Além de exímia pianista, Nina Simone tornou-se uma compositora inspirada e comprometida com a luta pelos direitos civis.
Essa última caraterística granjeou-lhe amizades com Malcom X e Martin Luther King, bem como um discurso forte, como o da música “Mississippi Goddam” (Mississippi puta-que-pariu), que escreveu em minutos após o assassinato de quatro meninas negras em 1963, numa igreja em Birmingham, Alabama:
Cães de caça no meu trilho, escola, crianças sentadas em prisão, gato preto que atravessa o meu caminho, eu acho que qualquer dia pode ser o meu último”.
Em 1964, Nina mudou de editora discográfica, passando da Colpix, uma empresa americana, para a holandesa Philips Records. Para além das questões comerciais, esta mudança potenciou uma profunda alteração no conteúdo das suas músicas. Nina sempre inspirou as suas canções na sua herança afro-americana. No seu álbum de estreia pela Philips, “Nina Simone in Concert”, de 1964, ela abordou pela primeira vez a desigualdade racial nos Estados Unidos. Esta foi sua resposta ao assassinato de Medgar Evers em 12 de junho de 1963 e ao atentado à bomba contra a Igreja Batista da 16th Street em Birmingham, Alabama, em 15 de setembro de 1963.
Em “Mississippi Goddam” Nina dizia que a música era “como disparar dez balas de volta para eles”, tornando-se uma das principais canções de protesto que escreveu. A canção foi lançada em single com o selo da Philips e foi de imediato boicotada em diversos estados sulistas. Uma estação de rádio da Carolina destruiu as cópias promocionais que recebeu e depois devolveu-as à Philips. Mais tarde, Nina recordou como “Mississippi Goddam” fora a sua “primeira canção de direitos civis” e que a inspiração lhe chegou “numa onda de fúria, ódio e determinação”.
Ao dizer “eu e meu povo estamos quase vencidos”, a canção desafiou a crença de que as relações raciais poderiam mudar gradualmente, exigindo pelo contrário medidas imediatas. Por este motivo, “Mississippi Goddam” foi um momento-chave na sua radicalização política, passando a ser norma a existência de mensagens sobre direitos civis nas suas músicas e espetáculos. Tal ocorreu com “Old Jim Crow”, tema do mesmo disco que abordava as leis de segregação racial com o mesmo nome.
O sucesso da cantora crescia em compasso com os conflitos raciais. Nina participava em encontros e manifestações ligadas aos direitos civis, como as marchas de Selma a Montgomery em 1965. Como Malcolm X, seu vizinho em Mount Vernon, Nova Iorque, apoiava o nacionalismo negro e defendia uma revolução violenta, contrária à abordagem não violenta de Martin Luther King. Nina desejava que os negros americanos usassem o combate armado para criar um estado independente, embora tenha escrito na sua autobiografia que considerava todas as raças iguais.
Em 1967, troca a Philips pela RCA Victor. Nesse ano lança “Nina Simone Sings the Blues”, onde canta “Backlash Blues”, canção escrita por Langston Hughes, sua amiga e líder do Harlem Renaissance. Seguem-se “Silk & Soul”, ainda em 1967, e ‘Nuff Said!”, no ano seguinte. Em 1968 ocorre o assassinato de Martin Luther King Jr. O trágico acontecimento mexeu muito com Nina, que mais uma vez utilizou o seu talento musical para expressar o que lhe ia na alma. A canção “Why? The King of Love is Dead” (Porquê? O rei do amor está morto) foi por composta pelo seu baixista, Gene Taylor, e cantada por ela 3 dias depois, numa performance emocionada durante o funeral.
A luta de Nina pela igualdade racial era tão forte que a pianista decidiu fazer uma pausa na sua carreira para residir durante algum tempo na Libéria, país africano fundado por antigos escravos norte-americanos que regressam ao continente ancestral. Segundo Nina, a Libéria era um país onde podia ser vista de igual para igual, vivendo com a sua raça negra sem ter de se submeter às injustiças de uma sociedade racista e supremacista branca.
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