Poema de Filipa Vera Jardim
Um homem de sabão, desfeito de gente
Experimentou… apesar de todos lhe dizer que era feito de sabão, sair à rua num dia de chuva. Não derreteu mais do que o necessário para escorregar o silêncio no alcatrão. Foi só isso que aconteceu: escorregou o silêncio no alcatrão.
Mas ao contrário do que se podia prever, não se desfez.Mal chegou a casa, despiu a gabardina, descalçou os sapatos e sem saber muito bem porquê, começou então a chorar.
As lágrimas correram céleres e foram deixando um rasto de bolas de sabão que pouco a pouco lhe foi desfazendo as ideias…
Uma a uma, rolaram perdidas, pelo chão.A ideia de (vida) a ser assim.
A ideia parecida, com não poder.
A ideia de achar que era capaz…
A ideia sincera a acontecer.A ideia esquecida,
De um tempo passado,
A ideia feita,
Destemperada,
A Ideia de quase tudo,
Num destempero.
Tão perto da Ideia
De quase nada.Chegou ao fim, da única forma possível: desfeito de gente.
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