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Domingo, Dezembro 22, 2024

Festival de Berlim exibe Brecht

Não faltam teses e estudos sobre o dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht (1898-1956), um dos artistas mais influentes do século 20. Agora, sua obra e, sobretudo, sua vida serão temas também de um filme, Brecht, produzido para a TV em duas partes e lançado nesta semana na Berlinale – o Festival Internacional de Cinema de Berlim.

Segundo o cineasta Heinrich Breloer – que dirige o filme –, “todos nós carregamos conosco imagens diversas de Bertolt Brecht”. Para confirmar a tese, ele exibiu na Berlinale, pela primeira vez, um olhar próprio sobre o dramaturgo, que irá ao ar na Alemanha no fim de março.

O longa-metragem pode ser definido como um “docudrama”, na medida em que combina documentário e cenas com atores para ilustrar trajetória de Brecht, em especial suas tumultuadas relações amorosas, que estão no foco da trama. O formato é uma especialidade de diretor.

Ao lado do colega Horst Königstein, morto em 2013, Breloer é considerado o criador do “docudrama” – uma forma híbrida, hoje estabelecida, entre filme de ficção e documentário. Ele alcançou maestria nesse gênero, sendo muito elogiado por suas produções a respeito de personalidades e acontecimentos políticos, históricos e culturais.

Especialistas elogiam o “docudrama” justamente por sua “forma aberta”, que ajuda a mostrar a “realidade” por trás da ficção e, ao mesmo tempo, enriquecem o documento cinematográfico com um nível interpretativo adicional. Aqui, aliás, é possível ver paralelos com o trabalho brechtiano – o dramaturgo também defendia uma cultura teatral “aberta”, em que os espectadores não se sentissem seguros dentro de uma ilusão.

“Assim como Brecht leva os atores até o proscênio para falarem de seus papéis, quebrando, assim, a ilusão, esse distanciamento também ocorre quando interrompo a representação cênica com a documentação”, comenta o diretor sobre a relação entre conteúdo e forma em sua nova produção.

Na primeira parte de Brecht, o espectador é confrontado com o autor durante a República de Weimar, quando ele ascende a astro do teatro alemão. Adolescente, ainda escola secundária, ele lia em público seus ensaios antipatrióticos. Depois, já na condição de selvagem gênio da poesia, celebrava na peça Baal a si mesmo e ao teatro como máquina de emoções.

Por fim, ele aparece como o criador de Tambores na Noite e A Ópera dos Três Vinténs, a qual se torna o maior sucesso teatral da República de Weimar. Ao fim da primeira parte da minissérie, o ano é 1933, em meio à tomada de poder pelos nacional-socialistas. Brecht está a caminho de seu primeiro exílio, em Praga.

A segunda parte o encontra nos primeiros anos do pós-guerra. Na Alemanha Oriental, sob regime comunista, ele é festejado por uns como grande inovador, enquanto outros o olham com desconfiança. Breloer explora com sensibilidade o fato de o ator ter amigos e inimigos em ambas as Alemanhas, de admiradores públicos aos guardiães da ideologia unificada socialista.

Em nenhuma época ou lugar de sua vida ele é um homem sobre quem haja uma opinião unânime. Até mesmo na Alemanha Ocidental do pós-guerra, havia tanto patrocinadores quanto uma maciça frente contra o fundador do teatro Berliner Ensemble, que sempre se definiu como “comunista”.

O que eleva o docudrama de Breloer acima de uma bem comportada narrativa biográfica é o olhar sobre a vida privada do também ativista político. O tema “Brecht e as mulheres” se estende sobre todos os 180 minutos do filme – e o cineasta o expõe sob uma luz bastante crítica. Não como um misógino, mas, sim, como mulherengo que pouco ligava para moral e empatia.

Elisabeth Hauptmann, Ruth Berlau, Marianne Zoff, Paula Banhölzer, Regine Lutz e, é claro, a atriz Helene Weigel acompanharam o autor durante anos, por vezes vivendo ao mesmo tempo com ele – e todas sofriam com a situação. Um dos pontos fortes da série em duas partes é que Breloer não evita explorar essas arestas de caráter de Bertolt Brecht. Em vez disso, ele entrelaça com elegância os diferentes aspectos biográficos: vida e obra, amor e refinamento poético.

Nem todos apreciarão essa decisão. Mas alguns talvez percebam como íntima e pessoal demais essa penetração na vida particular, tantos anos após a morte do artista. Outros gostarão, justamente, que Brecht desça um pouco do “pedestal”. Para o diretor Heinrich Breloer, a resposta é fácil: “Todos nós carregamos conosco imagens diversas de Brecht”.


Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado


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