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Segunda-feira, Dezembro 23, 2024

Nikias Skapinakis

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1931 – 2020)

Nikias. (Quase não é preciso dizer Skapinakis: Nikias basta para o identificar). Prestigiado artista plástico – um dos artistas mais significativos da segunda metade do século XX em Portugal – além da pintura a óleo, como actividade dominante, dedicou-se também à litografia, à serigrafia e à ilustração de livros. Antifascista desde a juventude, militou no MUD Juvenil e foi candidato da Oposição Democrática durante a Ditadura, nas eleições para a Assembleia Nacional em 1957 e em 1961.

Faleceu a 26 de Agosto de 2020.

Esteve preso em 1962, na cadeia do Aljube[1]. Em 1961, em representação da “Seara Nova”, participou na elaboração do «Programa para a Democratização da República», um programa comum da oposição, elaborado sob a inspiração de Jaime Cortesão e Mário de Azevedo Gomes.

O artista

Nikias Skapinakis, filho de pai grego e mãe portuguesa, nasceu em Lisboa, em 1931, e vive e trabalha nesta cidade. Ao mesmo tempo que frequentava o liceu, Nikias estudou pintura e desenho nos cursos da Sociedade Nacional de Belas-Artes (SNBA). Após a conclusão do liceu, deu continuidade aos estudos artísticos inscrevendo-se no curso de Arquitectura da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa (ESBAL). Contudo, passados três anos, Nikias teve de desistir da formação académica, já que seria expulso da Escola (com outros alunos) na sequência de um processo académico de natureza política. Esta expulsão veio, no entanto, reforçar uma decisão que já tinha tomado – a de não mais entrar como aluno na ESBASL. Para além de se sentir sem vocação para a Arquitectura, considerava que o ensino académico praticado em Lisboa era obsoleto e conservador. Deste modo, ao mesmo tempo que sentia o apelo da pintura, tornava-se, voluntariamente, autodidacta.

Dedicou se à pintura de uma forma regular expondo pela primeira vez em 1948, nas Exposições Gerais de Artes Plásticas[2] e, desde então, realizou diversas exposições individuais e participou em numerosas colectivas em Portugal e no estrangeiro.

A obra

Partindo de uma figuração lírica, que assimilou dados da modernidade figurativa do início do século, muito cedo a sua pintura revelou uma capacidade interpretativa do quotidiano lisboeta. As cores saturadas do final da década de 1950 antecipam uma viragem que conjuga uma mais plena assimilação da bidimensionalidade modernista com a linguagem popular dos cartazes e posters que invadem a vida de um novo mundo. A colagem e, sobretudo, o recorte vão despoletar vastas possibilidades neste domínio. Uma vez mais a sua capacidade interpretativa se manifesta e é então o contexto cultural português, com a melancolia que o atravessa, o objeto da sua pintura. A revisitação dos géneros tradicionais, como a natureza-morta ou a pintura de história, opera uma profunda reconfiguração destes, como também as peculiares abstrações que realiza se definem ambíguas e inesperadamente tomadas de um sentido do real. A recetividade à diversidade e inventividade das linguagens gráficas ou populares continuará a assolar a sua pintura e novos cartazes, tags, entre muitas outras referências, continuarão a estruturar as suas séries em anos mais recentes.»[3] 

Realizou diversas exposições individuais e participou em numerosas colectivas em Portugal e no estrangeiro.

Além da pintura a óleo, como actividade dominante, dedicou-se à litografia, à serigrafia e à ilustração de livros. Entre outras obras, ilustrou Quando os Lobos Uivam, de Aquilino Ribeiro (Livraria Bertrand, 1958) e Andamento Holandês, de Vitorino Nemésio (Imprensa Nacional, 1983). Executou litografias para o Congresso de Psicanálise de Línguas Românicas (1968) e para o Cinquentenário do Banco Português do Atlântico (1969). Executou serigrafias para Kompass (1973).

Nikas Skapinakis, fotografado no restaurante Gambrinus junto de uma pintura sua (Geometria Variável), passará a estar representado no Museu da Guarda (Ipsilon, 30/05/2018)

É autor de um dos painéis do Café “A Brasileira do Chiado” (1971) e, em 1974, participou, com vários outros grandes artistas plásticos solidários com a Revolução de Abril, na execução de um painel comemorativo do 10 de Junho.

Sobre a sua vida e obra

Nikias afirmou em entrevista: A minha actividade política, legal e subversiva, na época, emprestava-me uma motivação que influenciou a minha capacidade de resistência ao ambiente que defrontava. De resto, não creio que de outra maneira pudesse ter pintado os retratos colectivos dos “Caminhos da Liberdade” e da “Melancolia em Portugal. (…) “O Teatro dos Outros”, filme de Jorge Silva Melo sobre o meu trabalho, documenta com fotografias, quadros, filmes, de diversos autores meus contemporâneos, esse tempo do negrume português. A sequência fílmica que mostra Lisboa, a preto e branco, nas fotografias de Sena da Silva, Carlos Calvet, Gérard Castello Lopes, Victor Palla, culminando nas cenas de Fernando Lopes, que evocam as noites quentes do Hot Clube; [“Belarmino”], remete-nos para um tempo do qual já não há referências. As pessoas subiam e desciam o Chiado, vestidas de escuro, a cidade era triste, os entretenimentos parcos e vigiados. É uma apagada tristeza o que se conta nessa reportagem breve, por assim dizer, sociológica. E creio que dá uma nova luz às minhas desoladas paisagens e aos meus entediados, ensimesmados, modelos.»

