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Domingo, Setembro 1, 2024

A armadilha da dívida da China

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

Significado e repercussões

Na sequência do actual colapso económico, social e político do Sri Lanka, está a travar-se um intenso debate internacional sobre os perigos da armadilha da dívida em relação com a iniciativa internacional de desenvolvimento chinesa conhecida pelo seu acrónimo inglês, ‘Belt and Road Initiative’ (BRI).

No presente documento, faremos uma breve revisão histórica da utilização do conceito de ‘armadilha da dívida’, das peculiaridades do BRI e de todo o investimento estrangeiro chinês no nosso século, e do seu impacto na Ásia do Sul, realçando a situação do Sri Lanka.

Embora reconheçamos que tanto as acções do credor como do devedor são importantes para criar o fenómeno da armadilha da dívida, a armadilha da dívida chinesa é uma realidade, não um ‘mito’, produto de ‘conspiradores’.

A China não deu até agora qualquer sinal de que o país está pronto para uma reforma profunda da sua política; a política imperial territorial agressiva que está a desenvolver na região sugere mesmo o contrário.

Nestas circunstâncias, uma ajuda global ao desenvolvimento oposta aos métodos de armadilha de dívidas do passado é uma obrigação da comunidade internacional.

  1. Dívida na História

A dívida foi identificada como uma das razões mais comuns para a escravatura humana ao longo da história (Reid, 2014) e até aos nossos dias (Fim da escravatura Agora, n.d. ). A dívida também justificou a coação nas relações entre estados. As Convenções de Haia (1899 e 1907) ‘Restringir o uso da força para recuperar obrigações contratuais’ foram o primeiro esforço internacional para restringir esta prática (Scott, 1908). Segundo Loewe (2015, p.65), ainda no século XX, a prática da guerra para a cobrança de dívidas era comum: ‘tão recentemente como entre 1902 e 1903, a Grã-Bretanha, a Alemanha e a Itália enviaram navios de guerra para bloquear a costa da Venezuela, que tinha dívidas em incumprimento aos nacionais desses Estados.’

Do ponto de vista dos países endividados, desde o século XIX, foi comum ver a mecânica feita pela dívida e a perda de soberania como uma “armadilha da dívida” (ver Toussaint, 2019). Alguns foram tão longe quanto ver a “armadilha da dívida” não como uma sobrevivência de mecanismos antigos que valorizam mais as obrigações contratuais do que os princípios humanitários, mas pelo contrário, como se afirma no famoso panfleto de Lenine intitulado ‘Imperialismo, a fase suprema do capitalismo’: como consequência do desenvolvimento da humanidade dentro do sistema social chamado de ‘capitalismo’.

Nos tempos modernos, esta perceção não foi diminuída pela criação de instituições internacionais como o FMI ou acordos circunstanciais de credores para aliviar a dívida.  Pelo contrário, as instituições mundiais, como a Comissão Económica para a América Latina (ECLA), viam estes acordos como uma concertação dos credores contra os devedores (ver, por exemplo, O’Donnell, 1985).

Embora a tendência mais importante seja a de responsabilizar os credores pela armadilha da dívida, alguns analistas vêm a armadilha da dívida principalmente como consequência da irresponsabilidade dos devedores. O texto seminal ‘O Ágio do Ouro’, publicado em 1916, de António Salazar, que se tornou ditador português de longa data no século XX, vê a armadilha da dívida pública como consequência da irresponsabilidade da estrutura política portuguesa.

  1. O debate contemporâneo sobre a armadilha da dívida

A principal novidade contemporânea sobre a discussão da ‘armadilha da dívida’ é que ela está agora centrada no programa de investimento internacional da China, BRI, ao ponto de dominar a recente cimeira anual do G-7. De acordo com o título do relatório da autoria da Radio Liberty: ‘O G7 anuncia programa de infraestruturas para combater a ‘Belt and Road Initiative’ da China’ (2022.06.26).

