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João de Sousa

Domingo, Setembro 1, 2024

Que prioridades na cooperação Lusófona?

Delmar Gonçalves, de Moçambique
Delmar Gonçalves, de Moçambique
De Quelimane, República de Moçambique. Presidente do Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora (CEMD) e Coordenador Literário da Editorial Minerva. Venceu o Prémio de Literatura Juvenil Ferreira de Castro em 1987; o Galardão África Today em 2006; e o Prémio Lusofonia 2017.

Um breve contributo

 

Em quantas partes se vive um Grito?
Em quantos corações se parte a terra?
Em quantos olhos se come o sol?
E em quantos pães se mata um sonho?

O que significa neste mundo o miolo de um pão obsceno às metades na mesa de seis bocas?
E em quantas partes se
morde um bife de nervo
até ao delírio do osso no
espaço tenro do mundo?
E neste poema em quantos trapos se esconde o rei da fome de cada um e levanta a cabeça o preciso verso da fome de cada Lei?”

Só a Educação e a Cooperação  podem  Responder!

A situação da educação melhorou muito nas últimas décadas na América Latina e na Ásia Oriental, onde os objectivos fixados pela UNESCO, há vinte anos atrás, de garantir o ensino básico  primário a todos foi atingido na quase totalidade, mas continua, pelo contrário, a ser preocupante na África Subsahariana, onde a melhoria  foi de apenas 6% em 10 anos, passando a escolarização de 54% para 60%. O que quer dizer que 40% das crianças africanas em idade escolar não têm ainda acesso ao ensino básico primário. A questão da educação em África continua, portanto, a ser um motivo de preocupação para os governos, mas sobretudo para as famílias e para as crianças e jovens que vêm assim o seu futuro comprometido, pois, sem educação, não há desenvolvimento. Mas nós sabemos também como dá jeito para alguns (normalmente uma minoria) que a ignorância e a dependência se perpetuem.

Um dos valores mais urgentes reclamados pela História Universal actual é a Tolerância. Num universo que se unifica, o encontro das diversidades pode ser mortífero, se estas não se compuserem no sentido de mutuamente se enriquecerem com as suas diferenças. Só a educação pode operar este milagre. A tolerância deveria ser o reconhecimento do outro, a coexistência, o apreço, o acolhimento e a tentativa de uma permuta permanentemente criativa e criadora. Que só encontra limites face ao intolerável.

A tolerância, aspiração do espírito humano tantas vezes sufocada, desvirtuada, desfigurada, desviada com todas as formas do intolerável, num conflito maior de força e de direito. A resolução desse conflito só poderá advir de um acréscimo de lucidez, de dignidade e de solidariedade finalmente conquistadas e não apenas de uma solidariedade ou caridade ambíguas ou de uma indiferença cínica. Como dizia Paulo Freire, ”Quem inaugura a negação dos homens não são os que tiveram a sua humanidade negada, mas os que a negaram negando também a sua.”

Com uma cooperação educativa centrada em experiências inovadoras e nas decisões e responsabilidades, baseada em experiências respeitadoras da liberdade, ao fazê-lo estaremos a contribuir para duradouros processos autonómicos. Nós acreditamos que ninguém é autónomo e diferente, primeiro, para depois decidir com clareza e clarividência. A autonomia vai-se constituindo na experiência de várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas. Só assim construiremos o futuro na inclusão, no pressuposto de que a verdadeira liberdade se desenvolve e amadurece no confronto com outras liberdades.Para que tal suceda é necessário o espírito crítico e autocrítico que se adquire na educação.

O hábito do diálogo universalista permanente na diferença é algo primordial no encontro/reencontro dos homens para a sua verdadeira humanização. A coexistência harmoniosa pressupõe uma relação entre seres diferentes ou não, uma relação que é concomitante com o aparecimento dos seres, harmoniosa ou não. E a cultura de cidadania é aquela que defende e respeita o direito a ser diferente, é aquela que é sempre inclusiva e que apresenta e possui características interculturais.

