Regino Pedroso (1886-1983) é um poeta cubano conhecido por sua poesia social, que inaugurou uma verdadeira matriz moderna de canto participante na literatura de seu país.
De origem mestiça, etíope e asiática, desde cedo adequou sua voz com a empatia pelos despossuídos, desprezados e humilhados do mundo. Sua perspectiva proletária e socialista jamais resultou em uma contrição do alcance estético em favor da difusão de ideologias.
É de sua autoria o belíssimo poema Canções sobre os Trilhos, que divulgamos hoje, em tradução inédita do poeta Alexandre Pilati, professor de Literatura da Universidade Brasília (UNB).
Nesse canto, Pedroso mostra o quanto sua poesia é elevada e radical, apresentando o poeta como um vidente que atravessa a vida a recolher o passado e projetar o futuro no horizonte da utopia.
Canções sobre os Trilhos
Regino Pedroso
Sobre os trilhos dos dias
o trem vertiginoso desliza;
eu perfurei com olhos de insônia o futuro.
Pela janela aberta adentra-me a distância.
Clamor do vento ou da sombra?
Que voz interna, ou estranha, profunda e forte,
me abriu como um livro…?
Fecundado de sol, de selva e crepúsculos,
a um tempo sou diverso e único:
como Américas virgens frutifico em canções;
e estou, como os céus, iluminado pelos astros.
Lanço à noite multiforme em grito trêmulo
– anseios de agora e profundas ressonâncias atávicas –
a teia forte de meu júbilo.
Luto para apressar a vertigem rolante,
a inquietude e o mistério, a voz da sombra,
os continentes cinemáticos do Cosmo.
E minhas mãos conquistam países de metáforas
em uma sucessão caleidoscópica de imagens óticas.
Quanto tempo o trem expresso de minha vida viajante
esteve estacionado?
Um lastro de emoções familiares
pesava nos vagões de minhas noites.
Agora, sobre novos caminhos,
digo-te adeus.
Anseio pela viagem múltipla;
mas te levo, ainda que despersonalizada,
infinitesimal
protoplasma em células de cantos novos.
Panorâmicos céus insuspeitados…
O trem vertiginoso desliza
sobre os trilhos dos dias.
De Atlânticas platônicas um canto humano, cósmico,
chega cordial, como um navio embandeirado de manhãs.
E nas auroras novas
meus olhos pastoreiam rebanhos de horizontes
sobre maravilhosas planícies estéticas.
Tradução para português do Brasil de Alexandre Pilati, professor de Literatura da Universidade Brasília (UNB)
Exclusivo Editorial PV / Tornado