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Sexta-feira, Julho 26, 2024

Maiakovski: O que é o cinema?

As manifestações culturais entraram no radar da Revolução Russa graças, sobretudo, a artistas como Vladimir Maiakovski (1893-1930) e Máximo Gorki (1868-1936). É fato que a Rússia já apresentava uma tradição descomunal em áreas como literatura, arquitetura, teatro e dança – sem contar seu folclore. Mas no cinema, a arte de massas por excelência, os russos não faziam frente, em quantidade e qualidade, a Estados Unidos, Inglaterra, França e outros países. 

Lênin (1870-1924), em Que Fazer? (1902), enfatizava que “sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário”. Quinze anos depois, quando a Revolução de 1917 se sagrou vitoriosa, Maiakovski foi direto à fonte e tratou de levar esse princípio para os meios culturais. Assim, segundo ele, “sem forma revolucionária não há arte revolucionária”. 

A influência aberta de Lênin sobre Maiakovski se evidencia, uma vez mais, no ano de 1922. Em 17 de janeiro, o líder revolucionário lança as Diretrizes sobre o Cinema, atribuindo um caráter estratégico e político aos “negócios cinematográficos”, que passam a ficar sob a responsabilidade do Comissariado do Povo para a Educação. No mesmo ano, em agosto, o “poeta da Revolução” lança os combativos versos de Kino-Phot – uma decodificação poética dos planos de Lênin e do Partido Comunista.

A icônica cena de O Encouraçado Potemkin exemplifica a visão de Maiakovski sobre o cinema

É nesse sentido que deve ser lido e interpretado o poema-manifesto de Maiakovski sobre o cinema. Cada verso é um aforismo, cada ideia é uma denúncia ou uma conclamação. Diante da constatação de que “o cinema está doente”, o poeta anuncia as bases de uma escola audiovisual própria, autoral e anticapitalista. Ao propor o cinema como “concepção do mundo”, “veículo do movimento” e “difusor de ideias”, Maiakovski abre de vez a porta através da qual nomes como Sergei Eisenstein (1898-1948) e Dziga Vertov (1896-1954) viriam a fazer história.

Tome-se o caso do clássico O Encouraçado Potemkin, referência de filme político com exuberância técnica. A fim de reconstituir a atmosfera da Revolução de 1905, em Odessa, Eisenstein chega a usar 1.300 planos (enquadramentos) em cerca de 75 minutos. 

A sequência em que um carrinho de bebê despenca da escadaria, em meio ao motim, é uma das mais celebradas do cinema – e uma demonstração do poder da montagem. Muito antes de Brian de Palma usá-la como inspiração no clímax de Os Intocáveis (1987), Glauber Rocha a citou na cena do massacre de Monte Santo, em Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964). Era Eisenstein na veia. E, por tabela, era Maiakovski também.

Kino-Phot

(Vladimir Maiakovski)

Para vocês o cinema é um espetáculo.
Para mim, é quase uma concepção do mundo.
O cinema é o veículo do movimento.
O cinema é o renovador da literatura.
O cinema é o destruidor da estética.
O cinema é intrepidez.
O cinema é esportivo.
O cinema é difusor de ideias.
Mas o cinema está doente. O capitalismo atirou pó dourado em seus olhos. 
Hábeis empresários o conduzem pela mão nas ruas. 
Ganham dinheiro comovendo corações com intrigas chorosas. Isso precisa acabar.


por André Cintra | Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado


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