Perante os quase imprevisíveis e, por vezes, dificilmente controláveis dinamismos que conjunturalmente parecem perspectivar o futuro, assistimos anestesiados ao desmoronar de ideais e de esforços colectivos no sentido de preservar valores até há bem pouco óbvios, alguns dos quais decisivos para o relacionamento e a interdependência entre povos aparentemente ligados pela história, pela língua e, mesmo, por parentescos.

Só aceitando, sem compromissos os erros, as qualidades, os defeitos e as diferenças dos seres humanos dentro deste espaço geoestratégico alicerçado na Língua e na História, é possível escapar à lamentação estéril dum passado sem remissão e entrever com propriedade os caminhos difíceis e inexplorados, duma interdependência cultural desejável, mas mais abrangente e activa, impedindo que seja letra morta. Podem pois criticar-se o passado (que existiu), os rumos que a história tomou, a incapacidade ou teimosia que levaram e levam os homens do poder a persistirem em erros desde sempre conhecidos e reconhecidos.Temos no entanto de aceitar que foi essa história comum que nos foi legada e que nos faz agora caminhar irremediavelmente juntos na aventura da construção (ou desconstrução conjunta) e reconstrução de um mundo marcado por um destino comum e universal, para além de todas as barreiras e diferenças. A vida não devia nem deve funcionar segundo a lógica da exclusão.

O princípio AB UNO DISCE OMNES não é aceitável, não somos vazos prontos a ser eternamente esvaziados. Como dizia o grande RABINDRANATH TAGORE “A vida renovada volta sempre a esse frágil vaso tantas e tantas vezes esvaziado, o tempo passa e tu continuas a fluir e há sempre espaço para receber as suas dádivas. ”Há compromissos que devem ser assumidos e escrupulosamente respeitados. A Educação é o maior deles. Uma educação para o desenvolvimento e solidariedade entendida esta última como prática de informação e conscientização para a formação de uma mentalidade nova, mais aberta, dinâmica, universalista e solidária. Para que tal se concretize é preciso coragem, ousadia e inconformismo, num momento em que as nossas sociedades integram uma pluralidade cada vez maior de pessoas de proveniências culturais, religiosas e até linguísticas. O certo é que colhemos sempre o que plantamos.

Porque ensinar, aprender e partilhar dentro do espaço da CPLP exigem disponibilidade para o diálogo, o diálogo genuíno permite-nos aprender a compreender, aprender a aprender e reaprender, aprender a respeitar, aprender a lidar e respeitar com as diferenças, aprender a saber ouvir, aprender a ser coerentes entre o que dizemos e fazemos, aprender as virtudes e a importância de saber escutar pacientemente. Há mais de dois mil anos, LÚCIO SÉNECA terá dito “nenhum vento será favorável a quem não saiba a que porto se dirige”. Será! Mas o caminho da Cooperação, da educação, da fraternidade, da união e da Luta permanente para a superação e autosuperação facilmente farão que o vento nos ajude. E é nesta óptica de clara fertilização por via da cooperação e partilha na educação que se encontrarão bons modelos de coexistência harmoniosa descomplexada rumo ao FUTURO!

Meus irmãos da CPLP:

Tudo começou aqui
Minha alma de Poeta
Minha aura de Africano
Minha alma Mestiça
Incolor
de negro e branco feita adição
Descobri acenos da europa no Africano que sou
e visões de áfrica no Mestiço que mora em mim
Que jamais recusará
os glóbulos caucasóides
e negróides que coabitam em mim
Orgulhoso que sou
do meu sangue Luso-Africano
das heranças de Bragança e Chuabo
para a eternidade”.

Por isso, pretendo tão só que seja este texto a ser ouvido, compreendido, devorado e não o Poeta que o escreve, como os meus irmãos MAKONDES que sabem a aura de mistério e segredo que rodeia a preparação das máscaras e da dança propriamente dita, e consideram importante que não se conheça a identidade do dançarino. Oxalá então que sejam muitos os que querem ficar no e com este texto no coração e na mente. E só nessa altura fique eu calado como um um enorme pássaro Xirico sentado aos pés de uma pedra, a entrar decididamente pelo ar dentro das pessoas!

 

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