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Sexta-feira, Dezembro 27, 2024

Neuromarketing e como o cérebro toma decisões

José Alberto Pereira
José Alberto Pereira
Professor Universitário, Formador Consultor e Mestre em Gestão

 “And the zen master says, we’ll see.”
(Philip Seymour Hoffman in “Charlie Wilson’s War”, 2007)

Neurociência

Segundo o Merriam-Webster Diccionary (2018), “a neurociência é um ramo das ciências da vida que lida com a anatomia, fisiologia, bioquímica ou biologia molecular dos nervos e tecidos nervosos e, especialmente, com a sua relação com o comportamento e a aprendizagem”. Desta definição destacam-se dois aspetos importantes: a integração multidisciplinar que suporta a neurociência e a sua relação com o comportamento e a aprendizagem. Estes aspetos são determinantes na interação da neurociência com as ciências sociais, nomeadamente daquelas que focam no estímulo de comportamentos (como a psicologia, a comunicação ou o marketing).

Para a neurociência todas as experiências humanas são experiências cerebrais, na medida em que é este órgão que nos permite sentir, entender, estruturar e até somatizar estas experiências. Nesta lista está aquilo que somos, a nossa personalidade, do que gostamos ou não gostamos, o que amamos ou detestamos, bem como todas a emoções e sentimentos subjacentes. Todas estas experiências são indutoras de comportamentos e por isso relevantes em termos sociais.

Na base da forma como o nosso cérebro nos induz comportamentos está a cognição[1], que podemos dividir em 2 tipologias:

  • A cognição fria, que se refere ao raciocínio em condições de reduzida tensão (emoções, stress).
  • A cognição quente, que se refere ao raciocínio em condições de elevada tensão (emoções, excitação), na qual se verifica um conflito entre risco e recompensa.

Se tomarmos uma decisão fria (por exemplo, quantos passos vão ser necessários para resolver um determinado problema) a rede neural que vai ser ativada no cérebro inclui a área dorsolateral do córtex pré-frontal. Mas se tomarmos uma decisão arriscada, baseada numa cognição quente, os circuitos neurais do cérebro que vão ser ativados incluem o córtex frontal orbital do córtex frontal.

Verificamos desta forma que, se conseguirmos entender a forma como o nosso cérebro funciona, conseguiremos ajustar o seu comportamento de forma a facilitar o modo como vemos o mundo. Esta realidade é válida para a maioria dos seres humanos e permite induzir comportamentos de compra, direcionando o esforço de marketing para os impulsos que estimulam esses comportamentos.

Conforme refere Gerald Zaltman (2003), 95% do nosso processo de decisão ocorre a um nível não-consciente. Assim, têm sido efetuados testes sobre autocontrolo na tomada de decisão com base nas tipologias apresentadas, tendo como ferramenta a ressonância magnética funcional (fMRI). As conclusões têm mostrado que:

  • As decisões orientadas para objetivos assentam num sinal de valor comum codificado no córtex pré-frontal ventromedial; e
  • O exercício do autocontrolo envolve a modulação deste sinal de valor no córtex pré-frontal dorsolateral.

Isto significa que existem eventos que pelo facto de serem únicos, mesmo que artificiais, o nosso cérebro identifica como ligados a um determinado contexto (ou marca). Tal é, por exemplo, o som no arranque de uma Harley-Davidson ou o “ronronar” do motor de um Ford Mustang Shelby, semelhante ao que Steve McQueen conduzia em “Bullit”.

Controlar o comportamento para tomar as melhores decisões é frequentemente associado à capacidade de amortecer os circuitos emocionais (mesmo quando uma decisão não parece mais lógica do que emocional). De acordo com o Marshmellow Experiment, realizado nos anos 60 por Walter Mischel (Mischel et al, 1972), a nossa capacidade para gerir decisões é inata mas pode ser otimizada ao longo da vida.

Subjacente a estes estímulos e sinais, o sistema nervoso é uma rede de comunicações do organismo, formada por um conjunto de órgãos do corpo humano que tem a função de captar as mensagens e estímulos do ambiente, interpretá-los e arquivá-los, para depois elaborar respostas, que podem ser dadas na forma de movimentos ou sensações. O sistema nervoso inclui o cérebro, medula espinal, órgãos sensoriais e todos os nervos que ligam estes órgãos ao resto do corpo, podendo ser repartido em:

  • Sistema nervoso central, que inclui o cérebro (quatro lóbulos, dois hemisférios e o corpus callostrum); e
  • Sistema nervoso periférico, que liga o sistema nervoso central a todo o corpo, através de fibras (nervos) e gânglios, incluindo:
  • O sistema nervoso autónomo, cujos sinais são relativamente lentos e quase sempre automáticos (transpiração, batimento cardíaco, respiração, dilatação da pupila).
  • O sistema nervoso somático, cujos sinais são muito mais rápidos e possuem controle voluntário parcial (expressões faciais, movimentos oculares, piscadas e respostas comportamentais).

