Um documento importante para a história do cinema brasileiro é o filme Quando as Luzes se Apagam nas Marquises – A História da Cinelândia Paulista, de autoria do cineasta Renato Brandão.
Brandão fez uma longa pesquisa, segundo ele informa, em torno do assunto e assim entregou ao público um autêntico documento que nos conta a história desse grupo de cinemas de rua durante uns 40 anos de vida, dos anos 40 até os 80 do século passado, embora faça referências até os anos atuais. O principal desse documentário é que ele contextualiza os fatos e mostra como era importante cada um desses cinemas para a sociedade paulista. Eles ficavam entre as ruas Ipiranga e São João.
O Metro, por exemplo, era um cinema que recebia um público burguês e ir ali ver um filme era algo importantíssimo na cidade. Além dos ricos e remediados que o frequentavam, havia também os mais pobres que faziam questão de ir. Entrevistados contam como havia empregadas domésticas que juntavam dinheiro num mealheiro para então sair para um programa no Metro. Um detalhe: entravam no cinema e ficavam no mínimo 40 minutos no banheiro se maquiando.
Fachada do Cine Metro
em 1938, ano de sua inauguração
Os realizadores conseguiram juntar pessoas que viveram a vida dessa Cinelândia, dirigentes das empresas ou mesmo donos dos circuitos. Uma dessas pessoas foi o então colunista de cinema e hoje escritor Ignácio de Loyola Brandão, que vai comentando cada um dos acontecimentos em vários cinemas que ele conhecia muito bem, pois fazia uma coluna inclusive de fofocas na Última Hora de São Paulo. Todos eles eram cinemas de rua e nos anos 60 ou 70 conseguiam cerca de 40 ou 50 mil espectadores por semana.
Fachada do Cine Metro
1995, período em que os cinemas de rua desapareciam de São Paulo
Já nos anos 80 tiveram que se transformar em cinemas pornôs para sobreviver. Foi realmente de lá de São Paulo que veio a onda da chamada pornochanchada e uma delas tinha o título de Enfermeiras sem Calcinhas. O comediante Mazzaroppi fazia então um grande sucesso em São Paulo e tinha um cinema que praticamente só passava seus filmes. Ele comentava que o espectador era ganho na calçada. Isso porque na época as fachadas dos cinemas eram ocupadas por enormes cartazes que conseguiam atrair os passantes. Os cinemas eram enormes e no mínimo tinha 1.500 lugares – Marabá, Art-Palácio, Ipiranga, Marrocos (nesse era entregue o prêmio Saci, que já foi uma espécie de Oscar brasileiro).
Quando esses cinemas faziam sucesso eram uma espécie de Templo para os frequentadores e havia a exigência de paletó e gravata para entrar, como acontecia aqui no Recife no São Luiz. Um narrador afirmou que continuou frequentando os cinemas até quase o fim e num deles viu uma cena totalmente degradante: um bêbado vomitou no salão e foi obrigado pelo gerente a limpar a sujeira.
Ignácio de Loyola conta várias estórias dessa Cinelândia e fala que, no entanto, não tem nenhuma nostalgia. É algo que foi vivido e que passou. As cidades se modificam. Vivem os seus caminhos. Concordo inteiramente.
por Celso Marconi, Crítico de cinema, referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8 | Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial PV / Tornado
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