Vivemos tempos de conspiração, uma conspiração de cúpula e a dificuldade é saber quem conspira mais, porque todos conspiram. Lamentavelmente, contra o povo e pelo cargo ou voto.
Nesse contexto, a imprensa tem feito um papel mais degradante do que o usual.
Dizer nada escrevendo muito é o estilo predominante de “narrativa” quando se trata de opinião. Ganhou força em tempos de Google. O artigo do El Pais (O brasileiro sabe o que não quer) foi montado dentro dessa proposta.
A regra é rechear o texto, parágrafo a parágrafo, com links para matérias de terceiros que, supostamente, embasam suas colocações. Só que, diferentemente, a matéria no link é desprezada e o colunista pega uma simples frase de um entrevistado complexo como um Frei Beto – apenas um exemplo — para fazer valer o seu achismo.
Também valem citações (vi texto de um jornalista da extrema-direita citando o “velho Lenin”, como se fosse um amigo seu, para mostrar como a esquerda brasileira está “equivocada”).
O achismo preenche o espaço da entrevista, da investigação, da reflexão, permite que os colunistas se multipliquem geometricamente, do mesmo modo que seus leitores, ávidos por opinião (parecida com a sua) e não por conhecimento.
Lamento informar esse colunista do El País que o seu artigo não convence. Garanto que o brasileiro não sabe o que não quer.
Na verdade, o brasileiro fica cada vez mais confuso porque ninguém na cena política atual é o que parece ser, ao contrário, manifesta-se nos bastidores e a fala não oficial é levada, se for conveniente, ao horário nobre na TV, pelo jornalismo mainstream.
Hoje (08/07), no “Globo em Pauta” (programa jornalístico da TV GloboNews), Eliane Catanhede deu uma notícia em tom de fábula:
“Um passarinho me contou que o Michel Temer e o Eduardo Cunha encontraram-se nessa quarta-feira no Palácio do Jaburu para acertarem duas estratégias, solicitadas pelo Cunha: adiar a cassação do mandato do parlamentar o máximo possível e conseguir colocar um amigo de Cunha na Presidência da Câmara, em seu lugar.”
Como é que o Cunha dita as regras para o interino? E o que mais pode estar acontecendo no Jaburu e em outros lugares desse país quando os políticos se encontram, às vésperas de eleição?
A notícia, percebe-se, não objetivou esclarecer, mas confundir, diria o saudoso “Chacrinha”, apresentador de TV que criou um inovador estilo de comunicação nos anos 60 e 70.
Voltando aos bastidores dos fatos, eles também chegam ao conhecimento do espectador via áudios vazados em delação premiada, notadamente na Operação Lava Jato. E, do mesmo modo como esses áudios são denunciados, eles desaparecem, ficam no vácuo do não julgamento porque os envolvidos, majoritariamente, são políticos que lideram bancadas no Senado e na Câmara.
De que jeito o brasileiro pode saber o que não quer se nem sabe o que está acontecendo direito?
Sherlock Holmes poderia ser um grande jornalista nesta fase de pouca informação relevante. Temos pistas, mas o que os bandidos (delatados na Lava Jato) estão tramando de fato? Qual será a grande escapada?
Para o povo, a grande escapada é a urna de votação, desde que cobremos campanhas, na mídia, justas com todos os candidatos. Ou seja, candidatos que estão nos primeiros lugares das pesquisas preliminares, como Luiza Erundina e Marcelo Freixo, têm o direito de ir à TV apresentar seus programas de governos.
Esse direito está sendo cerceado por uma nova lei (extra-oficialmente batizada de “Eduardo Cunha”, porque foi ele que a criou/aprovou) que afirma que os partidos com menos de nove parlamentares não “precisam” ser convidados pelas emissoras de TV para comparecer aos debates públicos.
Há muito assunto relevante para a imprensa brasileira colocar em pauta e que pode, sim, ajudar o brasileiro a saber o que não quer.
Mas o caminho de construção dessa visão crítica e fundamentada é apresentando informações substanciais.
Com menos opinião, mais honestidade; menos conclusão e mais investigação. Mesmo porque o cenário hoje é de brumas.
Nota: a autora escreve em português do Brasil