O comunicado de imprensa da Casa Branca, embora não nomeando diretamente o programa chinês, afirma que:

‘Muitas vezes, as opções de financiamento carecem de transparência, alimentam a corrupção e a má governação, e criam encargos insustentáveis da dívida, conduzindo frequentemente a projetos que exploram em vez de capacitar os trabalhadores; exacerbam os desafios enfrentados por populações vulneráveis, como o deslocamento forçado; degradam os recursos naturais e o ambiente; ameaçam a estabilidade económica; minam a igualdade entre homens e mulheres e os direitos humanos; e colocam um foco insuficiente nas melhores práticas de cibersegurança – uma falha que pode contribuir para vulnerabilizar redes de tecnologias de informação e comunicação.’

A imprensa chinesa respondeu com artigos como este publicado pelo Global Times (Feng, 2022.08.19) e intitulado: ‘A retórica da ‘armadilha da dívida da China é feita de mentiras desajeitadas fabricadas pelos EUA’, ou invertendo a acusação, como fez um artigo da Xinhua: ‘Os EUA devem ser responsabilizados pela criação de “armadilha de dívida”’ (2022.06.28).

A controvérsia trazida para o topo da agenda internacional no verão já tinha sido antecipada pelo colapso económico, social e político do Sri Lanka, com marcas claras da crise de investimento infraestrutural. O Global Times, publica em título: ‘Rumores por trás da ‘armadilha da dívida da China’: como os conspiradores ocidentais e indianos mancham a cooperação China-Sri Lanka’ (2022.02.06).

O ponto de vista oficial chinês foi seguido por alguns analistas ocidentais, nomeadamente The Atlantic, (Brautigam e Rithmire, 2021.02.06): ‘A ‘armadilha da dívida’ chinesa é um mito’, numa abordagem cuja retórica agressiva foi mais tarde suavizada dentro do mesmo registo em  publicações como a de Jeremy Mark no Atlantic Council (2021): ‘a verdadeira armadilha da dívida da China’.

  1. Uma análise factual sobre o BRI e a armadilha da dívida

Antes de aprofundar a controvérsia política, é conveniente olhar para a realidade. Pelo que sabemos, a análise mais abrangente dos dados relacionados com a questão foi compilada pela AidData (Malik et. al., setembro de 2021) numa publicação intitulada: “Financiamento da BRI: análise de um novo conjunto global de dados de 13.427 projetos de desenvolvimento chineses”.

Como explicam os autores na introdução à sua avaliação, que é ímpar e global (p. 4):

“Neste momento crucial, é mais importante do que nunca que os decisores políticos do G7, chineses, e de países anfitriões, baseiem as suas decisões em provas concretas e não em opiniões e conjecturas. A equipa da AidData, de mais de 135 docentes, profissionais e assistentes de investigação, procurou criar uma base factual mais sólida para a análise e tomada de decisões, reunindo meticulosamente um conjunto de dados abrangente de projectos de desenvolvimento financiados pelo governo chinês. O objetivo deste trabalho é introduzir o Conjunto de Dados Globais de Financiamento do Desenvolvimento Chinês da AidData (Versão 2.0) e destacar as formas de o utilizar de forma produtiva.’

O projeto iniciou-se em 2013, data do lançamento oficial da BRI, com vários resultados a serem tornados públicos em versões anteriores, mas a ‘cobertura temporal (…) do conjunto de dados acompanha projectos ao longo de 18 anos de compromissos (2000-2017), com detalhes sobre o calendário de implementação dos projectos ao longo de um período de 22 anos (2000-2021)’ (p. 7). Isto é particularmente útil se quisermos analisar o financiamento mais antigo de infraestruturas pela China, como aconteceu com o Sri Lanka.

Sem prejuízo de conclusões mais aprofundadas e detalhadas, este estudo permite-nos compreender claramente que (1) o investimento estrangeiro do Estado chinês tornou-se, na última década, o mais importante a nível mundial; (2) há falta de transparência em relação a elementos-chave deste investimento; (3) o investimento estatal chinês efectuado em termos concessionais (Assistência Oficial ao Desenvolvimento, AOD, seguindo os critérios da OCDE) representa uma pequena e decrescente fração do total; (4) O investimento tem um risco especial de corrupção; (5) Em vários casos, conduz a situações insustentáveis de dívida que normalmente são descritas como ‘armadilha da dívida’.

Na secção 6 (p.152), o estudo da AidData mostra os esforços gigantescos que esta organização desenvolveu para poder recolher os dados que normalmente se esperaria estivessem livremente disponíveis nas estatísticas internacionais, realçando implicitamente a falta de transparência das fontes financeiras internacionais chinesas.

