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Segunda-feira, Dezembro 23, 2024

Pedrogão Grande: 20 perguntas que não podem ficar sem resposta

António Garcia Pereira
António Garcia Pereira
Advogado, especialista em Direito do Trabalho e Professor Universitário

Para combater a irresponsabilidade e a impunidade. Mas também para se evitar que daqui a 1 dia, 1 mês ou 1 ano, e perante uma nova tragédia, se esteja a ver, ouvir e discutir afinal exactamente o mesmo!…

A memória das vítimas mortais, os respectivos familiares, os feridos, os que escaparam à morte mas tudo perderam, os bombeiros que lutaram e lutam até à exaustão contra os fogos e todos os cidadãos em geral devem exigir respostas a estas questões.

1ª Por que razão a Polícia Judiciária, sempre tão cautelosa a avançar explicações para incidentes e acidentes, desta vez se apressou logo, e pela boca do seu Director Nacional, a afiançar que o incêndio tinha origem em causas naturais, mais exactamente numa árvore atingida por um raio de uma trovoada seca na zona de Escalos Fundeiros?

2ª É ou não certo que diversos habitantes da mesma zona de Escalos Fundeiros negaram que tivessem existido quaisquer trovoadas secas na região, confirmando que tinham existido, isso sim, mas mais tarde e para os lados da Sertã?

3ª Por que é que a página do IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera – que tem diariamente esse registo, e até com a possibilidade de recuo até ao dia anterior – no passado Domingo, 19/6, não tinha registo algum de descargas eléctricas no território nacional e porque é que o Presidente do mesmo Instituto veio depois, em conferência de imprensa, afirmar que afinal haveria registos dessas descargas na região de Escalos Fundeiros no início da tarde de Sábado, mas não conseguiu de todo explicar porque é que então não estavam disponíveis na dita página?

4ª É ou não verdade que no IPMA há falhas frequentes nesse tipo de registos visto o site, por diversas, para não dizer inúmeras, vezes, não interpreta correctamente os dados do algoritmo usado pelo Instituto?

5ª Existem, ou não, na região, e se existem, estavam operacionais, ou não, e porquê, torres e/ou câmaras de vigia de incêndios?

6ª Corresponde ou não à verdade que as condições atmosféricas do passado Sábado, 17 de Junho, não foram inéditas e por que razão, sendo conhecidas, não foram adoptadas quaisquer medidas especiais de aviso às populações e de detecção e combate a qualquer eventual fogo que era previsível que surgisse?

7ª A ter havido trovoadas secas na região de Escalos Fundeiros – onde o incêndio terá tido início cerca das 14h43 – é ou não verdade que, como aliás admitiu publicamente o próprio Presidente da Liga de Bombeiros, Jaime Marta Soares, as mesmas só se teriam verificado mais de duas horas depois (cerca das 16h30/16h45), pelo que, ao contrário do referido pela Polícia Judiciária, nunca poderiam ter sido a origem do mesmo incêndio?

8ª Como é possível, e por decisão de quem, que às 18h30, ou seja, quatro horas depois do princípio do incêndio, com o fogo descontrolado e ainda por cima numa zona que é conhecida como um autêntico “barril de pólvora”, só estivessem 156 homens, 46 viaturas e 3 meios aéreos?

9ª Como é possível que somente às 20h00 de Sábado (ou seja, 6 horas depois do início do incêndio!) o Comando Distrital de Leiria da Protecção Civil haja assumido o comando das operações?

10ª Como foi possível – tal como denunciou, entre outros, Fernando Curto, Presidente da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais – permitir-se não só a permanência de pessoas no perímetro do fogo, para mais de um fogo naquela região e com aquelas características, como até elas serem, pela própria GNR, desviadas e encaminhadas para dentro do tal perímetro, mais exactamente para a Estrada Nacional 236-1 que liga Figueiró dos Vinhos a Castanheira de Pera e na qual, em dezenas de metros, morreram 47 pessoas?

11ª Não é absolutamente intolerável que o Tenente Coronel Carlos Ramos, da GNR, no briefing realizado 3ª feira de manhã no Posto de Comando em Avelar, haja respondido a esta mesma questão da seguinte forma: “Não domino essa informação. Cheguei a Ansião numa altura em que isso já tinha passado” (sic)?

12ª Era ou não imperativo e também possível interditar a referida EN-236-1, designadamente bloqueando a entrada e saída principais e colocando alguns operacionais no início das respectivas ramificações?

