(1922 – 2020)
Arquitecto paisagista, Gonçalo Ribeiro Telles, esteve presente na Resistência ao fascismo, desde jovem, e foi um monárquico católico com quem republicanos e agnósticos ou ateus dialogaram sempre amistosamente. Faleceu a 11 de Novembro de 2020.
Cidadão muito respeitado pela sua seriedade, é conhecido pela cordialidade, pelo entusiasmo e pelo rigor científico, com que se envolve nas causas e iniciativas ligadas ao meio ambiente, pela forma como exerceu a profissão, mas também pela sua dimensão humanista e disponibilidade para partilhar conhecimentos.
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Foi o grande mentor ideológico de uma política de paisagem, que se desenvolveu em Portugal na década de 60 , procurando uma relação íntima entre a Cultura e a Natureza. Deixa uma marca não só ao nível da arquitectura paisagista (o Parque Gulbenkian é o exemplo mais conhecido entre inúmeros outros), como na política do ambiente em Portugal. Figura notável das questões do ordenamento do território, introduziu em Portugal a Ecologia, conceitos como biodiversidade, multifuncionalidade, equilíbrio, dinâmica e a noção de recurso finito.
Devemos-lhe jardins urbanos aprazíveis, as hortas urbanas, a protecção legal da reserva natural e dos parques naturais, e também a frontal denúncia dos empórios do betão, da celulose e da energia.
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O arquiteto-paisagista Gonçalo Ribeiro Telles visitou o Jardim-Horto de Camões, quase 30 anos depois de o ter projectado. Inaugurado em 1991 pelo Presidente da República, o Jardim-Horto de Camões é considerado o mais vivo e singular monumento erguido no mundo a um poeta.
(Foto: mediotejo)
Arquiteto-paisagista
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Gonçalo Pereira Ribeiro Telles nasceu em Lisboa, em 25 de Maio de 1922. Licenciou-se em Engenharia Agrónoma e terminou o Curso Livre de Arquitectura Paisagista no Instituto Superior de Agronomia. Iniciou a sua vida profissional como assistente deste instituto e, mais tarde, foi professor convidado da Universidade de Évora, onde criou as licenciaturas em Arquitectura Paisagista e em Engenharia Biofísica. Na sua carreira universitária foi também professor convidado do curso de Planeamento Regional e Urbano e Engenharia Sanitária da Universidade Técnica de Lisboa (1973-1975).
Foi catedrático da Universidade de Évora, entre 1976 e 1992, ano em que se jubilou. A sua actividade profissional abrangeu principalmente as áreas do planeamento regional e urbano, do ordenamento rural, da paisagem industrial (Siderurgia) e do enquadramento e valorização dos jardins, destacando-se a que é talvez a sua obra mais conhecida: os jardins da sede da Fundação Gulbenkian, em Lisboa. No início da sua vida profissional, trabalhou na Câmara Municipal de Lisboa (1951-1960).
Intervenção pública
Iniciou a intervenção pública como membro da Juventude Agrária e Rural Católica (JAC), de que foi um dos fundadores e seu presidente[1].
Em 1957, fundou o Movimento dos Monárquicos Independentes (MMI), que se propunha concorrer às eleições legislativas desse ano, chegando a publicar um manifesto eleitoral. Quando começaram a verificar-se divisões internas no MMI, fundou, com outros monárquicos , o Movimento dos Monárquicos Populares (MMP), claramente oposicionista. Em 1959, esteve implicado na denominada Revolta da Sé e, no mesmo ano, subscreveu, com mais quatro dezenas de católicos – entre os quais Francisco Sousa Tavares, João Bénard da Costa, Nuno Teotónio Pereira e Sophia de Mello Breyner Andresen –, uma carta dirigida ao Presidente do Conselho, Salazar, na qual se denunciavam os métodos da PIDE.
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Foi também um dos signatários do manifesto católico de apoio às posições da oposição democrática que ficou conhecido por «Manifesto dos 101».
Em 1958 manifestou o seu apoio à candidatura presidencial de Humberto Delgado. Em 1967, por ocasião das cheias de Lisboa, manifestou-se publicamente contra as políticas de urbanização vigentes, responsáveis pela dimensão da tragédia.
Foi candidato na Lista Monárquica (Lisboa) em 1961 e em 1969 concorreu à Assembleia Nacional numa lista da Comissão Eleitoral de Unidade Democrática (CEUD)[2].
Em 1970 ajudou a fundar o movimento Convergência Monárquica, um movimento de monárquicos oposicionistas ao Estado Novo que reunia o Movimento dos Monárquicos Populares (que fundara em 1957), a Renovação Portuguesa, de Henrique Barrilaro Ruas, fundada em Maio de 1962, e uma facção da Liga Popular Monárquica, de João Vaz de Serra e Moura, nascida em 1964 .
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Participou no III Congresso da Oposição Democrática, realizado em Aveiro de 4 a 8 de Abril de 1973, apresentando uma tese intitulada «O Problema dos Espaços Verdes Urbanos»[3].
Da extensa obra de projecto e de planeamento que desenvolveu, salienta-se, nos anos que precederam o 25 de Abril, em 1970, o projecto de estrutura verde para a cidade de Nova Lisboa, em Angola, cujo plano director entregou no ano seguinte; em 1971, o plano de urbanização do Vale das Abadias e do Galante, na Figueira da Foz, em colaboração com o arquitecto Alberto Pessoa, e, nesse mesmo ano, o planeamento da zona de Quarteira-Albufeira e da ilha de Armona, ambos no Algarve, em colaboração com o arquitecto Frederico George.
