Sinto que anda qualquer coisa no ar que nos esgota e mete medo, qualquer coisa que nos leva a aceitar passivamente as ideias com que os vários pensamentos únicos nos querem e têm vindo a formatar.
Inquietações
Inquieta-me pensar se esta coisa inquietante que anda no ar não será aquilo a que os donos disto tudo chamam de normalidade democrática. Inquieta-me pensar que sem serem violentos, sem nos ameaçarem, estamos a deixar-nos condicionar e a começar a esquecer as palavras e a deixar que elas fujam e vão para outros lados onde podem ser mais úteis. E se as palavras nos fogem, os músculos da fala, por falta de uso, atrofiam-se, e os mecanismos do cérebro, onde o pensamento ganha forma, enferrujam.
Inquieta-me mesmo que um dia destes em que tivermos necessidade de tomar a palavra não sejamos capazes, pois, por falta de uso e manutenção, o nosso reservatório foi-se esvaziando e já não encontramos palavras para tomar a palavra.
Tomar a palavra
Porque não quero fazer parte daqueles que esquecem as palavras e se esquecem de si próprios, porque acredito que o futuro é daqueles que se recusam a ser figurantes da sua própria vida, aqui estou preparado para tomar a palavra e tentar mostrar que quando no universo da cultura, o universo do humano por excelência onde se pensa o mundo e as coisas na sua globalidade e complexidade, onde a memória se reaviva e os futuros se inventam, também esquecemos as palavras então é o presente que em cada dia estamos a pôr em causa.
É que apesar dos donos da cultura em Portugal se estarem a divertir bué, o rei vai mesmo nu.