13ª O tristemente famoso SIRESP (rede nacional de emergência e segurança, isto é, sistema de comunicação rádio entre todas as entidades e autoridades de emergência e de segurança) foi ou não um dos grandes negócios da SLN – Sociedade Lusa de Negócios (da qual foi administrador, a convite de Oliveira e Costa, o Procurador-Geral Adjunto e ex-Director do SEF, do SIS e do DCIAP, Daniel Sanches), celebrado, por 500 milhões de euros, e apenas 3 dias após as eleições que o PSD perdeu, com o Governo de Santana Lopes, e que foi o mesmo Daniel Sanches, Ministro (em 2004 e 2005)  da Administração Interna do referido Executivo que assinou, como membro de um Governo já só de gestão, o respectivo despacho de adjudicação?

14ª Tal sistema SIRESP – cujo negócio António Costa, enquanto Ministro da Administração Interna do 1º Governo de Sócrates, não cancelou, antes chancelou e confirmou com um desconto de 14,5 milhões de euros, fechando o negócio com Oliveira e Costa por 485,5 milhões de euros, sendo que até 2014 ele já custara 270 milhões ao erário público – não falhara já, e de forma estrondosa, em Agosto do ano passado, aquando do grande incêndio do concelho do Sardoal, tendo então ficado inoperacional durante 17 longas horas, entre o final da tarde de 23/8 e a manhã de 24/8?

15ª E o mesmo sistema SIRESP – não obstante dever ser um sistema à prova de cataclismos e apesar de todos os inquéritos e informações (claro que mantidos confidenciais) de 2016 – não voltou agora a falhar, e a falhar redondamente, no incêndio de Pedrogão Grande, durante horas a fio, pois as respectivas estações fixas foram destruídas e, das quatro estações móveis, só uma estava disponível e levou horas a ser posta em funcionamento?

16ª Em que medida, e por responsabilidade de quem, essa milionária inoperacionalidade possibilitou ou facilitou todas ou, pelo menos algumas, das questões acima colocadas?

17ª É ou não verdade (como denunciou o Coronel João Marquito, da AOFA – Associação dos Oficiais das Forças Armadas, em posição tornada pública em 10/08/16) que o mesmo Governo de Sócrates e os seguintes proibiram ou inviabilizaram a utilização, no combate aéreo aos incêndios, dos aviões C-130 da Força Aérea Portuguesa, os quais tinham uma enorme capacidade operacional e cujos kits desse combate a incêndios ficaram assim a apodrecer na Base Aérea do Montijo, tudo isto enquanto António Costa, então Ministro da Administração Interna, e também com a ajuda de Diogo Lacerda Machado, se envolveu no até hoje obscuro negócio da aquisição dos 6 helicópteros Kamov, dos quais, aliás, apenas 3 se encontram presentemente operacionais?

18ª É ou não verdade que, estando actualmente no Regimento de Beja, para exercícios militares, um batalhão com 300 militares e 100 médicos, cujo envio para o teatro de operações o Exército disponibilizou prontamente, ainda agora tal envio aguarda autorização da Protecção Civil?

19ª É ou não verdade que, com o novo regime legal da arborização de 2013, aprovado pelo Governo Coelho/Portas (o Decreto Lei nº 138/2013, de 19 de Julho) – regime esse que passou a tratar o eucalipto como qualquer outra espécie, aligeirou e facilitou o respectivo processo administrativo, passando a admitir inúmeras situações de mera comunicação e não já de autorização prévia, permitiu o contorno das restrições e proibições da Reserva Ecológica Nacional (REN) por quaisquer programas públicos ditos de apoio ao desenvolvimento florestal e possibilitou a plantação do referido eucalipto em áreas onde anteriormente existiam outras espécies – mais de 90% de todas as espécies entretanto plantadas passaram a ser do mesmo eucalipto, num total, só nos 3 primeiros meses da aplicação dessa lei, de 1400 hectares?

20ª E é ou não verdade que o Governo de António Costa, não obstante os protestos e as denúncias feitos desde há anos por inúmeras entidades e personalidades ambientalistas – designadamente acerca da destruição das espécies autóctones no país, da ausência do adequado ordenamento do território e, precisamente, do considerável aumento do perigo de incêndios de grandes dimensões  e de consequências muito graves – e apesar de todas as promessas feitas pela Ministra da Administração Interna e pelo Ministro da Agricultura aquando dos incêndios do Verão passado e das gongóricas Resoluções do Conselho de Ministros de 21 de Março de 2017, manteve no essencial a mesma actuação política, cedendo uma vez mais aos grandes interesses ligados à madeira e à pasta de papel e praticamente apenas se preocupando com aquilo a que chama de “eficiência” da florestação?

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