Clinton assegura número de delegados para ser a candidata democrata “de facto” à Casa Branca. Barack Obama anuncia apoio público à ex-primeira-dama. Trump reage mal e volta a insultar a adversária. Apesar de dizer que não vai desistir da corrida, Bernie Sanders dá sinais de maior entendimento com Hillary Clinton. Outras senhoras, no séc. XIX, poderão ter aberto o caminho para a agora aspirante à Sala Oval em Washington. Entrevista de Mitt Romney desvenda divisão interna dos republicanos devido a Trump. A semana poderia ser resumida assim; mas vamos detalhar um pouco.
Outro candidato “de facto”
Hillary Clinton, antiga senadora do estado de Nova York e ex-primeira-dama dos EUA, assegurou o número necessário de delegados para conquistar a nomeação, pelo Partido Democrata, para concorrer às eleições presidenciais no país.
De acordo com dados da Associated Press, citada pelo jornal Washington Post, Clinton declarou ter conquistado esse número de delegados na passada segunda-feira, nas vésperas das eleições primárias em vários estados, como a Califórnia e Nova Jérsia. Também vários “super-delegados” terão declarado apoio público à ex-senadora, o que contribuiu para essa “previsão”.
Hillary Clinton torna-se assim, em dois séculos, a primeira mulher do Partido Democrata a alcançar o número de delegados necessários para ser nomeada candidata à Casa Branca; torna-se também a primeira esposa de um antigo presidente a candidatar-se ao cargo.
A ex-primeira dama falou num comício na Califórnia e atribuiu este facto aos seus apoiantes, “que são comprometidos e apaixonados, que votaram em mim em larga escala por muitas razões”. Clinton prepara-se agora para enfrentar o rival republicano, o polémico empresário Donald Trump, que tem sido o alvo preferencial das suas críticas nos eventos públicos.
Estes dados surgem depois das primárias nas Virgin Islands, em que Clinton ganhou por uma margem confortável a Bernie Sanders, seu directo adversário democrata e senador do Vermont. Enquanto a imprensa e os responsáveis de campanha de Clinton afirmam que ela elegeu os sete delegados correspondentes ao território, a equipa que coordena a campanha do senador contestou tais afirmações. Noutro aspecto, Sanders afirma que os votos ou escolhas dos “super-delegados” não deveriam ser contabilizados até às votações na convenção do partido, em Julho.
Sanders tem repetido que não vai desistir da corrida, apesar do anúncio da ex-primeira-dama: numa declaração divulgada na passada segunda-feira, o senador do Vermont disse: “é triste que os media, numa corrida para julgarem, ignorem as claras determinações do Comité Nacional Democrata, segundo as quais está errado contar os votos dos super-delegados antes de votarem na convenção deste Verão”.
… e o presidente dos EUA pronunciou-se
“Eu sei como este trabalho pode ser duro, por isso é que tenho a certeza que Hillary será boa a desempenhá-lo. Na verdade, não me parece que exista alguém tão qualificado para exercer o cargo”. Com estas palavras, Barack Obama declarou formalmente o seu apoio à candidata do seu partido.
Hillary Clinton, em entrevista à Bloomberg News, reagiu a este apoio oficial: “Significa tanto ter um apoio forte do presidente. Obviamente, valorizo muito a opinião dele”, sublinhou a ex-senadora de Nova York, que lembrou o facto de terem evoluído, nos últimos anos, “de competidores ferozes para amigos verdadeiros”.
Donald Trump, o empresário republicano candidato ao cargo, reagiu na sua conta de Twitter ao apoio oficial de Obama a Hillary Clinton: “Obama acabou de anunciar o apoio à Hillary Trapaceira . Ele quer mais quatro anos de Obama, mas mais ninguém quer!”, insistiu, no seu habitual estilo.
Este apoio público surgiu após um encontro com o senador do Vermont na Casa Branca, revelou o Washington Post. Bernie Sanders tem sido pressionado para desistir da corrida e ajudar a unificar o partido, agora que Clinton é a candidata democrata “de facto” ao cargo. Sem falar de forma directa sobre o assunto, o veterano político disse aos jornalistas, após esse encontro, que “farei tudo ao meu alcance, e vou trabalhar o mais que possa, para assegurar-me que Donald Trump não se torne presidente dos EUA”, frisou.