Partido Popular Monárquico
Após o 25 de Abril, Ribeiro Telles, fundou o Partido Popular Monárquico (PPM), a cujo Directório presidiu. Foi Subsecretário de Estado do Ambiente nos Governos Provisórios I (A. Palma Carlos), II e III (Vasco Gonçalves) e Secretário de Estado da mesma pasta, no I Governo Constitucional. Em 1979 integrou a Aliança Democrática. Deputado à Assembleia da República, em 1980, eleito na lista de Lisboa do Partido Socialista. Em 1983/ 1985 integrou o VIII Governo Constitucional, como Ministro de Estado e da Qualidade de Vida. Durante esse período criou as zonas protegidas da Reserva Agrícola Nacional, da Reserva Ecológica Nacional e lançou as bases do Plano Director Municipal.
Em 1984 fundou o Movimento Alfacinha, com o qual se apresentou candidato à Câmara Municipal de Lisboa, tendo sido eleito vereador. Posteriormente fundou o Movimento o Partido da Terra, de que é presidente honorário, desde 2007.
Projectos de referência
Entre os seus projectos referenciam-se os jardins da Fundação Calouste Gulbenkian, (que assinou com António Viana Barreto), um projecto com o qual recebeu, ex aequo, o Prémio Valmor de 1975. Projectou também o Jardim Amália Rodrigues, junto ao Parque Eduardo VII, em 1996. De 1998 a 2002, por iniciativa da presidência da Câmara Municipal de Lisboa, coordenou uma equipa técnica responsável por um conjunto muito vasto de projectos , relativos às estruturas verdes principal e secundária, tais como o Vale de Alcântara e a Radial de Benfica, o Vale de Chelas, o Parque Periférico, o Corredor Verde de Monsanto e a Integração na Estrutura Verde Principal de Lisboa, da Zona Ribeirinha Oriental e Ocidental.
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O arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles foi homenageado pela Fundação Calouste Gulbenkian, na inauguração de um centro interpretativo do jardim desta instituição, em Lisboa, com o nome do arquitecto.
Da sua vida profissional destaca-se ainda o estabelecimento das zonas protegidas da Reserva Agrícola Nacional, da Reserva Ecológica Nacional e as bases do Plano Director Municipal.
Publicações
Colaborou com numerosos jornais e revistas e publicou vários livros sobre assuntos da sua especialidade, sozinho ou em colaboração, e tem vastíssima obra de projecto e planeamento.
É autor de alguns trabalhos de carácter técnico, como Administração Pública e Ordenamento Territorial (Lisboa, 1980); Lisboa: Entre o Passado e o Futuro (Monte da Caparica, 1987); Reforma Agrária: o Homem e a Terra (Lisboa, 1976); Um Novo Conceito de Cidade: a Paisagem Global (Matosinhos, 1996).
Em 1994 recebeu do então Presidente da República, Mário Soares, a Grã-Cruz da Ordem de Cristo.
Em 2011, aos 89 anos, Gonçalo Ribeiro Telles, foi homenageado na Universidade de Évora e na Fundação Calouste Gulbenkian.
Em Abril de 2013 foi galardoado com o Prémio Sir Geoffrey Jellicoe, a mais importante distinção internacional no âmbito da arquitectura paisagista, prémio que, segundo a Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas (APAP), “representa a maior honra que a Federação Internacional dos Arquitectos Paisagistas (IFLA) pode conceder; e reconhece um arquitecto paisagista, cuja obra e contribuições ao longo da vida tenham tido um impacto incomparável e duradoiro no bem-estar da sociedade e do ambiente e na promoção da profissão de Arquitectura Paisagista”.
[1] A JAC, com ligações ao “Movimento dos católicos progressistas”, atingiu o auge de implantação e participação na década de 60, acentuando a sua oposição ao regime nas sessões do Centro Nacional de Cultura.
[2] Neste ano, foi constituída a Comissão Eleitoral Monárquica (CEM), com o objectivo de concorrer às eleições legislativas, e Henrique Barrilaro Ruas convidou-o para fazer parte da lista, mas recusou por já se ter comprometido com a CEUD. Garantiu, porém, que se a CEM chegasse às urnas e fosse qual fosse o resultado, o MMP aderiria a uma Convergência Monárquica .
[3] Convidado, com outros monárquicos, a participar no III Congresso Republicano de Aveiro começou por recusar, por se tratar de um congresso republicano, mas a denominação passou a ser III Congresso da Oposição Democrática – por sugestão do governador civil de Aveiro, Vale Guimarães, que argumentava não estar em causa a questão do regime – o que afastou o obstáculo à participação de monárquicos.
Dados biográficos
- Vídeo RTP: Gonçalo Ribeiro Telles Entrevistado por Fernando Pessa
- PDF| Assembleia da República: Candidatos da oposição à Assembleia Nacional do Estado Novo (1945-1973)
- Jornal Público
- Monarquia
- Wikipédia: Gonçalo Ribeiro Telles
- Engenharia e Construção: Prémio Sir Geoffrey Jellicoe de arquitectura paisagista atribuído a Gonçalo Ribeiro Telles
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