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Sexta-feira, Novembro 22, 2024

Montenegro diz que a redução do IRC vai levar as empresas e investir mais

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Preços dos combustíveis sem impostos em Portugal (os que ficam para as empresas), são superiores aos da Alemanha apesar das remunerações no nosso país serem menos de metade das alemãs (41%), dando enormes lucros à Galp. Montenegro diz que a redução do IRC vai levar as empresas e investir mais e a criar mais emprego pois ficam com mais dinheiro quando o que fazem os grandes acionistas é transferir os lucros para o estrangeiro para não pagar impostos em Portugal

Neste estudo analiso os enormes lucros obtidos pela GALP no 1º sem.2024. Em apenas 3 semestres (2022, 2023 e 2024)após o inicio da guerra na Ucrânia e da aplicação de sanções a GALP obteve 1552 milhões€ (RCA) ou 2053 milhões € (IFRS) de lucros. Se fossem anos completos, os lucros devem aproximar-se do dobro. Tudo isto à custa dos consumidores. Também mostro, com dados da DGEG do Ministério da Economia, que, embora as remunerações em Portugal sejam menos de metade das alemães, o preço da gasolina e do gasóleo sem impostos na Alemanha é inferior ao de Portugal. E termino provando que a redução do IRC só vai levar os grandes acionistas a transferirem mais lucros para o estrangeiro para não pagarem o imposto sobre os dividendos em Portugal.

Estudo

Preços dos combustíveis sem impostos em Portugal (os que ficam para as empresas), são superiores aos da Alemanha apesar das remunerações no nosso país serem menos de metade das alemãs (41%), dando enormes lucros à Galp. Montenegro diz que a redução do IRC vai levar as empresas e investir mais e a criar mais emprego pois ficam com mais dinheiro quando o que fazem os grandes acionistas é transferir os lucros para o estrangeiro para não pagar impostos em Portugal

A guerra na Ucrânia, causada pela invasão da Rússia, e as sanções aplicadas pela U.E., EUA e mais alguns países do “ocidente alargado” tem sido uma fonte de enormes lucros para as empresas de combustíveis dos países ocidentais que vendem aos consumidores a preços exorbitantes sem qualquer controlo. E países como a China, a India, a Turquia, o Brasil, a Africa do Sul, obtêm gás e petróleo à Rússia a preços mais baixos, o que contribui para o aumento da sua competitividade desses países e a perda dos ocidentais e, em muitos casos, osrevendem a países ocidentais obtendo margens de lucro elevadas. Segundo o FMI – World Economic The Global Economy in a Sticky Spot de jul.2024 – , o crescimento económico (PIB) previsto para 2024 é de +2,6% nos EUA, de 0,9% na Zona Euro, de 0,7% na Alemanha (a locomotiva da U.E.). Na Rússia de +3,2%; China: +5%; India: +7%., etc.

Os efeitos de boomerang (ricochete) da guerra e das sanções estão a ser dramáticos para as economias europeias e para os europeus. Mas Bruxelas e os governos estão cegos e surdos à realidade das pessoas, e depois queixam-se da economia que cresce pouco, da situação do SNS, da Educação, da inflação, dos impostos, do desemprego, etc., pois não compreendem que tudo está ligado. E a situação vai-se continuar a agravar se a guerra e as sanções se mantiverem e a corrida armamentista disparar. Não há milagres na economia

 

A CONTINUAÇÃO DO AUMENTO ENORME DOS LUCROS DA GALP À CUSTA DOS CONSUMIDORES NO 1º SEM.2024

O gráfico 1 foi construído com dados divulgados pela própria GALP nos seus relatórios de contas semestrais referentes ao período 2021/2024 para assim poder avaliar os efeitos da guerra e das sanções para a empresa.

Para que as diferenças de lucros RCA e IRFS sejam compreensíveis pelos leitores, interessa referir que o lucro RCA é aquele que é obtido considerando, por ex., o valor do petróleo que a GALP tem em stock ao preço de aquisição (histórico), enquanto o lucro IFRS já inclui o valor do stock ao preço valorizado pelo mercado (se o preço do barril de petróleo aumenta, a GALP tem um lucro extra, se diminuiu verifica-se o contrario) que é aquele que depois de refinado será o pago pelos clientes com sobre lucro. No 1º sem2021 o seu valor era de 169 milhões €, mas no 1º sem.2022, por efeito da guerra e sanções, já era 344 milhões €. Para além do chamado “efeito stock” há ainda os chamados ”Special items” que não está incluído no lucro RCA, mas está no IFRS. A contabilidade com base nas normas do IFRS é a mais utilizada internacionalmente porque dá uma informação mais verdadeira da situação da empresa. E o que mostra o gráfico 1? Que os lucros da GALP “explodiram” com a guerra e as sanções. Entre o 1ºsem.2021 e 1º sem2024 aumentaram entre 3,1 vezes mais (os IFRS, de 232M€ para 737M€) e 3,7 vezes mais (os RCA, de 232M€ para 737M€). Em apenas 3 semestres após o início da guerra (2022, 2023 e 2024) a GALP obteve 1552 milhões€ de lucros (RCA) ou 2053 milhões € (IFRS). Utilizamos os lucros semestrais, porque o anual de 2024 ainda não existe (“mutatis mutandis” o mesmo se verifica para os valores anuais, por ex., em 2023, foram “só” 1243 milhões €). Tudo isto à custa dos consumidores e perante a passividade, para não dizer conivência, da ERSE e dos sucessivos governos.