Segundo o Merriam-Webster Diccionary (2018), podemos definir emoção como “uma reação mental consciente experimentada subjetivamente como um sentimento forte geralmente direcionado a um objeto específico e tipicamente acompanhado por mudanças fisiológicas e comportamentais no corpo”. Por outras palavras, emoções são estados de espírito que resultam em mudanças físicas e fisiológicas, que influenciam o comportamento e estão associadas a padrões de atividade fisiológica.

Neste âmbito, a economia comportamental estuda os efeitos dos fatores psicológicos, sociais, cognitivos e emocionais nas decisões económicas de indivíduos e instituições. Numa dinâmica de gestão comercial, a economia comportamental abre a porta ao neuromarketing.

Neuromarketing

Podemos considerar o neuromarketing como o uso da neurociência no marketing e na publicidade. O neuromarketing tem por objeto o comportamento do consumidor e a influência que este sofre através da sua atividade cerebral, pois os estímulos sensoriais são benéficos em termos de memória e predisposição à compra. Podemos considerar como objetivos do neuromarketing:

  • Entender o consumidor e as suas decisões de compra (a nível neurológico);
  • Entender como o cérebro do consumidor reage a estímulos;
  • Analisar estas reações e adequar a abordagem de marketing para maximizar o impacto; e
  • Criar um ambiente de marca assente no envolvimento multissensorial do consumidor.

Para alcançar os seus objetivos o neuromarketing utiliza diversas ferramentas da esfera dos meios de diagnóstico médico, que visam estudar reações do cérebro a estímulos que possam induzir comportamentos de compra. Podemos considerar como principais ferramentas de neuromarketing as seguintes:

  • Eletroencefalograma;
  • Ressonância magnética funcional (fMRI);
  • Tomografia PET;
  • Eye tracking;
  • Reconhecimento facial e micro-expressões (FACS);
  • Dados biométricos (transpiração, batimento cardíaco, respiração, dilatação da pupila).

A transformação digital oferece-nos em número crescente as ferramentas para tornar a experiência do consumidor como algo inolvidável, potenciador de fidelização numa perspetiva duradoura. Em termos visuais ou físicos, a transformação digital permite-nos implementar estratégias centradas no cliente, alavancadas pela robusta capacidade de cálculo disponível e assentes no tratamento de poderosas bases de dados. A este nível, o neuromarketing surge como uma ferramenta incontornável para focar o esforço de marketing no consumidor, entender a sua estrutura cognitiva e reforçar os estímulos que tornam a sua viagem no consumo única e altamente satisfatória.

  • BARRETO, A (2013), Do users look at banner ads on Facebook? Journal of Research in Interactive Marketing, Vol. 7, Nº 2, pp. 119-139.
  • BARRETO, A (2017), Application of facial expression studies on the field of marketing. in A. Freitas-Magalhães (Ed.), Emotional expression: The brain and the face (Vol.9, pp. 163-189). FEE Lab Science Books, Porto.
  • BARRETO, A (2018), Neuromarketing and How the Brain Affect Decisions, Universidade Nova, Lisboa
  • Merriam-Webster Diccionary (2018), Definition of emotion, consultado a 13.05.2018 em emotion.
  • Merriam-Webster Diccionary (2018), Definition of neuroscience, consultado a 13.05.2018 em neuroscience.
  • MISCHEL, W, EBBESEN, E, ZEISS, A (1972), Cognitive and Attencional Mechanisms in Delay of Gratifications, Journal of Personality and Social Psychology, Vol 21, Nº 2, 204-218
  • ZALTMAN, G (2018), Afinal o que os clientes querem, Campus, Rio de Janeiro.

 

[1]  Cognição é a forma como o cérebro percebe, aprende, recorda e pensa sobre toda informação captada através dos 5 sentidos (Wikipédia, consultada a 13.05.2018 em Cognição)

Por opção do autor, este artigo respeita o AO90

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