Para Caetano as riquezas da sociedade capitalista seriam admiráveis não fosse por sua consciência de que ela é a geradora de um enorme abismo social. Mais do que isso, em Podres poderes, Caetano toca nas raízes de nossas mazelas sociais, muitas vezes aceitas passivamente: “a incompetência da América católica”.
Esse era o clima da transição pactuada e controversa da ditadura militar para a redemocratização. Mas, mais de trinta anos depois, aponta para uma situação: o Brasil ” sempre precisará de ridículos tiranos”?.
Também é atual sua menção às chamadas minorias (que não são minorias numéricas, mas designadas assim conforme a supremacia de um padrão estabelecido): “Índios e padres e bichas; Negros e mulheres; E adolescentes; Fazem o carnaval” enquanto “os homens” o homem padrão, hetero, branco e rico, “exercem Seus podres poderes”.
Em outras palavras, fazem leis para manter seu sistema de privilégios.
Podres Poderes
Caetano Veloso/1984
Intérprete: Caetano Veloso
Enquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Motos e fuscas avançam
Os sinais vermelhos
E perdem os verdes
Somos uns boçaisQueria querer gritar
Setecentas mil vezes
Como são lindos
Como são lindos os burgueses
E os japoneses
Mas tudo é muito maisSerá que nunca faremos senão confirmar
A incompetência da América católica
Que sempre precisará de ridículos tiranos
Será, será, que será?
Que será, que será?
Será que esta minha estúpida retórica
Terá que soar, terá que se ouvir
Por mais zil anosEnquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Índios e padres e bichas
Negros e mulheres
E adolescentes
Fazem o carnavalQueria querer cantar afinado com eles
Silenciar em respeito ao seu transe num êxtase
Ser indecente
Mas tudo é muito mauOu então cada paisano e cada capataz
Com sua burrice fará jorrar sangue demais
Nos pantanais, nas cidades
Caatingas e nos geraisSerá que apenas os hermetismos pascoais
E os tons, os mil tons
Seus sons e seus dons geniais
Nos salvam, nos salvarão
Dessas trevas e nada maisEnquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Morrer e matar de fome
De raiva e de sede
São tantas vezes
Gestos naturaisEu quero aproximar o meu cantar vagabundo
Daqueles que velam pela alegria do mundo
Indo e mais fundo
Tins e bens e taisSerá que nunca faremos senão confirmar
Na incompetência da América católica
Que sempre precisará de ridículos tiranos
Será, será, que será?
Que será, que será?
Será que essa minha estúpida retórica
Terá que soar, terá que se ouvir
Por mais zil anosOu então cada paisano e cada capataz
Com sua burrice fará jorrar sangue demais
Nos pantanais, nas cidades
Caatingas e nos geraisSerá que apenas
Os hermetismos pascoais
E os tons, os mil tons
Seus sons e seus dons geniais
Nos salvam, nos salvarão
Dessas trevas e nada maisEnquanto os homens
Exercem seus podres poderes
Morrer e matar de fome
De raiva e de sede
São tantas vezes
Gestos naturaisEu quero aproximar
O meu cantar vagabundo
Daqueles que velam
Pela alegria do mundo
Indo mais fundo
Tins e bens e tais!
Indo mais fundo
Tins e bens e tais!
Indo mais fundo
Tins e bens e tais!
Texto em português do Brasil
Exclusivo Editorial Rádio Peão Brasil (Centro de Memória Sindical) / Tornado