 

APESAR DAS REMUNERAÇÕES EM PORTUGAL SEREM CERCA DE METADE DA U.E. OS PREÇOS DOS COMBUSTIVEIS,SEM IMPOSTOS EM PORTUGAL, SÃO EM MUITOS CASOS SUPERIORES E NADA É FEITO PARA ACABAR COM ESTE ESCANDÂLO

No quadro 1 estão os preços dos combustíveis que revertem para as empresas, pois não incluem impostos, do mês de maio de 2024, que são os últimos publicados pela Direção Geral de Energia do Ministério da Economia.

Quadro 1 – Os preços dos combustíveis em Portugal sem impostos (aqueles que revertem na totalidade para as empresas)


Como a APETRO, a associação patronal do setor, e as empresas petrolíferas afirmam continuamente, para enganar os portugueses, que os preços elevados dos combustíveis em Portugal deve-se apenas aos impostos (é verdade que estes são elevados) , e elas não têm culpa nenhuma disso, decidimos divulgar o quadro anterior com os preços sem impostos, ou seja, os preços que ficam para as empresas comparando o que se verifica em Portugal com o em outros países da U.E. Os países que estão sublinhados a amarelo e laranja são aqueles cujos preços da gasolina e do gasóleo são inferiores aos preços cobrados pelas empresas em Portugal. A nível de gasolina 95, 19 países de 27, as empresas cobram menos por litro da gasolina 95 do que as empresas em Portugal: Em relação ao gasóleo, de 27 países, em 6 países os preços são inferiores aos das empresas em Portugal. O caso exemplar é o da Alemanha, cuja população tem em um rendimento que, em média, é mais do dobro da portuguesa, mas cujos preços da gasolina e do gasóleo, sem impostos, são inferiores ao de Portugal.

Segundo o Eurostat, em 2023, a remuneração media em Portugal era apenas 41,2% da alemã e a 53,2% da média da U.E. Os lucros faraónicos da GALP e de outras petrolíferas confirmam também este escândalo.

 

A IGNORÂNCIA DE MONTENEGRO OU SERÁ A TENTATIVA DE ENGANAR A OPINIÃO PÚBLICA?

Nas intervenções que Montenegro e seus ministros têm feito para defender a redução das taxas do IRC muito superior à descida que defende para as do IRS (no IRC ele quer reduzir a taxa geral 21% para 15% e, ainda, para as grandes empresas ele quer eliminar, pois só estas é que pagam, a taxa estadual entre 3% e 9% e a taxa municipal de 1,5%). A parte de leão desta redução iria para os grandes grupos económicos e a banca. A justificação que Montenegro dá é que assim as empresas ficariam com mais dinheiro e investiriam mais em Portugal, criando mais emprego e mais riqueza. Isto não corresponde à verdade. As empresas desde que tenham lucros pagam IRC em Portugal, mas já isso não acontece com os lucros distribuídos aos acionistas das grandes empresas.

Estes, para não pagarem imposto sobre os dividendos que recebem em Portugal, têm criado empresas no estrangeiro (ex. Holanda), para as quais transferem os lucros que lhe são distribuídos não pagando qualquer imposto sobre dividendos em Portugal. Um pequeno acionista residente em Portugal paga uma taxa ade 28% sobre o dividendo das ações que possui, se for um grande acionista, com 10% durante um ano, não paga nada (art.º 51 do Código do IRC, a chamada Participation Exemption). São exs., comprovativos a “Amorim Energia BV”, criada na Holanda, para onde os lucros distribuídos pela GALP são transferidos; na EDP a China Three Gorges (China) e a Capital Group Companies, Inc. (EUA) fazem o mesmo; no Pingo Doce os donos criaram na Holanda a sociedade “Sociedade Francisco Manuel dos Santos, B.V.” para onde vão os lucros. E há muitos outros casos. É um forte incentivo para transferir os lucros para o exterior e não investir no país. Será que Montenegro e o seu governo ignoram isto ou querem enganar os portugueses?


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