariam a receber subsídio de desemprego apenas 145650 desempregados, ou seja 33 por cada 100 desempregados. Se é já muito reduzido o número daqueles que o recebem subsídio atualmente, o que determina que 47% dos desempregados já estejam abaixo do limiar, é evidente que a eliminação ou redução do número de desempregados a receber o subsidio social de desemprego causaria um aumento significativa da pobreza no país.

Para se ter uma perceção mais clara de quem tem direito ao subsídio de desemprego e de quem tem direito ao subsídio social de desemprego (inicial e subsequente) interessa analisar esta questão com pormenor.

Para um desempregado ter direito ao subsídio de desemprego tem de ter cumprido o prazo de garantia, ou seja, tem de ter descontado para a Segurança Social pelo menos 360 dias nos últimos 24 meses anteriores à data em que foi despedido. Portanto, quem não cumpra esta condição não têm direito ao subsídio de desemprego. Com o aumento do trabalho precário no país (no 1º Trim.2024, tinham contratos a prazo 582200 trabalhadores), muitos trabalhadores despedidos não conseguiam cumprir aquela condição e ficavam sem qualquer apoio social caindo na pobreza. Para colmatar este vazio, foi criado o subsídio social de desemprego (inicial e subsequente), sendo necessário, para ter direito a ele, que o desempregado tenha descontado para a Segurança Social (prazo de garantia) 180 dias nos 12 meses imediatamente anteriores à data de despedimento, ou 120 dias no caso de caducidade do contrato a prazo. O valor do subsídio num caso e no outro também são muito diferentes. No caso de subsídio de desemprego o montante diário é calculado com base na remuneração de referência dividida por 30 dias e é igual a 65% do valor diário (a remuneração de referência é a média dos primeiros 12 meses dos 14 anteriores ao despedimento). O valor do subsídio não pode ser inferior a 1,5 IAS (1 IAS=509,26€ => 1,5 IAS= 763,89€) nem superior a 2,5 IAS (1273,15€), enquanto o subsídio social de desemprego não pode ser superior a 80% do IAS (407€, se viver sozinho) e 100% do IAS(509€ com família) e o acesso depende do rendimento per capita. Num e no outro caso, a duração do subsídio depende do número de anos de descontos para a Segurança Social. E é este, com este valor máximo, que Montenegro quer alterar. Compare-se esta posição do governo AD com a diminuição de centenas de milhões€ que pretende reduzir no IRC, e as mais beneficiadas são as grandes empresas (banca, EDP, Jerónimo Martins, Sonae, etc.). E em 2023, segundo o INE, estavam no limiar da pobreza 10% dos empregados, 46,7% dos desempregados, 15,4% dos reformados e 31,2% de “Outros Inativos”(Inquérito às Condições de vida e rendimento, INE)

 

ALTERAÇÃO DA DEFINIÇÃO DE “EMPREGO CONVENIENTE” E AUMENTO DA “FISCALIZAÇÃOSO”, E SE O TRABALHADOR NÃO O ACEITAR O EMPREGO CONVENIENTE PERDE SUBSÍDIO, FINANCIAMENTO PELA SEGURANÇA SOCIAL DO SALÁRIO

Segundo declarações de Montenegro “nós não queremos que quem trabalha tenha um rendimento inferior a quem não trabalha”. E segundo também Montenegro isso consegue-se “por duas vias: por fiscalizar as situações de abuso e ao mesmo tempo garantindo que quem ingressa no mercado de trabalho não tem um rendimento inferior ao que já tinha quando estava a trabalhar”. E como pretende conseguir isso? Ou alterando a definição de “emprego conveniente” como exigem os patrões da Confederação do Comércio e Serviços, que pode passar pela alteração da definição constante do art.º 13º do Decreto-Lei 220/2006, deixando as 9 condições que o definem de ser cumulativas, sendo apenas algumas, e se o trabalhador não aceitar o emprego ”oferecido”, mesmo pior (por ex., num distrito do país diferente daquele em que vive e tem a família) ” perde o direito ao subsídio de emprego, e também aumentando aquilo que designa por “fiscalização” ou seja, a pressão sobre os desempregados; ou então ”a criação de um Suplemento Remunerativo Solidário que garanta que o aumento do rendimento do trabalho não conduz a uma perda de rendimento disponível”(jornal Negócios 26/6/2024) financiado pela Segurança Social. Assim, as empresas podem continuar a pagar baixos salários pois uma parcela do recebido pelo trabalhador é paga pela Segurança Social.

Do site do IEFP, Ministério do Trabalho – retiramos 9 exemplos das 3625 “ofertas de emprego” e remunerações “oferecidas” pelos patrões que lá estão para os leitores avaliarem. Os patrões queixam-se que os trabalhadores não as aceitam e querem ajuda do governo para os obrigar a aceitar. E parece que Montenegro e a ministra manifestaram abertura para fazer isso.

OFERTAS DE EMPREGO DIVULGADAS PELO INSTITUTO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL – Ministério do Trabalho (há muitas mais com estes salários)


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