Recorde-se que, na passada quarta-feira, Sanders tinha mantido o seu discurso de ir até ao fim. “A luta continua”, tinha assegurado. O anúncio de que a sua adversária Hillary Clinton se tornara a candidata democrata “de facto” à Casa Branca não afectou as suas intenções: “deixem-me agradecer-vos por serem parte de uma revolução política”, disse num comício no estado da Califórnia. “Sabemos que a nossa missão vai para além de derrotar Donald Trump, consiste também em transformar o país”, citado pela CNN.
Os apoiantes do senador do Vermont criticaram as palavras de Hillary Clinton, que declarou ter “partido o mais rígido telhado de vidro” (numa alusão à tese que diz que existe um “telhado de vidro” que impede as mulheres de acederem a cargos de topo na sociedade, qualquer que seja a área profissional que escolheram).”Não acho que ela tenha partido nada”, ironizou Jennifer Hernandez, apoiante de Sanders. “Ela roubou e comprou o seu caminho para o topo e tem estado ao lado do establishment há muito tempo. Foi a nomeada desde o começo, o que foi muito injusto para Bernie”, frisou a apoiante.
Resultados das primárias de 7 de Junho
Do lado democrata, Clinton venceu Sanders na Califórnia (55,8% contra 43,2%), Nova Jérsia (63,3% contra 36,7%), Novo México (51,5% contra 48,5%) e Dakota do Sul (51% contra 49%). O senador do Vermont saiu vencedor nos estados de Montana (51,1% contra 44,6% de Clinton) e Dakota do Sul (64,2% contra 25,6% de Clinton), de acordo com o jornal The Guardian.
Do lado republicano, Donald Trump continua a somar resultados elevados: 75,3% no estado da Califórnia, 73,7% no estado de Montana, 80,5% na Nova Jérsia, 70,7% no Novo México e 67,1% no Dakota do Sul. O estado do Dakota do Norte não levou a cabo primárias republicanas.
Clinton é mesmo a primeira mulher a candidatar-se à presidência dos EUA?
Sem contar com os principais partidos políticos do país (Partido Democrata e Partido Republicano), outras mulheres tentaram, antes de Hillary Clinton, alcançar a Sala Oval da Casa Branca em Washington.
Victoria Woodhull, sufragista e anarquista norte-americana, figura destacada da luta pelos direitos civis e laborais das mulheres nos séculos XIX e XX, tentou candidatar-se ao cargo em 1872 pelo Equal Rights Party. Porém, foi detida dias antes das eleições sob a acusação de publicar um jornal “obsceno”, diz a edição desta quinta-feira do jornal Público. Foi impedida de votar e não recebeu votos do Colégio Eleitoral. Outra questão legal que a impediu de se candidatar foi a idade: Woodhull teria 34 anos, quando a idade mínima exigida aos candidatos é de 35 anos.
Os historiadores apontam ainda outra hipótese: a primeira norte-americana a candidatar-se à Casa Branca terá sido Belva Ann Lockwood, advogada, escritora e activista dos direitos das mulheres. Esta norte-americana, uma das primeiras mulheres advogadas no país, concorreu à Casa Branca em 1884 e 1888 também pelo National Equal Rights Party. Várias cidades nos EUA homenagearam-na adoptando o seu nome: Belva e Lockwood na Virgínia Ocidental, bem como Lockwood na Califórnia. Poucos anos antes da sua morte, a advogada e activista recebeu um doutoramento honorário em Direito pela Syracuse University.
Sondagem indica que Clinton vai à frente de Trump
Uma sondagem da Reuters e Ipsos revelou esta sexta-feira que Hillary Clinton, candidata “de facto” pelo Partido Democrata, lidera as intenções de voto com 11 pontos de vantagem em relação ao rival republicano, Donald Trump: 46% dos inquiridos votariam na antiga senadora de Nova York contra 34,8% dos apoiantes do polémico milionário. Por sua vez, 19,2% dos eleitores disseram não apoiar qualquer um dos candidatos.