O estudo da AidData mostra como a China se tornou, ao longo dos últimos vinte anos, a fonte de financiamento do desenvolvimento internacional mais importante (ver gráficos 1-4, pp. 11-14). Os números 5-6 das pp.15-16 destacam a característica mais significativa desta fonte chinesa; apenas uma pequena parte deste esforço – e diminuindo ao longo do tempo – pode ser classificado como assistência oficial ao desenvolvimento, a maior parte dele usa taxas de juro próximas das praticadas no mercado.

Em parte, a não transparência das operações de financiamento chinesas deve-se a uma separação desfocada entre instrumentos privados e públicos. Por exemplo, o principal destinatário do investimento estatal chinês é a Rússia, e este investimento é maioritariamente não concessional (quadro 3, p.19). Embora isto seja incomum nas economias ocidentais, uma vez que estas operações são normalmente realizadas por instituições privadas, esta relação específica não pode ser vista no domínio da armadilha da dívida, mas sim como uma presença mais forte do Estado nestas antigas economias de planeamento estatal. O carácter oculto desta dívida, neste caso, está também relacionado com a necessidade de iludir as sanções ocidentais à economia petrolífera russa.

Quando ‘estas operações são contratadas por empresas estatais, bancos estatais ou veículos especiais de uso público/joint ventures sem garantias públicas explícitas do governo anfitrião’ a AidData classifica ‘essas dívidas como “ocultas” porque raramente são divulgadas como potenciais obrigações de reembolso do governo anfitrião, mas podem beneficiar de formas implícitas de proteção de responsabilidade do governo (e, assim, tornar-se obrigações de reembolso dos governos em caso de incumprimento por parte dos mutuários primários)’. (Malik et. al. p. 51).

A falta de transparência é um factor-chave para desencadear uma ‘armadilha da dívida’, uma vez que impede os actores nacionais ou internacionais de controlar adequadamente a dívida tendo em conta a realidade de desenvolvimento de um país.  O Laos, país que está no topo da liga chinesa de ‘armadilha da dívidas’, é também o país que figura em primeiro lugar no rácio da dívida oculta em relação ao PIB (gráfico 20, p. 52).

A corrupção é outro ponto importante neste debate. O resumo do estudo sublinha que: “A China aumentou rapidamente a oferta de empréstimos denominados em moeda estrangeira a países ricos em recursos que sofrem de elevados níveis de corrupção. ‘ (p. 1).  Entre os vários factores que levaram a equipa de investigação do AidData a esta conclusão, podemos citar o seguinte: ‘De acordo com o Quadro 4, 89% dos empréstimos oficiais da China entre 2000 e 2017 apoiaram países que se situaram abaixo da mediana global no Índice de Indicadores de Governação Mundial (WGI)’ (p. 20).

O relatório da equipa AidData (Malik et.al., setembro de 2021) analisa mais detalhadamente o caso de dois dos países mais endividados, o Laos e a República do Congo. Em ambos os casos, existem elevados níveis de dívida total e dívida oculta, resultando principalmente do financiamento de grandes projetos de infraestruturas em termos não concessionais, bem como do baixo nível de governação de ambos os países (ver tabela mundial do WGI). Ambos os países atingiram um nível de dívida insustentável.  A República do Congo reestruturou a sua dívida em 2019 com o seu principal credor chinês, o Eximbank, atrasando, mas aumentando ainda mais o seu fardo de dívida (p. 54), enquanto o ‘Laos teve de dar à China o controlo de uma grande parte da rede de transporte de eletricidade do país (…) numa aparente troca de dívida por capitais próprios’. (p. 49)

  1. Situação na Ásia do Sul

Tanto a Índia como o Butão não são signatários da iniciativa chinesa BRI, sendo a presença de investimento estatal chinês pequena a inexistente. O Afeganistão é signatário do esquema, mas a escala da presença chinesa é pequena.

O investimento de Estado chinês é importante no Nepal. De acordo com a AidData (quadro 3, p. 19) o Nepal faz parte da lista dos 25 principais destinatários da AOD chinesa de 2000 a 2017, e é o destino número quatro das subvenções chinesas durante o mesmo período (quadro A.9, p. 123).  O Nepal só aderiu ao BRI em 2017 (tabela A.17, p. 142) e, de acordo com a imprensa (Frontline, 2022.08.25) as discussões sobre o financiamento de nove grandes projetos infraestruturais não estão concluídas.

