Quando ainda não existia o conceito político, hoje em dia conhecido como Estado da Índia!
Esta é a história de um sub continente[1] que data de 600AC a 1200AC. A região floresceu após a criação de pequenos reinos com grande diversidade cultural. Diversidade em termos de etnias, línguas, agricultura, alimentação, roupa e tradições, base do conceito político do sul da Ásia, mais tarde conhecido como Estado da Índia.
Chandragupta Maurya[2], um imperador indiano (340AC-297AC ), foi o primeiro governante que teve a ideia de criar uma nação. Depois da morte deste imperador, a região do sul da Ásia sofreu e testemunhou múltiplas invasões políticas, mas os vários reinos continuaram separados. O único ponto notável aqui é a semelhança nas tradições, especialmente em termos de formas de subsistência e de vida. Só mais tarde, o mundo descobriu aquilo a que chamou “Civilização do Vale do Indo”[3] (3300 a1300), confundida com a “religião hindu”.
Um dia, os invasores coloniais[4] chegaram e mudou o destino da região. Começaram a chamar-lhe a “omnipotente Índia”. Dos reinos indianos negociaram uns, resistiram outros à entrada dos colonialistas. Mas, finalmente, os britânicos (Companhia Britânica das Índias Orientais[5]) assumiram o poder quase total do vasto e riquíssimo sub continente. Foi a resistência das populações contra este poder colonial que ajudou criar a verdadeiro alma política da Índia, agregando as populações destes reinos numa luta comum contra o invasor.
Antes de Gandhi se tornar “o símbolo” da independência da índia, já havia grandes lutas contra o poder colonial que só tinha olhos para os recursos naturais da Índia.
Gandhi, com a ajuda de outros líderes progressistas destes movimentos, conseguiu unificar a luta pela independência e conseguiram-na. O movimento conseguiu expulsar o ocupante mas a Inglaterra tinha planos nas suas mangas de tweed.
Qual foi o plano pós colonialista da democrática Inglaterra?
Durante e imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra foi-se esgotando em termos de poder e economia. Não houve outra saída para a Inglaterra que não concordar com as exigências dos líderes independentistas indianos.
Mesmo antes da independência da Índia a Inglaterra adotou a “famosa política” conhecida como “dividir para reinar[6]”. Esta política assenta, aproveita e exalta as diferenças etno-religiosas pré-existentes na sociedade que depois manipula para impedir o povo de lutar de forma unificada contra o poder. De fato, militantes fascistas da religião hindu ajudaram a Inglaterra a atingir os seus objetivos.
Por fim, a Inglaterra conseguiu convencer os líderes muçulmanos que eles precisavam de um estado independente, e assim conseguiam dividir a imensa Índia. O Vice Rei da Índia, Lord Mountbatten é o vilão dessa história. Ele convenceu o Dr. Muhammad Ali Jinnah[7], primeiro governador-geral do Paquistão, que a separação da Índia-mãe criando um país só para muçulmanos é a única saída.
Alguns dias antes da declaração de independência da Índia, o Vice Rei Mountbatten afirmou ao então Rei do território de Caxemira (Maharaja Hari Singh) que não haveria hipótese de a Índia ter independência. Mas no meio da noite de 14 de agosto de 1947 a Índia declara a sua independência. Entretanto o drama organizado pelas autoridades Inglesas aconteceu, e uma Índia dividida eclodiu.
Mas Caxemira, que já era um país independente, permaneceu como tal, ficando encurralada entre a Índia e o Paquistão. Isso aconteceu porque cada reino do subcontinente indiano tinha o direito de escolher entre ficar a fazer parte da Índia, do Paquistão ou tornar-se independente. Então, o que aconteceu posteriormente com esta independência de Caxemira?
Uma breve história de Caxemira
Antes da independência, havia cerca de 650 reinos na Índia. Quer dizer 650 países. Mas os povos dos 650 reinos estavam a lutar contra o poder colonial britânico, e não queriam, na sua maioria, manterem-se como monarquias. Devido à sua localização Caxemira podia optar por se juntar à Índia ou ao Paquistão. Maharaja Hari Singh, o rei da Caxemira, era hindu, enquanto a maioria do povo deste estado era muçulmana. Incapaz de decidir a qual nação Caxemira devia se juntar, o rei escolheu permanecer neutro.
