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João de Sousa

Terça-feira, Dezembro 24, 2024

Paris, Texas

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

‘Paris, Texas’ é também uma típica cidade petrolífera americana que anuncia no seu site ‘Paris Texas Oil Jobs’Conhecida por ser título do filme de Wim Wenders de 1984, ‘Paris, Texas’ é também uma típica cidade petrolífera americana que anuncia no seu site ‘Paris Texas Oil Jobs’: ‘os empregos do petróleo podem ser sujos, mas são certamente muito remuneradores quer profissional quer financeiramente, apesar do trabalho físico intenso que envolvem’ uma frase que poderia ter feito o seu caminho para os discursos eleitorais de Donald Trump.

A América do gás e do petróleo, das minas de carvão dos Apalaches e da famosa cintura da ferrugem, identificou a elite liberal, ambientalista e globalista, politicamente correcta, como a principal responsável pelas dificuldades com que se depara. Foi esta a América que elegeu Trump na base de um programa dedicado a proscrever acordos e tratados internacionais sobre o comércio ou o clima e que nos permite entender o anúncio bombástico do presidente Trump da retirada dos EUA do Tratado de Paris sobre mudanças climáticas.

E na verdade em vez da sua famosa frase: ‘fui eleito para representar os cidadãos de Pittsburgh, não os de Paris’, ele bem poderia ter apenas esclarecido que preferia a Paris do Texas, à dos acordos internacionais.

O problema do movimento conservador, ou mesmo reaccionário, que quer nos EUA quer na Europa se baseia no regresso ao passado perdido dos bons empregos operários do carvão, petróleo, metalurgia etc., é que isso é impossível, não só porque há hoje no resto do mundo quem faça o mesmo melhor e mais barato mas porque, acima de tudo, existem hoje ou num futuro próximo soluções tecnicamente mais eficazes de fazer o que essas actividades faziam.

Soluções mais concorrenciais: energias renováveis e a robótica

Num horizonte de dez anos, é hoje cada vez mais consensual que serão as energias renováveis e a robótica que serão as soluções mais concorrenciais. O que está em questão é saber quem vai dominar esta nova economia que explode um pouco por todo o lado; quem vai estabelecer as normas; quem vai tomar conta do imenso mercado que se abre. Não compreender isto, é nada compreender dos desafios que se apresentam e é fazer o jogo dos adversários.

Isto, nada tem a ver com a Convenção Quadro sobre Mudanças Climáticas de 1992, o protocolo de Kyoto ou o Tratado de Paris que lhes seguiram e que a ilimitada demagogia do Presidente Emmanuel Macron (e dessas mesmas elites que são tão pouco populares na Paris do Texas) que assegura que é o Tratado de Paris que vai fazer um mundo melhor outra vez. Trata-se tão só de saber quem vai dominar as tecnologias que vão fazer girar o mundo, questão da maior importância, mas que convém não confundir com a não menos crucial questão da saúde do planeta.

A Cimeira da Terra que se desenrolou no Rio de Janeiro em 1992 aprovou um conjunto de princípios, declarações e convenções que abordaram questões essenciais da agenda ambiental mundial como a diversidade biológica, a água, os oceanos, as florestas, a poluição pelo smog, a desertificação, mudanças climáticas, a pobreza ou a relação do desenvolvimento com o ambiente.

Tratava-se de um conjunto holístico de temas que requeria uma acção concertada, com instrumentos diversos e em diversas frentes e que, 35 anos depois, continua pleno de sentido, se bem que, naturalmente, a necessitar de alguns ajustamentos, como por exemplo o da emergência do plástico como contaminante universal.

A humanidade, em função das emissões de gases

Por razões de que a história está por fazer, a convenção sobre mudanças climáticas (UNFCC no acrónimo inglês) fez submergir as restantes convenções e iniciativas e passou a ser a única da qual se continuam a realizar reuniões que, desde o protocolo de Kyoto são anuais.

A razão de ser desta convenção é clara: a humanidade, em função das emissões de gases com efeito de estufa provenientes da sua industrialização e agricultura, mudou radicalmente a composição da atmosfera, sendo que se não alterar profundamente essas emissões, corre o risco de a modificar de forma mais espectacular ainda nos tempos próximos. A nova composição atmosférica tem um grande potencial de alteração climática.

Nesta base, um dos imperativos que se colocam à humanidade é o de limitar tão rapidamente quanto possível as emissões de gases com efeitos de estufa. Daqui a dizer que só precisamos de o fazer para assegurar a saúde do Planeta, vai no entanto a distância que separa um dos necessários múltiplos vectores de acção política, da pura demagogia.

E claro, quando se passa desta constatação a uma equação entre toneladas de carbono e graus de temperatura – na base de projecções que estão muito longe de poder ser tomadas como previsões – começa a delinear-se um cenário de ficção científica, onde o show-business e o barulho mediático substituem o bom senso e a racionalidade e onde tudo se torna possível.

Medidas a tomar

Pior ainda é quando daqui se passa, não para as óbvias medidas a tomar, i. e. (1) imposição fiscal sobre as actividades que produzem gases com efeitos de estufa; (2) investimento em investigação e desenvolvimento de alternativas e (3) disseminação de novas tecnologias; para um monstruoso sistema onde se pretende saber e controlar em toneladas de carbono, país a país, em que se reconverteriam as tais emissões num cenário de décadas. É a passagem da ficção científica à ficção burocrática!

A rápida diminuição das emissões de gases com efeitos de estufa – agora que a corrida tecnológica está em pleno desenvolvimento – tem como principal obstáculo a sua disseminação e a ausência de mecanismos suficientemente fortes (nomeadamente no Tratado de Paris) para que ela se possa fazer atendendo à falta de recursos da maior parte do mundo.

O fundamental aqui, é o de olhar para todos os objectivos urgentes de preservação do planeta que foram marginalizados pela obsessão climática vesga, defender a biodiversidade, os oceanos, a floresta, os recursos de água doce, combater a desertificação, a poluição atmosférica e a pobreza no quadro de uma nova relação entre desenvolvimento e ambiente.

E sobre isto, os nossos dirigentes, as nossas elites dizem pouco ou nada, e a actual enxurrada demagógica contribui para que disso não nos apercebamos.

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