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João de Sousa

Sábado, Dezembro 21, 2024

Atribulações da semana

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

Duas na ferradura e uma no cravo

16 de Março em vez de 25 de Abril na Venezuela

Prometia ser um 25 de Abril, mas acabou por ser um 16 de Março, se não tiver sido apenas um 31 de Dezembro de 1961. Maduro, forte das forças de ocupação russas e cubanas que controlam a fidelidade do exército, ganhou o dia. Não foi desta que os venezuelanos viram democracia sendo que o regime se vê já numa lógica de Norte-coreanização, matando à fome e à doença quem não for suficientemente fiel.

© REUTERS / Miraflores Palace

Os acontecimentos do 30 de Abril levaram muitas horas a receber qualquer atenção da imprensa americana, e a administração Trump, contrariando a sua retórica, continua, como as anteriores, a não ser capaz de fazer face à determinação russa e chinesa de impor no mundo uma nova velha ordem de ditadores e interesses.

Dias antes, a administração Trump tinha já assinado um pacto com a Rússia e a China de retirada de forças estrangeiras do Afeganistão, país onde, como sabemos, só existem forças regulares estrangeiras ocidentais, num recuo que se poderá vir a revelar como catastrófico, se não conseguir ganhar no único tabuleiro onde mantém a pressão, o iraniano.

Para animar a malta tivemos um festival de contrainformação sobre uma imaginária força da Blackwater que iria libertar a Venezuela, propaganda ocidental que não consegue fazer contrapeso à presença militar cubana e russa no país, esta real e não apenas nos noticiários.

A Rússia começa a ser no século XXI o que foi no século XIX, a força reacionária internacional pronta a esmagar as revoltas populares onde quer que apareçam, sendo que o comunismo, que de força ideológica se tinha já tornado em mera força geopolítica, se torna agora na claque de apoio à extrema-direita.

Vodka laranja

Entre nós abriram-se os tempos do Vodka laranja, com todos os partidos da oposição a derrotar o governo e a exigir aumentos substanciais para os docentes do sector público. Manda a verdade dizer que o mote já tinha sido dado pelo Presidente da República quando vetou um diploma do governo que não atendia suficientemente às reivindicações salariais dos docentes, e talvez por isso, o executivo se viu obrigado a dizer apenas agora que chegou aos limites do possível. 

As explicações dadas pelos dirigentes partidários da oposição são um insulto à inteligência dos portugueses, como se fosse possível aumentar salários da função pública sem que o orçamento os financie. A lei existente – a crer no que se lê na imprensa – impõe um travão ao aumento da despesa no ano corrente de qualquer decisão parlamentar mas não nos seguintes, comprovando a irresponsabilidade com que se legisla em Portugal.

Clamam uns que o Governo só bate com a porta agora por motivos eleitorais, como se porventura não fosse essa a regra de funcionamento no mundo inteiro democrático. Suponho que em Dezembro de 2018 o Governo calculou que se iria sair mal se se demitisse contra Marcelo e que estima que se sairá melhor agora contra a já denominada ‘caranguejola’. E depois? Qual a relevância disso?

Dizem outros que se diminuam os presentes à banca como forma de arranjar dinheiro para pagar mais aos portugueses. Frases bonitas mas demagógicas. A verdade é que é a mesmíssima irresponsabilidade política que permite o assalto bancário e o aumento de promessas de despesas incomportáveis. Não, não se trata de em vez de, trata-se de também. Pensar que o Vodka laranja que promete aumentos salariais à função pública vai pôr ordem na banca é ilusório.

Abandonados por Marcelo – que mudou de opinião com o oportunismo que lhe é característico – tiveram os dirigentes da oposição que dar o dito por não dito (a única excepção deverá ser a do PCP) num volte-face caricato que expõe a falta de consistência das posições políticas assumidas.

Geringonça espanhola

O aumento exponencial das tensões nacionalistas em Espanha é um péssimo sintoma para toda a Europa, e muito em especial para Portugal. A vitória, embora relativa, do PSOE é nesse quadro, uma excelente notícia, porque é um sinal de que a sociedade espanhola, apesar da radicalização nacionalista das suas franjas, quer o compromisso e a integração.

A vitória da geringonça espanhola não quer naturalmente dizer que Portugal vá de arrasto, e se é isso o que António Costa está à espera, temo que venha a ter uma má surpresa.

A vitória dos socialistas espanhóis – fundamental desse ponto de vista – não creio que possa contudo ser suficientemente importante para assinalar um ponto de viragem na derrocada que afecta o socialismo europeu ou que consiga vislumbrar um programa político adaptado aos tempos que correm.

Apesar da derrota do partido inventado pela máquina Irano-venezuelana, ele continua a ser suficientemente forte para exercer uma péssima sombra sobre o executivo socialista, faltando de resto entender como estes se vão entender com os nacionalistas catalães e bascos.

Temos por isso ainda tudo em aberto em Espanha, embora com prognóstico mais positivo.


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