Uma equipa de investigadores, liderada por Catarina Gomes, docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), e Luísa Pinto, investigadora do Instituto das Ciências da Vida e da Saúde (ICVS) da Universidade do Minho, descobriu um mecanismo que explica como a alteração do sistema imunitário durante a gravidez tem implicações na génese da ansiedade crónica – uma das psicopatologias mais comuns das sociedades atuais – e que afeta de forma diferente o sexo masculino e o sexo feminino.
O estudo, que envolveu investigadores do Instituto de Imagem Biomédica e Ciências da Vida (IBILI) e do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC), ambos da Universidade de Coimbra, em colaboração com o ICVS, centrou-se nas células da microglia, «células especializadas do sistema imunitário que regulam o normal funcionamento do cérebro durante toda a nossa vida», explica a coordenadora do estudo, Catarina Gomes.
A partir de experiências num modelo animal de ansiedade crónica, resultante de uma alteração do sistema imune da grávida, os investigadores estudaram, desde o nascimento até à idade adulta, as anomalias na microglia originadas pela alteração no ambiente imunitário in útero. Observaram que «a microglia adota uma morfologia anómala em ambos os sexos, mas as anomalias são diferentes no sexo feminino e no sexo masculino», esclarece Catarina Gomes.
Identificadas as diferenças, os investigadores quiseram perceber as suas implicações na resposta terapêutica. Testaram, em fêmeas e machos, o mesmo tratamento (um fármaco modulador da resposta imune), observando que «a terapêutica foi eficaz na ansiedade dos machos, mas não das fêmeas. Os resultados mostram que nas fêmeas, a correção das anomalias imunes é mais difícil, o que impediu o esperado efeito ansiolítico da terapêutica», descreve Catarina Gomes.
Os resultados do estudo publicado na revista Molecular Psychiatry, além de revelarem o importante papel do sistema imunitário na génese da ansiedade crónica, colocam dois novos desafios à indústria farmacêutica.
Por um lado, «o desenvolvimento de fármacos que tenham como alvo outras células, para além dos neurónios». Por outro, este “novo” alvo terapêutico «abre novas perspetivas ao design de fármacos diferenciados para homens e mulheres. Seria um passo em frente na individualização terapêutica, com potencial para aumentar o número de pacientes com resposta favorável ao tratamento da ansiedade crónica, uma patologia que é também um dos principais fatores de risco para outras doenças psiquiátricas, como a depressão, com custos elevados para os sistemas de saúde», conclui a especialista em Farmacologia da UC.