Diário
Director

Independente
João de Sousa

Quinta-feira, Novembro 21, 2024

Câmara de Barcelos gasta 87 milhões de euros na compra da sua própria água

Água

A Câmara de Barcelos vai pedir um empréstimo de 87 milhões de euros para ter de volta a gestão das águas e saneamento do concelho. Apesar de se tratar de uma verba elevada, o presidente da autarquia, Miguel Costa Gomes, mostra-se aliviado por a factura não ser maior. É que a câmara havia sido condenada pelo tribunal a pagar à empresa privada concessionária das águas e saneamento – a Águas de Barcelos, detida maioritariamente pelo grupo AGS – um total de 172 milhões de euros. E, ainda assim, seria a empresa a manter a gestão.

A Câmara recorreu e está a aguardar a decisão final, mas este acordo de princípio entre a edilidade e a empresa suspende a sentença, qualquer que ela seja. O que é positivo para os interesses de Barcelos, garantiu o autarca, na Quinta-feira, na conferência de imprensa que se seguiu à aprovação do acordo, em reunião extraordinária de Câmara. Ainda que a sentença seja favorável à autarquia, para acabar com a concessão teria de pagar à Águas de Barcelos o investimento feito ao longo dos últimos dez anos, acrescido de juros. Seria sempre um valor superior ao que agora foi acordado, defendeu Miguel Costa Gomes, que, agora, tem até Janeiro para obter o empréstimo e conseguir o visto do Tribunal de Contas para fechar o negócio.

Um sonho transformado em pesadelo

Tal como muitas outras câmaras do país, a de Barcelos resolveu, em 2004, assinar um acordo de concessão da distribuição da água e tratamento do saneamento do concelho.

À partida, os benefícios pareciam evidentes. Ao longo dos 30 anos seguintes, a Câmara ficaria sem a responsabilidade de prestar esse serviço aos seus munícipes. O investimento a fazer, num valor que se previa de mais de 116 milhões de euros até 2034, seria assumido pela empresa privada escolhida. Para além disso, a edilidade receberia ainda uma retribuição anual muito substancial, que ultrapassaria 12 milhões de euros, ao longo do período da concessão.

Acontece que este cenário idílico só se concretizaria se determinadas condições colocadas no contrato se cumprissem. Em especial, a que previa o aumento gradual do consumo de água pela população. O documento indicava que, em 2005, ele fosse de 126 litros por habitante e só chegou aos 112. E, em vez de aumentar, foi baixando nos anos seguintes, atingindo os 81 em 2007, para uma previsão de 132.

Este choque com a realidade levou a que, em 2008, tenha sido necessário introduzir uma adenda no contrato, que atribuía à Câmara a responsabilidade financeira de algumas obras e implicava a redução do plano de investimentos por parte da empresa.

Câmara Municipal de Barcelos - ÁguaIsso acabou por não ser suficiente, as duas partes entraram em conflito declarado e, em 2012, um Tribunal Arbitral haveria de dar razão à empresa e determinar que fosse compensada em 172 milhões de euros pela autarquia. Uma sentença que seria, mais tarde, confirmada pelo Tribunal Central Administrativo do Norte e que, a ser cumprida, deixava a câmara à beira da falência.

Ao longo do país, há mais de três dezenas de municípios que concessionaram a empresas privadas a distribuição das águas. Decisões das quais resultaram muitos focos de conflitos. O caso de Barcelos é, até agora, o mais grave, mas também em concelhos como o Cartaxo, Marco de Canaveses e Azambuja o processo não tem sido nada pacífico.

O maior problema, diz o Tribunal de Contas, num relatório arrasador relativo a uma auditoria feita em 2014, é que, de uma forma geral, as autarquias assumem praticamente todos os riscos, enquanto que as empresas concessionárias têm garantidos lucros excessivos.

Receba a nossa newsletter

Contorne o cinzentismo dominante subscrevendo a nossa Newsletter. Oferecemos-lhe ângulos de visão e análise que não encontrará disponíveis na imprensa mainstream.

- Publicidade -

Outros artigos

4 COMENTÁRIOS

  1. […] Até agora, o caso mais grave foi o que ocorreu em Barcelos em que, na sequência de um conflito com a concessionária privada, a Câmara foi condenada pelos tribunais a pagar-lhe uma indemnização milionária de 172 milhões de euros! Para resolver a questão e evitar males maiores, a autarquia acabou por chegar a acordo com a empresa para, a troco de 87 milhões, comprar-lhe de volta o direito de levar a água à casa dos seus munícipes. […]

Comentários estão fechados.

- Publicidade -

Últimas notícias

Mais lidos

- Publicidade -