52.º Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary
Sendo uma das mostras mais importantes da Europa, e pertencendo à classe principal dos festivais de cinema (a mesma de Cannes, Berlim, Veneza, San Sebastián, …), Karlovy Vary, pelo menos nos anos mais recentes, tem organizado a sua secção oficial competitiva com base em filmes de realizadores pouco conhecidos ou em início de carreira e em filmografias de países pouco presentes nos ecrãs ocidentais.
Uma opção arriscada, mas talvez a possível. E, no caso concreto da edição deste ano que termina amanhã, não se pode dizer que a aposta tenha sido bem sucedida. De facto, terminada que está a exibição dos filmes em concurso poder-se-á dizer que a maioria dos títulos apresentados não ficará na nossa memória durante muito tempo. Falamos hoje dos seis filmes que constituíram a segunda metade do lote de competidores.
Breaking News
Um filme sobre a televisão dos nossos dias. Começamos por um dos mais interessantes, com as reservas anteriormente referidas: Breaking News da romena Iulia Rugina. O tema que enquadra a narrativa é de grande actualidade e motivo de ampla discussão, na Roménia, em Portugal, e na generalidade dos países: o modo actual de fazer televisão. O sensacionalismo, o objectivo de dar a notícia primeiro que a concorrência (mesmo que depois venha a ser desmentida) e ainda que isso envolva violações de privacidade, perigos para a integridade física dos repórteres e até o não cumprimento dos seus deveres deontológicos.
O filme começa com a deslocação de um jornalista e de um operador de imagem a uma fábrica em que ocorreu uma explosão. Os homens da TV conseguem chegar antes da polícia e movimentam-se com toda a liberdade. Quando começam a gravar dá-se um segundo acidente, a estrutura desaba e o homem da câmara é atingido mortalmente. A partir desse momento o objectivo do canal de televisão passa a ser outro: a exploração mediática da morte de um dos seus. O jornalista que escapou ao acidente tem agora como tarefa realizar um conjunto de entrevistas sobre o colega e fazer a cobertura do funeral. Só que se vê confrontado com a decisão de não colaboração por parte da família, e em particular da filha.
O jornalista inicia então um processo de aproximação e persuasão à jovem rapariga mas não escapa às dúvidas, deontológicas e outras, que a sua própria consciência lhe coloca. Breaking News é um filme que demostra alguma vitalidade do cinema romeno e a sua capacidade para abordar problemas actuais que são comuns a muitas outras geografias.
The Cakemaker
Um filme israelita pouco ortodoxo. Co-produção israelo-alemã, dirigida por Ofir Raul Graizer, The Cakemaker é a história de um pasteleiro berlinense que se apaixona por um homem israelita, casado e com um filho, que se desloca frequentemente à Alemanha em trabalho e que morre pouco tempo depois. O alemão vai então para Israel procurar a família e o passado do seu amado e acaba por estabelecer uma relação com a viúva. O filme tem como principal mérito o questionamento, em vários planos, do controlo exercido pela comunidade israelita mais ortodoxa. E fá-lo de uma forma simples e despretensiosa.
Križácek
Križácek / Little Cruasader é um filme checo realizado por Václav Kadrnka que contou com o apoio da região italiana da Sardenha. Tal apoio é justificado pelo facto de o tema da película – um cavaleiro que procura o seu filho desaparecido –, estar ambientado numa cruzada do início do século XIII que culminou com numa tragédia numa ilha da Sardenha. Križácek / Little Cruasader é uma obra de grande rigor estético e beleza formal mas com uma narrativa pouco fluente que provocou o desinteresse e o tédio na maior parte dos espectadores. Um filme interessante mas não para a secção competitiva de um festival desta natureza.
Keep the change
A presença norte-americana. De há alguns anos a esta parte a presença norte-americana na selecção de Karlovy Varz tem vindo a ser assegurada por filmes do chamado cinema independente. Desta vez, tivemos Keep the change, realizado por Rachel Israel que conta, num registo de comédia romântica, a ligação que se estabelece entre um casal de jovens autistas que frequentam sessões de terapia de grupo. Um filme apenas simpático.
Birds Are Singing in Kigali
Uma ruandesa na Polónia. A polaca Joanna Kos-Krauze trouxe ao festival este filme co-realizado com o marido, Krzysztofy Krauze falecido em 2014. A trama tem duas histórias que se entrecruzam. A de uma ornitóloga polaca, Anna, que desenvolve trabalho no Ruanda e a de uma jovem ruandesa, Claudine, filha de um cientista daquele país, que foge para a Polónia aquando do ataque dos Hutus aos Tutsis. A vida da jovem africana na Europa, primeiro num centro de acolhimento e depois em casa de Anna, e o seu desejo, finalmente concretizado, regresso à sua pátria africana para enterrar os seus mortos. Uma obra interessante mas que padece do mal de ser demasiado longa, não obstante a forma competente como é realizada.
Ralang Road
Um filme indiano para fechar. A exibição dos filmes em competição terminou com Rolang Road, um trabalho do indiano Karma Takapa. Numa pequena cidade de montanha dos Himalaias assistimos a uma história protagonizada por quatro indivíduos que levam o espectador a descobrir um labiríntico microcosmos social. Uma série de eventos aparentemente desconexos acabam por relacionar-se devido a várias coincidências. Com uma narrativa pouco comum, filmado com câmara à mão, Rolang Road é um filme pouco convencional, tanto na trama como na construção, e provocou por isso uma debandada quase generalizada dos espectadores.
E pronto, resta esperar pelas decisões do júri oficial do Festival.