Em 1963 obteve a Bolsa Malhoa da Sociedade Nacional de Belas-Artes. Em 1976-1977 foi-lhe concedido um subsídio para investigação pela Fundação Calouste Gulbenkian. Em 1985, o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian mostrou uma exposição antológica da sua pintura, completada com uma retrospectiva da obra gráfica e guaches na Sociedade Nacional de Belas-Artes. Em 1993 apresentou no Palácio Galveias (C.M.L.) uma antologia de desenhos realizados a partir de 1985.

Em 1996, o Museu de Arte Contemporânea do Chiado realizou uma retrospectiva de retratos (1955-74).

Em 2000, o Museu de Arte Moderna da Fundação de Serralves apresentou a exposição antológica “Prospectiva”, que reuniu pintura e desenho entre 1966 e 2000. Em 2005 realizou um painel em cerâmica para o Metropolitano de Lisboa. No ano seguinte, a Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva apresentou a série de pinturas “Quartos Imaginários” relativa a quartos de dormir e a ateliês de diversos pintores e poetas.

Em 2006, a Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva apresentou a série de pinturas Quartos Imaginários baseada nos quartos de dormir e ateliers de diversos pintores e poetas ( Prémio de Arte Casino da Póvoa).

Em 2007 foi realizado para a televisão, “Nikias Skapinakis: O Teatro dos Outros”, um documentário realizado por Jorge Silva Melo sobre o conjunto da sua obra.

Em 2009, realizou no Centro Cultural de Cascais a exposição “Desenho a preto e branco e a cores”, abrangendo a sua obra gráfica entre 1958 e 2009[4].

Realizou a pintura “Paisagem-Bandeira Portuguesa” alusiva à Bandeira Nacional e integrada nas Comemorações do Centenário da República (2010).

“Presente e Passado, 2012-1950”

Museu Colecção Berardo, Exposição antológica “Presente e Passado, 2012-1950”, em 2012. (Fotografia de David Rato)

Em 2012, o Museu Colecção Berardo apresentou a exposição antológica “Presente e Passado, 2012-1950″. Organizada em seis núcleos, que mostraram a diversidade da sua obra: O Ponto Metafísico. 2012-1954; A Pintura Mirabolante. 2010-1994; Monocromatismo e Recuperação da Cor. 2000-1989; Parafiguração e Paisagens do Vale dos Reis. 1987-1966; Pessoas, Ninfas, Bichos, Manequins e Frutos. 2002-1960; Expressionismo Presencista. 1965-1950; Desenho. 2009-1958. .

Tem publicado textos de intervenção crítica em diversos jornais e revistas

Alguns prémios e distinções

  • Em 1990 foi-lhe atribuído o prémio Aica/Sec, instituído pela Associação Internacional de Críticos de Arte e a Secretaria de Estado da Cultura.
  • No ano de 2005 recebeu o Grande Prémio Amadeo de Souza Cardoso, instituído pela Câmara Municipal de Amarante.
  • Em 2006, foi-lhe atribuído o primeiro prémio do Casino da Póvoa de Varzim.
  • Em 2006, no dia de Portugal, foi-lhe atribuída a Ordem de Santiago de Espada (Grande Oficial).

Quintais de Lisboa (1956)

 

Da exposição Presente e Passado (2012-1950) no Museu Colecção Berardo, 2012.

 

Delacroix no 25 de Abril em Atenas, 1975.

 

1978, Papel – Serigrafia. Museu Calouste Gulbenkian

 

Paisagem da Trafaria (1955)

 

[1] Partilhou a cela com José Medeiros Ferreira e o nacionalista angolano Joaquim Pinto de Andrade.

[2] As exposições integravam-se numa acção política de oposição ao regime salazarista. Estas mostras, que ocorreram na Sociedade Nacional de Belas Artes, foram decisivas para a afirmação das correntes artísticas portuguesas do pós-guerra, marcando um momento importante de afirmação das artes no domínio político-social. Realizaram-se 10 edições em anos consecutivos (exceptuando 1952, ano em que a SNBA esteve encerrada pela PIDE). Organizada anonimamente pela Subcomissão dos Artistas Plásticos da Comissão dos Jornalistas, Escritores e Artistas do Movimento de Unidade Democrática (MUD), a primeira exposição abriu em Julho de 1946 na Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA), Lisboa. Com 93 participantes, entre novos e consagrados, pintores, escultores, arquitectos e gráficos, teve acolhimento favorável nos jornais.

[3] Há um lirismo em alguns dos seus retratos, sobretudo femininos, dos longínquos anos 50 e 60, e um registo diferente quando pintava paisagens, no mesmo período, com uma abordagem expressionista. É verdade que recorro a uma certa variedade de linguagens. Elas respeitam sobretudo à expressão e não às modalidades técnicas. Como a minha obra acabou por se tornar extensa, tenho uma imperiosa necessidade de mudar, não direi de vida, mas de estilo, se este termo ainda significa alguma coisa. Evito cansar-me de mim mesmo praticando maneiras opostas, partindo de uma fase para o seu contraditório e, às vezes, praticando-as ao mesmo tempo. Enfim, se Pessoa tinha tantos heterónimos… Mas, de facto, não sou escritor, nunca o fui, embora nos anos 50 e 60 tenha feito parte das redacções da “Revista de Arquitectura” e da “Seara Nova”. A pintura e o estudo da sua história constituem, ainda, o meu ponto de partida. Não tenho outro.»

[4] A minha prisão, em 1962, não teve qualquer consequência no meu processo artístico. Todavia, em 2000, pintei dois quadros (“Paisagem Entrevista” e “As Grades”), acentuadamente monocromáticos, onde reconheci, a posteriori, o ambiente opressivo do Aljube»

Dados biográficos:


Actualização a 27 de Agosto de 2020, quando da sua morte. Publicado inicialmente a 3 de Junho de 2018.


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