Donald Tusk, o ‘Presidente do Conselho’, quis iniciar as negociações ainda antes do escrutínio europeu, o que algum bom senso prevalecente impediu que acontecesse. Mal o escrutínio fechou, começou o que o Economist apelidou em editorial saído a 30 de Maio de ‘negócio de cavalos’.
Dessa negociação começou por ser posta de lado a hipótese de o candidato do partido mais votado, Manfred Werner, vir a ser proposto para a presidência da Comissão Europeia, hipótese que nunca tinha sido seriamente considerada dada a grande dispersão de resultados e a sua falta de perfil para o cargo.
Foi um processo em que o nosso Primeiro-ministro e a diplomacia portuguesa se envolveram de forma algo inusitada chegando a sugerir que se trataria de uma ‘geringonça europeia’ assente no facto de não se cumprir o princípio pelo qual o partido mais votado nomeia o candidato.
A citada negociação de cavalos descrita pelo Economist três dias apenas depois de serem conhecidos os resultados do escrutínio europeu apontava para um quadro em que a actual Comissária Europeia responsável pela concorrência, Margrethe Vestager – liberal, holandesa – assumiria o lugar de Presidente da Comissão; Dalia Grybauskaitė, a presidente cessante da Lituânia, assumiria o cargo de representante europeia para a política externa, o actual Primeiro-ministro português substituiria Donald Tusk no cargo e Jens Weidmann, presidente do Banco Central alemão desde 2011 e que não tem feito segredo do seu desejo de substituir Mario Draghi nesse cargo.
Como o jornal indicava na altura, não era provável que esse quadro negocial fosse o final, mas ele dava indicações claras quanto ao jogo de forças previsível para o futuro.
Dos quatro lugares chave, três correspondiam a movimentos expectáveis, personalidades que tinham assinalado o seu interesse ou disponibilidade para os cargos e cuja nomeação não apresentava qualquer conflito com as posições presentemente ocupadas; a excepção foi António Costa que se espera seja candidato à sua sucessão nas eleições de Outubro.
Os mesmos três têm posições conhecidas na linguagem corrente como neo-liberais, sendo que Weidmann se evidenciou pela sua posição ortodoxa radical, tendo colocado as medidas de flexibilização monetária do Banco Central Europeu em Tribunal.
Sendo verdade que até certo ponto a personalidade pode dar peso ao cargo, a história recente mostra que a presidência do Banco Central Europeu foi o lugar com maior poder, seguido da presidência da Comissão Europeia e da representação europeia para a política externa. A presidência do conselho tornou-se um lugar quase cerimonial tendo mesmo Jean-Claude Juncker proposto recentemente a sua extinção.
A notícia de 30 de Maio foi olimpicamente ignorada pela comunicação social portuguesa que só a 5 de Junho se referiu ao assunto, com o Primeiro-ministro a confirmar que a questão tinha sido considerada mas anunciando que não aceitaria por estar demasiado envolvido no seu trabalho.
O tema voltou a ser abordado pelo Financial Times a 7 de Junho anunciando a formação de uma equipa negocial onde, mais uma vez, aparece António Costa, agora lado a lado de Pedro Sanchez, em representação dos socialistas, em negociações tripartidas em que a equipa liberal é composta igualmente por dois primeiros-ministros, um da Bélgica e outro dos Países Baixos, e ainda dois deputados do PPE.
A campanha eleitoral europeia foi conduzida como uma épica batalha contra as forças do populismo, tendo como pano de fundo uma situação económica e social que mostrou nítidas melhorias desde 2012 e que tornou possível uma contenção notável dos estragos expectáveis. Um dos efeitos deste tipo de campanha foi o de dar ao dito cujo populismo o estatuto de oposição; a alternativa a ter em conta, enquanto se ficou a zero em tudo o que é essencial.
Se as notícias que vieram a lume verem a concretizar-se, a União Europeia corre o sério risco de se vir a confrontar com uma equipa dirigente extremamente empenhada numa lógica financeira ortodoxa dita neoliberal que poderá ter consequências graves para a Europa e para todos os que sendo favoráveis à integração europeia não se revêm nessas prioridades, sendo a receita ideal para impulsionar o populismo.
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