As discussões estão, portanto, a decorrer já depois da denúncia pública dos EUA e do G-7 dos perigos da dívida da iniciativa chinesa. De acordo com a mesma fonte (Frontline, 2022.08.25), durante 2022, os EUA, através da American Millennium Challenge Corporation, concederam uma subvenção de 500 milhões de dólares ao desenvolvimento infraestrutural no Nepal e os EUA disponibilizaram um apoio extra de 659 milhões de dólares.  Ainda assim, citando a Frontline, as autoridades nepalesas vêm o colapso do Sri Lanka como um aviso alarmante sobre os perigos da armadilha da dívida do investimento chinês.

As Maldivas também assinaram a iniciativa BRI em 2017, tendo o país um extenso portfólio de investimentos patrocinados pelo Estado chinês.  Um dos exemplos escolhidos pela AidData para destacar os perigos da dívida oculta prende-se com um empréstimo dado a um investimento hoteleiro em 2017 (pp. 45-46). No gráfico 20 da página 52, as Maldivas aparecem como um país com uma elevada exposição da dívida soberana à China.

As Maldivas têm sido muitas vezes referidas como um caso de armadilha de dívida chinesa. A possibilidade de uma cessão territorial à China para diminuir o fardo da dívida foi publicamente mencionada na imprensa: ‘As Maldivas poderiam renunciar ao controlo de uma ilha à medida que a pressão colocada pela dívida para com a China aumenta?’ (Eurasian Times, 2020.09.18).

O Bangladesh aparece como o exemplo de como um país conseguiu superar as consequências do seu endividamento para com a China. No ano passado, concluí que ‘Bangladesh à mão pesada da China!’ (Casaca, 2021), e os sinais desta resistência tornaram-se mais óbvios agora.

Uma análise publicada pelo Financial Times (Parkin, 2022.08.09) intitula-se significativamente: ‘O ministro das Finanças do Bangladesh adverte para os perigos dos empréstimos da China’.  Citando o responsável do governo do Bangladesh, Parkin escreve:

‘O ministro das Finanças do Bangladesh advertiu que os países em desenvolvimento devem pensar duas vezes antes de contraírem mais empréstimos através da BRI, uma vez que a inflação global e o abrandamento do crescimento aumentam as tensões nos mercados de países emergentes endividados.

‘AHM Mustafa Kamal também disse que Pequim precisava de ter mais rigor na avaliação dos seus empréstimos, no contexto da preocupação de que as más decisões de empréstimos arrisquem empurrar os países para a incapacidade de gerir a dívida. Deu como exemplo o Sri Lanka, onde projetos de infraestruturas apoiados pela China que não geraram retornos exacerbaram uma grave crise económica. ‘ (Parkin, 2022. 08.09).

A frontalidade das autoridades do Bangladesh é notável, uma vez que as declarações foram feitas durante a visita do Ministro chinês dos Negócios Estrangeiros. De acordo com o mesmo artigo, o Bangladesh está a equacionar o apoio de várias instituições multilaterais para novos investimentos.

A vulnerabilidade do Paquistão aos investimentos chineses relacionados com a armadilha de dívida é uma das mais elevadas a nível internacional.  O Paquistão é hoje o destinatário mais importante do investimento BRI (AidData, quadro 19, p. 62) bem como o país ‘com mais descrições de projetos de infraestruturas BRI que referenciam alegações de corrupção ou outros tipos de irregularidades financeiras’ (Quadro 24, p.67).

Existe um consenso maioritário sobre os perigos existentes de o Paquistão vir a seguir o caminho do Sri Lanka para o colapso económico, social e político (por exemplo, Casaca, 2022).

A ligação entre o colapso do Sri Lanka e o impacto da diplomacia chinesa da armadilha da dívida tem sido salientada por numerosos observadores. Ainda assim, é importante ter em conta que a armadilha da dívida em análise, exatamente como as suas antecedentes históricas, resulta de uma relação bilateral com responsabilidades de ambos os lados da relação da dívida.

