45 Anos – O ciúme de meio século
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Um casal prestes a celebrar 45 anos de casados é acordado para a dúvida do que sucedera antes do seu matrimónio. A notícia informa que um anterior amor do marido é resgatado do passado e mantido no congelador da forma mais inesperada fazendo pairar o fantasma e o veneno do ciúme.
É este o retrato de um melodrama romântico com tons clássicos a devolver-nos magistrais interpretações do par Charlotte Rampling (justamente coroada com o prémio do Cinema Europeu para a Melhor Actriz do ano) e Tom Courtenay (que deveria também ter sido reconhecido, pois ela não existe sem ele), eles que já haviam ganho o prémio de interpretação no Festival de Berlim.
O resultado é uma peça refinada por um sofrimento ligeiro, mas arrasador onde se sente a proximidade de estilo de Breve Encontro, de David Lean, bem como os peculiares ensaios familiares de Bergman.
45 Anos é o nosso filme do ano. Porquê!? Não por ser dos últimos a estrear, evidentemente, até porque foi um dos primeiros que vimos em 2015, em Fevereiro passado no Festival de Berlim. E já na altura ficáramos comovidos pela forma como Andrew Haigh tratou o tema presente na short story de David Constantine sobre um romance que enfrenta o crivo do tempo.
Revisto há dias percebemos como se manteve intacto a esse brilho no olhar que levanta interrogações sobre o passado e põe em causa o amor de meio século.
Durante a semana de preparativos para a festa dos 45 anos de casados, Kate (Ramplig) e Geoff (Courtenay) são visitados por uma notícia do passado que vem perturbar este casal habituado a viver de mútuos afectos. É que, aparentemente, aparecera o corpo ainda congelado de um anterior romance de Geoff que morrera durante uma expedição nos Alpes. O facto do corpo estar intacto acorda nele a paixão por aquela com quem pensara casar. Incomodada, Kate lida como pode com a notícia ousando imaginar até onde poderia ter ido essa aventura que daria azo a um romance, e uma vida, do seu marido com outra pessoa. No meio deste turbilhão de emoções, tem de escolher o local para a sua festa e as músicas que testemunharam a história romântica de ambos. Tudo com assinalável candura, carinho e uma calma que chega a ser comovente.
O filme vive dessa narrativa cuidada, mas assente num par de actores que se funde numa cumplicidade difícil de igualar e onde a idade não tem peso. Eles dançam na sala, fazem amor e mantém a serenidade no olhar. Contudo, pressente-se na expressão como teria sido a sua vida com outra pessoa, à medida que um véu de tristeza se abate nos seus rostos. É nestes cambiantes que Andrew Haigh se mostra consistente em fazer com que ambos os actores dêem o melhor de si. E será até (quase) injusto favorecer Charlotte quando Tom acaba até por lidar com uma paleta mais rica de emoções.
É essa dúvida, essa ambiguidade que nos permite um final de emoções entrelaçadas, em que o discurso da afirmação de um amor de vida convive com um certo temor de tudo aquilo parecer uma segunda escolha. Magnífico este turbilhão de amor-desamor ao som de Smoke gets in your Eyes, dos Platters.
Trailer:
Menções anteriores ao filme 45 anos
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