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Domingo, Dezembro 22, 2024

A máquina de guerra iraniana contra o Ocidente

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

O clero iraniano, que controla o Irão há quase quatro décadas, conseguiu juntar à sua tradicional capacidade de manipulação da informação ambas as tradições dos serviços secretos ocidentais e soviéticos, reconvertendo o aparelho dos serviços secretos do Xá, a SAVAK, e juntando-lhe a tradição dos do KGB, através da sua cooperação inicial com o partido comunista local Tudeh, antes de o extinguir.

  1. “Acção coordenada inautêntica”

Criando um novo termo típico do “newspeak” contemporâneo, “acção coordenada inautêntica” socialmente correcto, eufemístico e tortuoso, o Facebook – seguido de outras redes sociais – procedeu finalmente à desmontagem de centenas de “páginas fantasma” das suas redes sociais geridas pelas autoridades iranianas, algumas, como tornou público, datando de 2011, ou seja, que estiveram em serviço sem ser incomodadas durante pelo menos sete anos.

O mundo informativo tinha até aqui agido na presunção de que a Rússia era quase exclusivamente a única potência mundial que procedia à manipulação industrial da informação pública, quando era notório que o Irão é o principal protagonista nessa matéria.

Pela longevidade, pelo número e pela diversidade das formas assumidas pelas centrais de desinformação agora desmontadas, ficou claro que o Irão ultrapassa a Rússia nesta matéria, ficando também claro que os métodos das agências de ambos os países são semelhantes mas a acção não é necessariamente coordenada entre os dois países, embora seja esse o caso da guerra da Síria.

O clero iraniano, que controla o Irão há quase quatro décadas, conseguiu juntar à sua tradicional capacidade de manipulação da informação ambas as tradições dos serviços secretos ocidentais e soviéticos, reconvertendo o aparelho dos serviços secretos do Xá, a SAVAK, e juntando-lhe a tradição dos do KGB, através da sua cooperação inicial com o partido comunista local Tudeh, antes de o extinguir.

Durante estas décadas, as autoridades iranianas não mudaram essencialmente de táctica, juntando à violência organizada – de assassinatos dirigidos até à formação de verdadeiros exércitos paralelos como o faz no Líbano, Iraque, Síria e Iémen – a uma poderosa guerra de informação assente na compra de intelectuais, jornalistas e políticos e numa máquina sofisticada de desinformação que prossegue objectivos gerais de desestabilização e de expansionismo e específicos de destruição dos seus inimigos.

As redes sociais são apenas mais um palco onde as autoridades iranianas desenvolvem a sua política de desinformação. As ligações entre a principal central agora identificada, a “Liberty Front Press”, e vários jornais e fundações onde se apoiou o esforço de propaganda pelo acordo nuclear com o Irão, por exemplo, são por demais evidentes.

Por outro lado, não é possível separar a “guerra de informação” dos outros instrumentos de guerra que passam pela violência, como seja o terrorismo.

  1. O atentado terrorista de 30 de Junho

No dia 30 de Junho, as autoridades policiais alemãs, belgas e francesas desmontaram um atentado terrorista preparado pelas autoridades iranianas para Paris por ocasião da maior reunião anual da oposição iraniana. O atentado foi coordenado por um diplomata iraniano colocado na Áustria, contava com uma célula de apoio em Paris e foi protagonizado por dois iranianos residentes na Bélgica.

O atentado estava coordenado com uma campanha de desinformação que pretendia culpar as vítimas pelo atentado, apresentando os dois autores executantes como “dissidentes” da oposição iraniana, argumento que é de resto recorrente na actividade terrorista de Teerão. Esse mesmo argumento foi publicamente sugerido pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano e repetido pela imprensa europeia que costuma reproduzir o argumentário de Teerão.

Que as autoridades iranianas e os seus papagaios ocidentais tenham tido o desplante de argumentar dessa forma sem nunca retirarem a confiança ao seu diplomata e apesar de este ter sido apanhado em flagrante a fornecer o material para o atentado, diz muito sobre o à vontade com que as autoridades iranianas se movimentam na Europa.

Passados praticamente dois meses depois dos factos, e apesar do pedido de extradição feito pelas autoridades belgas às autoridades francesas e alemãs, apesar de muitas das vítimas potenciais do atentado se terem constituído como parte civil no processo, continua a não existir uma acusação e, sobretudo, não foram tomadas pela União Europeia quaisquer medidas de retaliação contra o regime iraniano.

  1. O apaziguamento europeu

A diplomacia europeia não só fez um total silêncio perante este atentado como, pior ainda, multiplicou os seus actos de apaziguamento em relação a Teerão.

A posição tomada pela União Europeia um mês após o atentado perante o acordo nuclear assenta numa monstruosa falsidade: que o objectivo da União Europeia é “assegurar que o programa iraniano permanece pacífico, como confirmado pela Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) em onze relatórios sucessivos.”

Como explicou o finlandês Olli Heinonen, que foi 27 anos funcionário da  AIEA e que trabalha hoje para a Fundação de Defesa da Democracia, a agência nunca declarou tal coisa. Na verdade, o que a agência constatou durante numerosos anos foi mesmo o contrário.

Mas para estes dirigentes europeus, tudo é válido para satisfazer os desejos de Teerão, inclusivamente pôr em marcha um programa de subvenção ao Irão, não dar qualquer resposta às acusações públicas de que o regime subornou dirigentes europeus para que estes apoiassem o acordo nuclear.

De acordo com algumas fontes citadas pelo “Maghreb Intelligence” é o departamento 157 dos serviços secretos iranianos que dirige as operações no interior da diplomacia europeia.

Indepentemente de saber quais os departamentos dos serviços secretos iranianos encarregados das várias operações de guerra antiocidental, creio que sem levarmos a sério a guerra que nos é feita pelo fanatismo islâmico orgânico da teocracia iraniana não é possível defender de forma eficaz os interesses europeus.

 

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