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Domingo, Dezembro 22, 2024

Os conceitos históricos de esquerda e direita

O nazi-fascismo e o neoliberalismo são manifestações inequívocas do capitalismo. 

A alma da quinta coluna é o integralismo. Esse slogan marcou a Editorial Calvino, que publicava livros sobre o socialismo nos anos 1945 e 1946. O mundo acabara de sair da Segunda Guerra Mundial e o trauma da experiência nazi-fascista ainda era forte. O termo “quinta coluna” designava os traidores dos países que estavam na mira do nazi-fascismo. O traidor norueguês Vidkun Abraham Lauritz Jonsson Quisling, um major, se tornou ativo colaborador dos nazistas em seu país no começo do conflito e seu nome ficou associado ao termo.

A ideia de “quinta coluna” surgiu nos anos 1930, na guerra civil espanhola, quando o líder fascista Francisco Franco se preparava para marchar sobre Madri com quatro colunas e o general Queipo de Llano disse: “A quinta-coluna está esperando para saudar-nos dentro da cidade.” Pela primeira vez, o mundo ouvia a palavra fatídica — “quinta-coluna”. Mais à frente, ela ganhou o termo “quisling” como sinônimo. Com o passar do tempo, essas palavras saíram de cena, mas o seu sentido está mais atual do que nunca.

Expansionismo norte-americano

No Brasil, esse papel foi desempenhado pelos integralistas, também chamados de “galinhas verdes” em alusão às sua camisa esverdeada, mas pode-se dizer que muitas outras forças políticas, ou correntes ideológicas, também agiram como “quisling” ou “quinta coluna”. O exemplo mais explícito é o do regime militar de 1964, um golpe que interrompeu a mais importante experiência desenvolvimentista da história do Brasil, a Revolução de 1930. 

Aquele movimento golpista falava pela cartilha do expansionismo do regime norte-americano do pós-Segunda Guerra Mundial e rezava pela ladainha do anticomunismo da chamada Guerra Fria. Com a derrota do nazi-fascismo, os Estados Unidos surgiram na arena mundial como o maior inimigo do socialismo, retomando o fio histórico do combate à União Soviética e seus aliados anteriormente conduzido pelo governo de Adolf Hitler na Alemanha. 

Bretton Woods

No Brasil, o golpe de 1964 fez parte da ofensiva militar norte-americana pós-Segunda Guerra Mundial, a mesma da guerra na Coreia e no Vietnã. O sangue derramado naqueles países asiáticos foi pelos mesmos motivos do derramado na América Latina. E os métodos de formar movimentos políticos traidores da pátria seguiu a mesma regra dos que o regime de Hitler usou no processo de ascensão do chamado Terceiro Reich, a escalada nazi-fascista que ensanguentou o mundo.

A ofensiva militar norte-americana tinha como causa a aplicação dos ditames do acordo de Bretton Woods, quando os Estados Unidos assumiram a rédea da economia do ocidente com instituições como e Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Para dar garantias a esse arranjo, o regime de Washington criou a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a Otan, o poderoso braço armado dos Estados Unidos e seus aliados. 

Por esse breve histórico já é possível concluir que socialismo e fascismo são antípodas — a ascensão de um freia o outro. Não há uma neutralidade que, do ponto histórico, substitua ambos. A questão é saber qual é o portador do progresso e, consequentemente, qual é o responsável por sua negação. Por todos os ângulos que se olhe para essa dicotomia, é fácil concluir que as ideias socialistas são a essência do processo histórico que levaram a humanidade a dar magníficos saltos civilizatórios. 

Propriedade privada

Esse deve ser o ponto de partida para se entender o que é ser de direita e de esquerda, conceitos que vêm da Assembléia Nacional, em Paris, logo após a Revolução Francesa. Nas galerias à esquerda da mesa diretora ficavam os jacobinos, radicais quanto ao fim da monarquia e quanto aos rumos da Revolução. À direita ficavam os girondinos, que defendiam posições conservadoras e não simpatizavam com a ideia da França transformada em república.

Já no século XIX, quando a maioria dos países havia trocado a monarquia de base feudal pela república baseada no liberalismo, direita passou a representar a defesa dos valores conservadores, como a tradição familiar patriarcal e a propriedade privada dos meios de produção, e esquerda a crítica a esses valores. Quando os projetos socialistas e capitalistas passaram a disputar a hegemonia política e econômica do planeta, no século XX, a denominação de esquerda coube aos socialistas e a de direita aos liberais.

Esquerda passou a significar o projeto de modificação da estrutura republicana arquitetada pela desigualdade social e do sistema econômico baseado na propriedade privada das forças produtivas, na acumulação em detrimento da distribuição social da ruiqueza produzida. Seu ideário reivindica a precedência do trabalho em relação ao capital, da propriedade social em relação à propriedade privada dos meios de produção. E direita tomou o significado de manutenção do status quo do sistema econômico e político sustentado pela correlação de forças favorável aos capitalistas. Seu ideário advoga a primazia do capital em relação ao trabalho, da propriedade privada em relação à propriedade social dos meios de produção.

Variantes do capitalismo

De um lado está o pensamento elitista e excludente, que privilegia a acumulação da riqueza em relação à sua distribuição, a ordem macroeconômica em relação à qualidade de vida dos indivíduos, a benesse de poucos em relação ao bem-estar de todos. De outro lado, está o pensamento que considera o todo e busca incluir, que busca aumentar e distribuir a riqueza, que eleva a qualidade de vida dos indivíduos à condição de prioridade econômica, que privilegia as pessoas em relação aos monopólios financeiros, o bem-estar de todos em relação ao acúmulo de alguns.

Essa dicotomia se acentuou com o triunfo das ideias neoliberais. Um de seus líderes, o norte-americano Milton Friedman, dizia que a pessoa só nada quando a alternativa a isso é afundar e morrer afogado. Ele apostava que a melhor maneira de produzir bons nadadores é não fornecer coletes salva-vidas nem equipes de salvamento. 

Ou seja: acabar com qualquer mecanismo de proteção social. Muitos, claro, vão afundar, mas esse seria o preço a pagar para ter os vencedores. Há grandes diferenças entre essas ideias e as do fascismo? Como exemplo, há o caso da ditadura do general Augusto Pinochet, que já no início da década de 1970 implantou as ideias de Friedman no Chile.

O nazi-fascismo, assim como o neoliberalismo, são variantes do capitalismo. Ao se considerar as categorias da ciência econômica e as teorias da formação social nesse período histórico pós-Revolução Industrial e pós-Revolução Francesa, constata-se que direita e esquerda são formulações que definem bem o que uma e outra representam. Afora a vulgaridade de quem não tem compromisso com a verdade e com os fatos da história, um comportamento muito comum entre historiadores e escribas desprovidos de ética, não há como negar a ligação do nazi-fascismo com o capitalismo. 


por Osvaldo Bertolino | Texto original em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado


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