Poema de João de Almeida Santos
para um “Encontro ao Entardecer”.
TEUS OLHOS…
Chegaste
Só,
Rápida,
Como deusa
Ao meu Jardim
Com asas
Nos olhos
Para me levar
A um horizonte
Que já não tem
Fim…
Vi-te chegar
Anunciada
E trazida
Por mistério…
……………….
Acenei-te
De bem longe
Ao pé da arte
Ou da minha
Perdição,
Onde esperava
Por ti,
Ao entardecer,
Abraçado
À solidão…
Olhei-te
Nos olhos,
Eram âmbar,
Eram mel…
A luz desse dia
Dava beleza
Ao teu rosto
E a um olhar
Onde me perdia…
A luz morna
Dessa tarde
Ofereceu
Dádiva rara,
A cor
Desse nosso
Entardecer,
Suave sopro
Na seara
Do teu rosto
De seda fina
Belo e macio
Em repouso
Na minha ara!
Chegaste só,
Leve e radiante!
Tudo em ti
É belo,
Quando te deixas
Ir,
Serena
E distante
Da fria rotina
E segues o rumo
Que a beleza
Te traça
E te destina…
Caminhámos
Lado a lado,
Medindo palavras,
Uma a uma,
Encantado
De alcançar
Tanta beleza
E elegante
Firmeza
No caminho
De Atena,
Nossa deusa!
Olhei
Com calculada
Timidez
O teu rosto
Iluminado,
Brilhante,
Imaculado,
Caminhando,
Ombro a ombro,
Lado a lado,
Cúmplice,
Na invídia,
De inocente
Pecado…
“ – Estás moderno,
Meu amigo!”
Disseste, com
Malicioso sorriso,
Seguro porto
De abrigo
De que tanto
Eu preciso…
Senti-me
Em lugar
De culto,
E vi-te leve
Como traço
De artista
Em aguarela,
Solene como
Divindade,
Suave e doce
Como mulher
Apaixonada
Em terna
E já madura
Idade…
Visitámos
Imensa beleza,
Mil quadros
De intensa luz
E vi teu rosto
Em contraponto,
Esse perfil
Que há muito
Me seduz,
Tuas cores em
Fascinante
Sinfonia…
……………..
Era assim
Que na morna
Tarde desse dia,
Encantado,
Eu já te via!
Senti-me subir
Ao céu,
Privilégio
Imerecido,
Espanto de
De te ter ali,
A meu lado,
E me sentir
Docemente
Perdido…
Vejo-te,
Sim,
Às vezes,
De semblante
Carregado,
Sulcos no rosto,
Recolhida
Num silêncio
Ecoado,
Dias cinzentos
Se a beleza
Te deixa órfã
Por momentos!
Chegaste só,
Nesse dia,
Feliz
E radiante
A transbordar
De luz
E alegria!
Li-te na alma
Com o olhar,
Respirei contigo
O mesmo ar,
Revi-te em sonho
Para crer
Naquilo que
Eu já sentia…
…………………………
Nesse entardecer!
Quando te vejo,
Assim,
Nestes dias
De leveza,
Podia dizer
Que te amo,
Que te abraço
No olhar,
Que te beijo
Na alma
P’ra melhor
Te abraçar,
Que te digo
O que não ouso,
Ao sabor
Do vento,
Em cada
Amanhecer
E que acordo
Sempre
Ao relento
Sob o céu
A descoberto
Para logo,
Bem cedo,
Ao lusco-fusco,
Eu te ter…
Mas regressámos!
Fiquei
A teu lado
Escassos momentos,
Olhei-te
Dez vezes
Num movimento
Sem fim,
Repeti
O teu nome,
Olhaste p’ra mim,
Perdi-me do mundo,
Levei-te ao jardim,
Colhi duas rosas,
Respirei bem fundo
Um acre aroma
Me inebriou,
Beijei-te no rosto
Meu peito parou…
Mas logo partiste,
Sozinha a voar
Ainda mais bela,
Comigo a sonhar,
Teus olhos
De mel,
Teu rosto sereno
E sempre feliz,
De alma bem cheia
Um rosto de deusa
Como sempre te quis…
……………………………
Até que o teu nome
Comigo partisse
P’ra este poema
Onde te recebi
Com estas palavras
Que nunca te disse
Mas que te ofereço
No que escrevi!
Ilustração: Gustav Klimt – “Dame mit Muff”, 1916.
Oil on canvas.