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Domingo, Março 2, 2025

25 de Abril, Liberdade e Descolonização

Isabel Lourenço
Isabel Lourenço
Observadora Internacional e colaboradora de porunsaharalibre.org

Sahara Ocidental última colónia de África

O fim das guerras coloniais e a conquista da independência pelos povos de Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe foi uma das grandes conquistas do 25 de Abril,  revolução portuguesa.

A independência foi  resultado de anos de luta dos movimentos de libertação que culminou com a transferência de poderes, que hoje todos os políticos enaltecem e aclamam nas datas comemorativas, uns com a consciência limpa, outros nem tanto, e outros ainda com verdadeiras nódoas de sangue no seu histórico.

De 1961 a 1964 iniciam-se as lutas de insurreição armadas nas várias colónias, ao que Portugal de Salazar responde com uma guerra sangrenta, criminosa e trágica para todos os povos envolvidos. O regime fascista pensava que a guerra iria reforçar a sua posição e como todos os invasores e ocupantes ilegais vivia na ilusão que poderia ganhar.

Os números não são exatos mas estima-se que, durante a guerra colonial que durou 14 anos, foram mobilizados mais de 1 milhão de jovens portugueses, desses resultaram 15 mil mortos, 45 mil estropiados e deficientes e cerca de 140 mil vítimas de stress de guerra. Os números de perdas de vidas africanas ainda são menos exatos, fala-se em 1 milhão de mortos, mas certamente que foram mais, já para não falar dos feridos, mutilados e das cicatrizes psicológicas como o SPT que afectaram milhões.

A guerra colonial tornou-se assim de acordo com  vários académicos e historiadores um dos elementos, se não o elemento base,  para voltar o país contra a ditadura e criar no seio das forças armadas o movimento e a luta que culminaram com o 25 de Abril e o fim a 48 anos de opressão.

Nada disto é do conhecimento “europeu” são raras as pessoas que encontro que sabem o que foi a ditadura em Portugal, a guerra colonial e menos ainda as atrocidades cometidas em nome da pátria e da “integridade territorial” como torturas, milhares de presos políticos, campos de concentração, fome, miséria, agonia  não apenas de um, mas de vários povos.

Lutou-se e a liberdade chegou. O que dela se fez e faz, fica para outro artigo.

Infelizmente oiço hoje argumentos vindos de outro “colonizador” que falam de “integridade territorial” e que utiliza os mesmos métodos de ditadura fascista. Aqui bem perto no Sahara Ocidental, Marrocos ocupa, oprime, mata, tortura, viola.

Os sucessivos governos portugueses que aclamam e saúdam a independência das ex-colónias portuguesas na Assembleia da República e que deveriam defender a constituição portuguesa e o seu artigo 7º, fazem orelhas moucas e olhos cegos ao lento genocídio do povo do Sahara Ocidental.

Hoje como ontem, a justificação é a mesma: o espolio, saque, roubo de recursos naturais, directa ou indirectamente. Hoje como ontem, a geoestratégia leva os países que apoiaram o Portugal Fascista a apoiar o Reino de Terror de Marrocos. São eles EUA, Alemanha, França, Espanha e Inglaterra. Na ONU e na OUA sucedem-se as condenações, resoluções a “lamentos” tal como visto há mais de 4 décadas, mas dos 5 membros permanentes do Conselho de Segurança  fazem parte EUA, Reino Unidos e França … e o Secretario Geral da ONU (SG) é na verdade eleito por esses 5 membros de acordo com a agenda do momento.

Nada mudou nas técnicas utilizadas ontem por Portugal, hoje por Marrocos, apenas se desenvolveram e utilizam armas mais modernas. Para manter a ocupação recorrem à mega propaganda, a inexistência de liberdade, à censura, à falta de informação e um forte aparelho repressivo com detenções e torturas, invasões domiciliárias e para colocar a cereja no bolo, o maior muro de separação do mundo com 2720km de extensão, com armas de última geração, que divide o território em dois e criou a maior prisão à céu aberto do mundo.

Aos marroquinos inculca-se nas escolas que o Sahara Ocidental é uma província do Sul de Marrocos assim como nas escolas de Salazar se dizia que Portugal ia do Minho a Timor. Marrocos envia centenas de milhares de militares e colonos e criam um sistema de apartheid onde os saharauis não têm nem emprego, nem saúde, nem educação levando ao empobrecimentos e marginalização, hoje como ontem, mais uma vez o paralelismo.

Marrocos tal como Portugal na altura  não pode sobreviver do ponto de vista económico sem a colónia.

A forte resistência africana abalou os alicerces da ditadura, assim como a resistência saharaui irá acabar com o reino de Terror de Marrocos.

Os saharauis optaram desde o cessar-fogo de 1991, por uma resistência não violenta, mas as sucessivas traições da comunidade internacional, que não obriga Marrocos a honrar e respeitar o acordo de paz estabelecido, que deveria culminar em 1992/93 com o referendo de autodeterminação, irão inevitavelmente conduzir a outras formas de luta.

Portugal, com a sua história e com a constituição que nos rege a todos, tem um papel a desempenhar, e cabe ao governo português decidir se vai

Artigo 7.º da Constituição Portuguesa

Relações internacionais

1. Portugal rege-se nas relações internacionais pelos princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos, da igualdade entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos internacionais, da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados e da cooperação com todos os outros povos para a emancipação e o progresso da humanidade

2. Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos, bem como o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos

3. Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão

continuar a esconder-se atrás das saias da União Europeia e os interesses de França, Alemanha e EUA ou se vai contribuir para evitar mais derrame de sangue em África.

“Um povo que não conhece a sua história está condenado a repeti-la”

O povo português mais uma vez tem que pressionar como o fez no passado, e mais recentemente no caso de Timor-Leste. Portugal tem responsabilidade directa na existência da última colónia de África e é uma vergonha ser cúmplice deste crime.

Será uma vergonha acrescida se o SG português que se diz defensor de direitos humanos se posicionar ao lado do opressor, como indica o seu relatório deste mês para o Conselho de Segurança.

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