O sucesso do Bangladesh em manter o seu juízo independente e a sua estabilidade global, apesar do difícil ambiente económico (ver Parkin, 2022.08.24 no Financial Times) serve para provar este facto. Como aconteceu frequentemente no passado, a crise provocada pelas armadilhas de dívida torna-se normalmente evidente em tempos económicos difíceis. Isso acontece também com a presente crise, mas isso não impede que a insustentabilidade da dívida seja a verdadeira causa da crise.

De acordo com o relatório do FMI de 2022 sobre o Sri Lanka (quadro 1, p. 51), no final de 2020, a dívida bilateral do Sri Lanka para com a China era superior a 50% de toda a dívida bilateral do Estado, um valor consideravelmente mais significativo do que os 10% da dívida global invocada por Feng (2022.08.19) entre outros.

Mais significativa é a análise da sustentabilidade do investimento relacionado com a dívida, como a feita por Jonathan Hillman no seu livro ‘A História Secreta de Hambantota’ (amplamente citado em Casaca, 2022) em vez de tentar esbater os factos afogando-os em estatísticas, como fazem os que negam a importância da armadilha da dívida.

A falta de governação, a corrupção e a ausência de análise de sustentabilidade em gigantescos projetos de infraestruturas são, de facto, fundamentais para a produção de armadilhas de dívidas e não podem ser ignoradas.

Particularmente impressionante, é a tentativa de Brautigam e Rithmire, 2021.02.06 de descartar a ligação entre o financiamento do projeto Hambantota e a China, citando empresas indianas ou canadianas que estiveram envolvidas no processo, como se as relações das empresas indianas ou canadianas com os seus Estados pudessem ser comparadas com as relações das empresas chinesas relacionadas com o seu Estado.

As reivindicações feitas pela Xinhua, 2022.06.28, Feng, 2022.08.19, ou Brautigam e Rithmire, 2021.02.06 apresentando as armadilhas de dívida chinesas no Sri Lanka como produto de ‘conspiracionistas’ americanos e indianos ou como ‘simples mito’ não podem ser aceites.

  1. Conclusões

Uma das mais impressionantes análises das armadilhas da dívida chinesas (Chellaney, The Hill, 2022.12.05) começa por este parágrafo revelador: ‘O estadista americano John Adams, que serviu como presidente entre 1797 e 1801, disse de forma célebre: “Há duas maneiras de conquistar e escravizar um país: Um é pela espada; o outro é por dívida.” A China, escolhendo o segundo caminho, abraçou as práticas da era colonial e rapidamente emergiu como o maior credor oficial do mundo.’

Como vimos, isto pode ser um exagero.  Em qualquer caso, a espada e a dívida não são mutuamente exclusivas, e a agenda expansionista da China em todo os Himalaias, no Mar da China Meridional, ou n estreito de Taiwan são claros símbolos deste facto.

Ainda assim, o método de Chellaney de contextualizar a diplomacia chinesa da armadilha da dívida na história, parece pertinente, e pode-se contextualizar a importância da diplomacia chinesa da armadilha da dívida, observando que os países ocidentais não agiram de uma forma essencial e diferente no passado. No entanto, os países ocidentais ultrapassaram hoje algumas das lógicas capitalistas mais dogmáticas que estão a sobreviver na política chinesa.

O problema, como salienta a análise do AidData (Malik et.al., setembro de 2021), é que a tendência na estratégia chinesa não parece ir na direção certa. Pode-se observar, no entanto, que o Presidente Xi fez publicamente algumas declarações importantes sobre a necessidade de reformar o BRI, sobretudo, no que diz respeito ao seu impacto ambiental (Malik et al., p.3).  Podemos daqui pensar que é possível prever uma reforma progressista e reformista para a China?

Trata-se de uma discussão que nos levaria claramente muito para além das nossas intenções, mas tendo em conta o que estamos a ver, com o carácter imperial pleno da atual política chinesa, isso não parece nada provável.

Um esforço global de ajuda ao desenvolvimento longe da lógica da armadilha da dívida é uma necessidade e deve ser tida como primeira preocupação pela comunidade internacional.


Texto adaptado para português de uma análise em inglês a apresentar numa conferência internacional sobre a armadilha da dívida em Bruxelas no próximo dia 8 de setembro.

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