Ao mesmo tempo que esta semana Clinton juntava ao apoio do presidente Barack Obama o apoio de Joe Biden, vice-presidente dos EUA, e o de Elizabeth Warren, senadora do estado do Massachusetts, Trump enfrentou uma investigação judicial visando a universidade que leva o seu nome, e o desagrado dos líderes do Partido Republicano, quando questionou a imparcialidade do magistrado que ordenou as investigações. O juiz em causa, Gonzalo Curiel, tem ascendência mexicana e foi acusado pelo empresário de ser “parcial” devido às intenções do candidato em construir um muro para impedir a entrada de imigrantes mexicanos nos EUA.
Planeamento familiar: Hillary ataca o rival
“Quando Donald Trump diz “Vamos fazer a América grande de novo”, ele quer dizer ‘Vamos fazer a América retroceder’”, acusou Hillary Clinton, perante os seus apoiantes num evento da Planned Parenthood Action Fund em Washington, esta sexta-feira.
Clinton dedicou o seu discurso no evento a atacar o polémico aspirante republicano ao cargo de presidente dos EUA: “alguém que é capaz de concordar com a ideia de castigar a mulher como se não fosse nada com ele, a mais óbvia conclusão do mundo é que se trata de alguém que não tem as mulheres em grande consideração”, insistiu, perante um forte aplauso. Este discurso marca uma clara viragem: Clinton quer ser a candidata na qual as mulheres podem confiar, em oposição ao milionário conservador, que tem coleccionado polémicas visando a condição feminina.
A antiga primeira-dama declarou ser uma prioridade a protecção do financiamento a esta organização, perante as intenções republicanas de acabar com esta estrutura governamental. Apelou ainda à rejeição do Hyde Amendment, que quer banir o uso de fundos públicos para a interrupção da gravidez. A campanha de Clinton, para conquistar os votos das mulheres jovens, vai focar-se nos ataques a Trump, denunciando os seus comentários machistas, como referir-se a certas mulheres nos termos de “porcas gordas” e “cadelas”.
Trump volta a ser atacado dentro do Partido Republicano
Em entrevista à CNN, Mitt Romney, figura destacada do Partido Republicano e nomeado para as eleições de 2012 (que perdeu para Barack Obama), repetiu as críticas visando o polémico empresário. “Não quero ver racismo a conta-gotas”, frisou. “Os presidentes têm um impacto na natureza do nosso país, e racismo a conta-gotas, intolerância doseada e misoginia por fases são extraordinariamente perigosos para o coração e carácter da América”, insistiu Romney.
Romney admitiu ainda que um outro candidato republicano mais credível não vai surgir a tempo da convenção do partido. Apesar disso, mostrou-se aberto a apoiar Gary Johnson, um independente ligado aos republicanos. “Quero conhecê-lo melhor e ver se ele é alguém em quem eu votaria”. Excluiu ainda a hipótese de apresentar a sua própria candidatura.
Do lado do empresário, as reacções não tardaram. A sua representante, Katrina Pierson, disse que tais declarações “eram só dor de cotovelo do establishment que tiveram o poder retirado das suas mãos por um candidato que não aprovam porque ele conseguiu fazer algo que eles não foram capazes de fazer em décadas”.
O próprio Trump reagiu, através da sua conta de Twitter, no seu estilo peculiar: “Mitt Romney teve a sua oportunidade de derrotar um presidente falhado, mas sufocou como um cão. Agora ele chama-me racista, mas eu sou a pessoa menos racista que existe”, escreveu. Num comício em Richmond, sem citar o nome do visado, o empresário disse aos apoiantes: “Estes pobres senhores a repetir ‘Nunca o Trump, nunca o Trump’, têm-no feito durante meses; fizeram-no em Indiana e em Nova York, e eu venci de forma massiva”.
Reince Priebus, líder do Comité Nacional do Partido Republicano, também usou a conta de Twitter, mas para tentar apelar a um consenso: “Eu respeito Mitt e as diferenças, mas não podia discordar mais. O SCOTUS é demasiado importante para perdermos para as gerações. Paremos com isto e unamo-nos”.