Mas as suas esperanças de permanecer independente foram frustrados em outubro de 1947, quando o Paquistão enviou tribos muçulmanas para atacar o palácio do rei. Maharaja Hari Singh pediu a ajuda militar à Índia, e foi o principio de mais uma tragédia.
Forças militares indianas e paquistanesas começaram a lutar em nome da defesa dos interesses de Caxemira em 1948 e essa luta ainda não acabou. A Índia encaminhou a disputa para as Nações Unidas e venceu. E a ONU pediu ao Paquistão para retirar as suas tropas. A Índia venceu porque naquela altura tinha o apoio das comunidades muçulmanas conseguido pelo prestígio do Dr Sheikh Abdullah[8] e os indianos não podem esquecer o nome dele na luta pela paz contra a intolerância religiosa.
O Paquistão ignorou a resolução da ONU e continuou lutar mantendo uma parte de Caxemira sob seu controle. Em 1 de janeiro de 1949 chegaram a um acordo, com 65% do território sob controle indiano e o restante sob controlo do Paquistão.
Tal como disse o Vice Rei Mountbatten se “atirarmos um osso entre Índia e o Paquistão ,isso manterá a luta por mais de cem anos”. E a guerra continua.
Atualmente o que está a acontecer em Caxemira?
É uma pergunta de resposta complexa. Ambos os países têm “um pedaço de Caxemira”e ambos os lados estão inquietos e sangram. A Caxemira indiana tem neste momento uma história dolorosa, um presente difícil e um futuro incerto. O belo vale já testemunhou várias guerras, sofrimentos e muita desolação.
A Índia é um país que tem uma grande diplomacia. Negociar com 650 reinos e conseguir criar um país não foi uma tarefa fácil. Também por isso nunca houve problemas graves entre a Índia e os outros 28 estados e sete territórios considerados Uniões, estes últimos administrados diretamente pelo poder central. Caxemira é a penosa exceção.
A Caxemira administrada pela Índia tem um estatuto especial, é o Artigo N.º 370 da Constituição da Índia[9]. De acordo com este artigo a defesa, os assuntos externos e as comunicações são os três assuntos em que só o governo central pode tomar decisões. Outras vantagens deste artigo para a Caxemira são:
- O parlamento da Índia não pode alterar ou mudar a fronteira e ou nome do estado
- A legislatura estadual é mais poderosa do que a do parlamento da Índia
- Jammu-Caxemira tem a sua própria constituição e bandeira
- Emergência nacional não pode ser declarada neste estado
Agora em 5 de agosto de 2019, o Governo da Índia revogou o status especial (Artigo 370) concedido a Jammu e Caxemira. O governo da Índia quer fortalecer a sua influência na sua única região de maioria muçulmana. Todos os anos a Índia gasta biliões de rupias na área militar para proteger o estado de infiltrações terroristas que têm sede no Paquistão. A Índia acredita que o país precisa de controle total sobre o estado para combater o terrorismo e atrair investimento no setor turismo.
Mas as pessoas que vivem em Jammu e Caxemira consideram isso como um ataque aos seus direitos e liberdades. Começaram a revoltar-se contra essa decisão. Ao mesmo tempo, os grupos terroristas infiltrados consideram isto uma ótima oportunidade para infiltrarem o estado.
A Índia enviou dezenas de milhares de tropas para o vale da Caxemira, antecipando uma reação da revogação do artigo 370. As autoridades indianas proibiram protestos, fecharam escolas e universidades, e mantêm todos os líderes políticos em prisão domiciliária. Serviços de Internet, televisão e telemóvel foram suspensos no Vale da Caxemira. O “autoritarismo” e não a diplomacia venceram.
As pessoas que defendem a democracia e a Constituição estão preocupadas com essa situação política.
Conclusão
Os líderes políticos da Caxemira indiana trabalham diretamente com o seu povo. Eles sabem identificar problemas e trabalham com a população para resolvê-los. Mas agora que todos os políticos de direita e de esquerda estão no prisão a grande pergunta surge aqui é:
Quem vai falar com o povo e como é que será possível acalmar este movimento? O tempo irá mostrar se foi bom ou não revogar o famoso artigo 370.
[3] Civilização do Vale do Indo
[5] Companhia Britânica das Índias Orientais
[9] Artigo N.º 370 da Constituição da Índia
Por opção do autor, este artigo respeita o AO90