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Quinta-feira, Novembro 21, 2024

Partir do monólogo para o diálogo. A saúde inter-relacional

Isabel Rodrigues
Isabel Rodrigues
Escritora, licenciada em Psicologia Clínica, Poeta, Contista, Ensaísta, Assistente técnica

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“Não existe nenhum dever mais inevitável do que o da retribuição de uma gentileza…” (Cícero)

Interior social

Cognição social “Lugar” onde se desenrola todas as nossas atitudes, como interpretamos as nossas acções e experiências, como lidamos com as outras pessoas, e como as pessoas se influenciam umas às outras e se comportam em grupos. Vamos ver quais as variáveis que nos afectam…

Palavras-Chave Endoculturação, Comunicação. Reciprocidade, Concessão, Conformismo, Auto-revelação, Ambiguidade, Altruísmo, Atracção, Amor. Impacto e Facilitação social.

Interacção social, onde se situa a cultura?

Cada vez é mais importante saber qual a importância da manutenção da cultura no Homem, assim sendo, podemos dizer que o indivíduo só se torna verdadeiramente humano a partir da sua interacção com os demais seres humanos, torna-se impossível isolar o ser humano da sociedade. Esta interacção é padronizada pela cultura. O indivíduo, como membro da sociedade, tem um comportamento modelado em função das suas potencialidades hereditárias e das normas e padrões da sua cultura.

O Homem desde o nascimento participa num sistema social, sendo herdeiro de uma tradição cultural mantida pelos seus antepassados e transmitida de geração em geração. A criança é submetida a um processo contínuo de aprendizagem maior ou menor apreensão, que se prolonga por toda a sua vida, orientando-o e canalizando seus impulsos pessoais para as expectativas da sociocultura, onde aprende a evitar comportamentos anti-sociais, sujeitos a punições e sanções e aprende a viver em reciprocidade no seio da sociedade.

Chama-se Endoculturação – processo através do qual o comportamento humano é modelado culturalmente e organizado socialmente.

Nas nossas vidas como nos relacionamos?

  • Comunicação

O Homem como “animal social” que é, precisa de comunicar com o mundo que o rodeia e, de uma forma especial, com os seus semelhantes. Essa comunicação é feita através dos sentidos, que são como que a porta aberta para a percepção do que se passa à nossa volta.

O bébé faz uma tentativa de comunicação logo à nascença, no choro da criança que se ouve no berçário quando e onde ocorre o nascimentoO bébé faz uma tentativa de comunicação logo à nascença, no choro da criança que se ouve no berçário quando e onde ocorre o nascimento. Na morte há uma tentativa de comunicação final, morrer junto dos entes queridos, de mão dada com o médico, no testamento onde um objecto pessoal é deixado, onde esta comunicação já só é simbólica mas de grande valor emotivo e social. (Rodrigues I.)

A comunicação é o suporte de vida em sociedade; nenhum grupo poderia sobreviver se não existisse uma troca de comunicações entre os seus elementos.

A palavra vem do latim “communis”, que significa “comum” portanto, a primeira noção a ter em conta é que só há comunicação quando aquilo que é comunicado tem um significado para os dois pólos emissor-receptor através de um código por exemplo linguístico.

Cientistas sociais defendem que existem algumas linhas comuns que atravessam a maioria das nossas relações.

E como agimos com os outros?

  • Intercâmbios sociais e reciprocidade

Cada pessoa numa relação dá algo ao outro e espera receber algo em troca. Se for de cariz económico como acontece entre empregados e empregadores o intercâmbio será entre trabalho ou dinheiro, se for amizade, amorosa ou familiar tem um valor imaterial isto é, estima, lealdade, e afecto, que tem subjacente a qualidade em dar e receber, se um parceiro só der algo e não receber nada em troca a relação extingue-se, mais cedo ou mais tarde.

O princípio de reciprocidade define uma regra que afecta muitos aspectos de comportamento social, todos sentimos que temos de pagar, de algum modo, o que nos foi dado, um favor, uma prenda, um sorriso, um aceno, como uma “dívida” social para com o outro e está profundamente enraizado em vários países e onde queremos dizer, “muito obrigado”. (Cialdini, 1984).

