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Domingo, Dezembro 22, 2024

Neutralidade na eleição é erro político e impossibilidade técnica

Um debate que tem surgido entre cidadãos que aguardam pelo 28 de outubro  diz respeito aos votos nulos e brancos. Insatisfeitos com a chance de escolher entre duas opções – Haddad ou Bolsonaro – um número considerável de eleitores cogita assumir uma postura imaginária de neutralidade. Pensam em votar em branco, opção possível na urna eletrônica, ou mesmo anular seu voto, insistindo na digitação de um número inválido.

Mesmo pessoas que compreendem a necessidade de barrar a ascensão de Jair Bolsonaro costumam dizer que o voto  nulo e o branco “pelo menos evitam um voto no candidato pior”. É uma forma de conformismo, que ajuda a apaziguar a consciência. Mas só contribui para a vitória do concorrente mais indesejável.

Esta opção não representa uma saída para  o problema real de 2018, que é derrotar um candidato que ameaça mergulhar o país numa treva institucional sem paralelo desde o golpe de 64.

Tecnicamente, a  única forma de evitar a vitória do concorrente indesejável  é permitir que Haddad acumule um maior número de votos do que o adversário.

É isso ou a derrota — o que só ressalta a importância dessa discussão.

Ao contrário do que os nomes “branco” e “nulo” podem sugerir, não há voto neutro no sistema eleitoral brasileiro e toda tentativa de fugir de uma escolha política terá efeito nocivo na decisão final.

Vamos falar claro: Jair Bolsonaro só não se tornou presidente em 7 de outubro, já no primeiro turno, porque a decisão de milhões de brasileiros de votar contra sua candidatura e apoiar outros concorrentes criou um gigantesco universo de 107,2 milhões de votos validos. Competindo nesse patamar, que incluía os votos em Ciro Gomes e Alckmin, mas também no cabo Daciolo e em Guilherme Boulos, e quem mais você puder imaginar, faltaram a Bolsonaro  pouco mais de 4 milhões de votos, que lhe permitiriam atingir a marca dos 53,3 milhões que lhe dariam a maioria de 50+1 já naquele domingo. Bolsonaro ficou  na marca de 49,2 milhões e só por isso teremos, no  segundo turno, a chance de reverter a decisão. Caso o total de votos válidos tivesse sido reduzido a 89 milhões, o país estaria diante de uma tragédia irreparável no curto prazo.

Devemos agradecer ao eleitorado brasileiro por essa chance. Uma abstenção inferior a 9% não acontece todos os dias. Em 1998, Fernando Henrique foi reeleito num pleito no qual os nulos e brancos somavam  18,6%. Em 1994, eram 18,7%.

A legislação define a escolha do vencedor pelo critério de 50% + 1 dos votos válidos, que são aqueles nos quais o eleitor define um candidato, a ser validada pelo número correspondente.

A decisão das pessoas que votam em branco ou anulam o voto tem o mesmo peso correspondente no computo final — mesmo que por um caminho diferente.

Numa hipotética eleição com 100 eleitores, na qual o número de brancos e nulos atingir 10 votos, o vitorioso será obrigado a somar pelo menos 46 votos, contra 44 a seu adversário. Se o número de nulos e brancos for 40, a vitória sairá mais fácil — a partir de 31% dos votos.  E assim por diante.

Isso quer dizer o seguinte: mesmo pensando que está se mantendo neutro da disputa, o cidadão que vota em branco ou nulo estará  facilitando a vitória do candidato que estiver na frente. No Brasil de 2018, sua decisão vai rebaixar o número de votos válidos e contribuir  matematicamente para a vitória a Bolsonaro.

Basta recordar que em 2018 nós temos mais de 140 milhões de eleitores registrados para entender o  efeito real dos nulos e brancos.

Considerando o cenário das pesquisas eleitorais da campanha presidencial,  cada um desses votos facilitará a confirmação – desastrosa para o país e para a democracia –  de  uma vitória de Bolsonaro.

A cada nulo, a cada branco, ele precisará de menos votos válidos para tornar-se o novo presidente da República.

A legislação força o eleitor a escolher. Parece angustiante mas é bom que seja assim. A alternativa é fingir que a omissão é uma alternativa válida, e que ninguém tem nada a ver com isso. Procura-se transmitir a impressão de que ninguém será responsável por uma tragédia possível. A verdade é outra. Todos tem sua cota de responsabilidade e pagarão por ela.

Alguma dúvida?

 

Por Paulo Moreira Leite, Colunista do 247, ocupou postos executivos na VEJA e na Época, foi correspondente na França e nos EUA  |  Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial Brasil247 / Tornado

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