“O meu Deus é melhor do que o teu”. Palavra de ordem que parece opor as religiões e trazer ao tempo presente inenarráveis cenários destruidores do melhor da essência do Homem.
Assistimos ao triunfo de uma barbárie que age em nome de uma aparente lealdade religiosa e que todavia não é mais do que uma nova dimensão do crime organizado, dos grandes negócios de armas e dos narcotráficos e dos interesses de países poderosos que, em tempo de crise, relançam as suas economias com a desfaçatez dos objectivos – e a ignorância do que é Humano na jornada.
Os deuses, todavia, ficam imunes as que os homens fazem em seu nome. Permanecem vivos mesmo quando os homens morrem, em vão, por eles.
Todas as coisas são estranhasSéneca, um contemporâneo de Cristo, intelectual espanhol (de Córdova), dizia que “todas as coisas são estranhas, só o tempo é nosso”. Podemos admitir que a afirmação parecia lícita até aos alvores do século XXI: todas as coisas do mundo eram realmente estranhas, mas o tempo, essa convenção de ficções e de espartilhos, parecia ser nosso. Os cientistas sociais procuram uma explicação abrangente, que explique os últimos anos: torres gémeas, Iraque, Atocha, Boston, Síria, os mortos no Mediterrânio, o Estado do Iraque e do Levante, Trump, o Boko Haram, a confusa argumentação religiosa num mundo que afinal enferma apenas do político e do económico que promovem as batalhas pelo poder.
Hoje, os guias dos cegos são outros cegos, o que equivale a dizer que andamos às apalpadelas e sofremos o que os nossos instintos ditam, com novas formas de pensar, de sentir e de agir que não entendemos.
A ocidente, os anos 80 e 90 do século passado pareciam ser de crescimento económico (isto é, de grandes lucros, não tributados), dos ricos, e da permissão, aos pobres, da ilusão do consumo. À euforia da mão de obra barata a par do dinheiro barato e o endividamento seguiu-se a especulação sem controlo, dos bancos – e a grande crise internacional, com a América como vértice. A crise de 2008 seria o culminar de uma queda vertiginosa.
Falência civilizacional É neste quadro de falência civilizacional de modelo capitalista (que acabou por transferir as dívidas dos bancos para os governos nacionais e estes para o conjunto da sociedade arruinando as pessoas com o programa extremamente severo da austeridade) que emergem divisões profundas que colocam as religiões como chancela do que afinal tem outros contornos. Hoje, Trump protagoniza a vingança.
Olhamos com horror para sucessos bárbaros: o comportamento assassino dos talibãs, as várias frentes do Afeganistão, da Síria, do Iraque, do Paquistão, mas também da Líbia, do Líbano, do Quénia ou do Chade, e os levantamentos violentos na Tunísia, Egito, Argélia, Iémen, Marrocos, Bahrein, Jordânia e Omã (a lista é imensa).
A chamada Primavera Árabe terá assinado também a página mais significativa para uma transformação do mundo nas ultimas décadas. Essa Primavera foi uma onda de protestos e revoluções ocorridas no Médio Oriente e no norte do continente africano – a partir da Tunísia – em que a população saiu às ruas para derrubar ditadores ou reivindicar melhores condições de vida.
Tudo começou em dezembro de 2010 na Tunísia, com o derrube do ditador Zine El Abidini Ben Ali. O início foi o episódio envolvendo o jovem Mohamed Bouazizi, que vivia da venda de frutas e que viu os seus produtos confiscados pela polícia por se recusar a pagar um imposto. Bouazizi ateou fogo ao próprio corpo, marcando um evento que abalou a população de todo o país e que fomentou a concretização da revolta popular, contagiando outros países com atitudes de insurreição.
O monoteísmo
Hoje, assistimos a guerras reivindicadas por grupos (ou países, como os EUA, por exemplo) de tradição monoteísta. O que é o monoteísmo? O monoteísmo vem de uma palavra grega que significa Deus único. É a crença na existência de apenas um só Deus (omnipotente, omnisciente e omnipresente). Esse Deus é o modelo a seguir e a adorar, pois a sua conduta é perfeita.
Mas se as religiões mais beligerantes são monoteístas, porque rivalizam? É melhor conhecê-las, mesmo rapidamente. O Judaísmo, a mais antiga das três religiões monoteístas principais, surgiu da religião mosaica, pré-judaica. A palavra “mosaica” deriva de Moisés que foi, de acordo com a bíblia hebraica, o corão e as escrituras da fé Baha’i, um líder religioso, legislador e profeta, a quem é tradicionalmente atribuída a autoria da Torá. É o profeta mais importante do judaísmo, e igualmente reconhecido pelo Cristianismo e Islamismo, assim como por outras religiões. É o grande libertador dos hebreus, tido como o seu principal legislador e mais importante líder religioso.
O cristianismo nasceu de uma ramificação do judaísmo e por muito tempo foi conhecido como uma seita judaica. Segundo a religião judaica esperava-se um homem que seria o Messias. Seria um descendente do Rei Davi e restauraria o Reino de Israel. Nasce Cristo, em Belém. Ao começar a atrair seguidores e ao ser um novo pedagogo, é apontado por muitos como esse Messias – ideia rejeitada por outros tantos. Foi condenado e morto pelos Romanos como um líder rebelde.
O Islão é uma religião monoteísta que surgiu na Península Arábica no século VII, baseada num conjunto de textos sagrados reunidos sob o nome de Corão e nos ensinamentos religiosos do profeta Maomé. Na visão muçulmana o Islão surgiu desde a criação do homem, ou seja, Adão foi o primeiro profeta e o último foi Maomé.
Alá (Deus) é único e cada capítulo do Corão começa exatamente com “Em nome de Deus…” “Ele é Deus e não há outro deus senão Ele, Que conhece o invisível e o visível. Ele é o Clemente, o Misericordioso!
Ele é Deus e não há outro deus senão ele. Ele é o Soberano, o Santo, a Paz, o Fiel, o Vigilante, o Poderoso, o Forte, o Grande! Que Deus seja louvado acima dos que os homens Lhe associam!
Estas três linhas monoteístas são, como se percebe, incompatíveis pela forma como entendem os seus conteúdos e os personalizam. Ao tornarem-se fundamentalistas na interpretação geram embates sangrentos, como os que testemunhamos no mundo em que vivemos. Mas o que move os homens é uma cegueira acima do divino. E o mundo tornou-se a fila dos cegos que conduzem outros cegos.
Escrevo tudo isto, a pedido. Sei que me repito. Mas é o meu modo de (ainda) ver.
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90
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Imagem: “Cego guiando cegos” de Pieter Bruegel the Elder, 1568