Muitas vezes sentimos essa obrigação e somos levados ao conformismo, dizemos “sim” ou compramos algum produto, mesmo que à partida não o tenhamos desejado.

  • O efeito de concessão-recíproca

Quando por exemplo, na compra de casa, à segunda tentativa o vendedor baixa o preço do imóvel, esta concessão leva o parceiro a pensar em aderir à compra da casa. Houve uma concessão e concordância de ambas as partes.

  • O efeito de reciprocidade e auto-revelação

Quando contamos a alguém alguma coisa sobre as nossas vidas, alguns estudos revelam que isso leva igualmente algumas pessoas a darem-se também um pouco, da sua intimidade, à medida do aprofundamento das relações. (Jourard, 1959; Altman, 1973, Rubin, et al. 1980; Hansen e Schuldt, 1984).

Será um acto genuíno a relação Incondicional?

  • O Altruísmo

Chama-se um agir incondicional sobre a indiferença generalizada, onde a dádiva supera o “egoísmo”. Isto põe em causa a teoria que todas as relações se baseiam no intercâmbio, por exemplo no caso dos dadores de órgãos, sangue, medula, de caridade ou socorrismo. São actos de dádiva sem qualquer retorno e gratidão visível, ou aclamação pública à vista, como actos de amor ao próximo sem resposta muitas vezes do receptor.

Mas nem sempre é linear esta ajuda; por vezes surge um acto contrário: Num caso conhecido de Genovese que foi atacada na rua, em 1964, a indiferença generalizada dos transeuntes em relação ao episódio foi notória, em meia hora de um ataque, trinta e oito pessoas assistiram e nada fizeram. O porquê desta apatia? Muitas, por vezes não é por não se preocuparem, mas por não saberem como deve ser feito. A interacção e acção social é afectada pela cognição social. Vejamos…

O efeito do espectador, quanto maior o tamanho do grupo de espectadores, menor a probabilidade de auxílio, onde surge a hipótese de difusão de responsabilidade, ninguém sentiu como sua a responsabilidade de agir, muitos estavam a observar e acharam que alguém iria agir na vez dele, muitas vezes motivos pessoais levam a não agir (medo do assaltante, o não querer ser envolvido). Muitas pessoas a verem a mesma acção dificultam a visão necessária de emergência no que está a acontecer.

Ambiguidade Não há certeza do que se está a passar, uma disputa de amantes? Uma brincadeira? Toda esta ambiguidade leva a não agir em conformidade.

Ignorância pluralista Cada uma das testemunhas na janela olharam umas para as outras para decidir se seria uma emergência e nada decidiram. A incerteza levou ao “não agir”.

Relações emotivas e de proximidade

Surge a questão, se a proximidade é que faz as pessoas se relacionarem ao nível de encontros amorosos e relações duradouras.

Alguns estudos apontam que mais de metade dos casais que requereram certidões de casamento em Columbus, Ohio, durante o Verão de 1949, eram pessoas que viviam dentro de seis quarteirões perto uns de outros, quando marcaram encontro pela primeira vez (Clarke, 1952).

  • Atracção

Factor importante para os casais se voltarem a encontrar, não existe algo pré-definido. Podendo os indivíduos procurar parceiros o mais atraentes possíveis mas acabando geralmente a ter uma visão mais sensata arranjando parceiros dentro dos recursos sociais aproximadamente comparáveis, onde tendem a arranjar um parceiro desejável mas onde também tentam evitar a rejeição. Esta hipótese de emparelhamento prediz uma forte correlação entre as atracções físicas dos dois parceiros (Berscheid e Walster, 1974; Whit, 1980, Feingold, 1988).

A homogamia é uma tendência generalizada para gostar de pessoas semelhantes a nós. Outros factores correlacionados são aspectos como o extracto social, padrões sociais, rendimentos, religião, hábitos sociais (características que afectam a decisão do casamento e da estabilidade da relação). Nem sempre isto acontece, apesar da forte correlação das anteriores variáveis, muitas pessoas casam com pessoas de outros países e por aspectos sociais que à priori não estavam evidenciados como prováveis de acontecer.

  • O Amor

comunicacao-4A atracção ao se tornar profunda e íntima a relação pode ser entendida como amor. Aqui entram designações de cumplicidade, romance, amor romântico, amor companheiro e busca cavalheiresca.

É o mundo dos poetas, “O amor é um fogo que arde sem se ver”- Camões, e das escritas mais elevadas e de exaltação onde o amor pode ser descrito como sendo essencialmente apaixonado, um tipo de amor em que se “sente” e um estado em que se “fica”.

Um estado relacional necessário ao Homem, de saúde mental e física e de relação mútua, de estabilidade emocional. Sendo ao mesmo tempo, “Um estado emocional desordenado nos sentimentos de ternura e de sexualidade, exaltação, dor, ansiedade, alívio e ciúme que coexistem numa confusão de sentimentos” (Berscheid e Walster, 1978).

Por fim, a Facilitação social refere que as pessoas executam tarefas na presença de outros empenhados na mesma tarefa, as pessoas andam por exemplo de bicicleta mais velozmente, aprendem labirintos mais rapidamente e solucionam um maior número de problemas de multiplicação no mesmo período de tempo. Este efeito foi verificado por (Allport, 1920.)

Nem sempre é assim porque uma audiência pode inibir tanto como facilitar. Pode surgir um estado de intensificação de impulso ou activação, sendo à partida benéfica a interacção social entre as pessoas. (Robert Zajonc).

Teoria do impacto social, (Bibb Latané), segundo ele, todo o indivíduo está exposto a um conjunto de forças sociais que convergem sobre ele como uma força de impacto, traduzida em variáveis como a idade, status, poder, que o afectam na proximidade de um determinado espaço e tempo tendo influência na sua actuação.

Terminando…

A interacção social e cultural, são então factores importantes no reconhecimento do outro e na harmonia da convivência social, que nos padroniza e nos permite sair de um monólogo para um diálogo entre grupos ou entre pessoas que nos interessa conhecer. São características que nos atraem e nos permitem amar de forma plena.

Os intercâmbios sociais são factores determinantes numa sociedade porque nos permite aceder a estruturas complexas de interacção de aprendizagens constantes que nos permite viver em sociedade e ter um futuro promissor.

comunicacao-3Desde crianças, que essa interacção e essa familiaridade está presente nos entes queridos e nas regras de sociabilização traduzidas em “skills” que vamos adquirindo de forma a fazer face a dificuldades que permitam construir a nossa personalidade de forma mais coerente e saudável. Para fazer face a este intrigante Mundo deparamos todos dias com situações ambíguas que nos interessa entender para progredirmos interiormente e percepcionar formas correctas de conduta e conhecer as nossas limitações e aspirações de inter-ajuda.

É através da comunicação com o outro que nos entendemos e através da reciprocidade que sentimos novas formas de actuar na intimidade, confidencialidade, amizade, altruísmo, conformismo, e possibilidade de actuar perante o fracasso e as situações dúbias de forma a que nós e os outros possamos coabitar e sentir seguros nas relações de qualidade perante as gerações futuras.

Os Homens do amanhã deverão sentir incondicionalmente e culturalmente esse apreço de serem “agentes sociais” que procuram criar novos horizontes e novas perspectivas de actuar traduzidos em benefícios sociais, mais saúde, mais amor, e em diálogo permanente de forma a perceber a sociedade e manter uma “porta aberta” com o ainda desconhecido.

Uma geração com capacidade de manter uma saúde inter-relacional paradigmática de liderança, conhecedora de todas as vertentes essenciais de acção, tornando assim possível construir “pontes de comunicação” coerentes e duradouras no futuro com os outros, algo cimentado em conhecimento, experiência, entendimento e vontade de se relacionarem de uma forma cada vez mais saudável. (Rodrigues, I.)

Bibliografia:
Gleitman. H. Psicologia. Fundação Calouste Gulbenkian. 4 ª Edição.
Lampreia. M. J. Técnicas de Comunicação. Public. Europa-América. Colecção Saber
Marconi. A. M, Presotto, et N. M. Z. Antropologia, Uma Introdução. 3ª Edição. Ed. Atlas

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